No passado, era normal e não merecia a mais leve censura, as comemorações oficiais realizadas pelo governo. Às vezes, após um lauto banquete, seguia-se um animado baile, onde o governo confraternizava-se com a alta sociedade. O povo? Ah! O povo. Este componente não era chamado nem para votar, quanto mais para comemorar a posse de um governante. O eleitor era escolhido entre a elite dominante. Essa elite participava do rega-bofe e o “populacho” se contentava em ficar na praça a ouvir tocar uma banda de musica escalada para a ocasião. A Gazeta do Commércio, órgão que circulou até os primeiros anos republicanos,narrou uma dessas festividades. A narrativa foi considerada especial pelo governo, daí porque, a mandou transcrever em A União de 28 de outubro de 1898. Eu considerei uma curiosidade exemplar e resolvi compartilhar um trecho com meus parcos leitores:
“Como já havemos dito,o banquete offerecido ao exmo.sr.dr.Antonio Alfredo da Gama e Mello, por se ter empossado no alto cargo de Presidente d´este Estado, começou ás 6 e ½ horas da tarde do dia 22 do corrente, n´um dos vastos salões do Lyceu Parahybano.
Ostentava-se, no centro do salão onde ia ter lugar o festim, uma extensa meza primorosamente preparada em forma de ferradura e, sobre a qual, destacavam-se, pelos jorros de luz despejados dos candelabros, crystaes, flores, as mais finas iguarias a par com os mais deliciosos licores.
Das paredes pendiam brasões entrelaçados de bandeirolas de todas as nações amigas,vendo-se na parte de honra, o retrato do illustre parahybano que era o alvo das expansivas manifestações d´aquelle dia e exprimia o prenúncio da paz, da ordem e do progresso do seu Estado natalício.
A hora aprazada para começo do festim,s.exc.sr.dr. Gama, acompanhado de grande numero de cavalheiros, representantes da fina flor parahybana,vindo de Palácio entrou no salão e tomou a presidência da meza, em volta da qual sentaram-se também cento e sessenta convivas.
Os compartimentos immediatos estavam cheios de numeroso pessoal, que não tiveram lugar, aguardando-se uma segunda refeição, que foi servida depois da primeira.
Reinou em tudo muita ordem e muita animação, sendo o primeiro brinde levantado pelo illustre desembargador José Peregrino de Araujo, ao eminente dr.Gama e Mello,que foi recebido com expansivas demonstrações de aplausos.
Após seguiram-se outros, salientando-se os do exmo.e revmo.sr Padre Walfredo Leal, ex-Vice-presidente do Estado, ao mesmo sr.dr. Gama e do eloqüente e illustrado orador parahybano,dr Castro Pinto, saudando a imprensa na pessoa do Presidente do Estado, que, como sempre, eletrisou, com sua palavra fluente e enfeitada de verdadeiros arroubos oratórios,todos os circunstantes.
Em agradecimento as justas felicitações que lhe eram enthusiasticamente dirigidas, levantou-se o exmo.sr.dr. Gama e Mello e n´um discurso em que primou pela linguagem florida e entremeada dos mais bellos conceitos, que só sabe uzal-os o talento e a ilustração,pediu o concurso de todos os parahybanos, para que o seu governo seja de prosperidade para o Estado e findou saudando o progresso da Parahyba”.( Mantive a grafia da época)
Mais modernamente, com o surgimento do rádio entre nós, a Tabajara, emissora oficial, era sempre escalada para a cobertura dos eventos palacianos. Lembro que Geraldo Cavalcanti manteve o microfone oficial em suas mãos por vários governos. Certa ocasião, estando afônico, orientou um substituto para a tarefa e destacou que, na chegada do governador, não esquecesse de lembrar que ele estava acompanhado da primeira dama do estado.O locutor não se fez de rogado. O governador foi descendo do carro e enquanto puxava a esposa pela mão, ela sapecou:
– Acaba de chegar, Sua Excia, o governador, acompanhado de sua primeira mulher…
Não preciso dizer que o locutor perdeu o emprego! Lembro também Paschoal Carrilho, esse, mais debochado, vez por outra fazia das suas. Designado para cobrir a realização de um banquete no Palácio, oferecido a um general cinco estrelas, de má vontade, iniciou a transmissão:
– Começou o banquete. Já estão comendo a mulher do governador e o bispo. Os demais aguardam na fila… (do futuro livro “Pequenas histórias para quem tem preguiça de ler as grandes”)
Sempre reinou os dois extremos. Os pobres nunca vão ter vez nos banquetes palacianos; há não ser para fazer a vez de ser o bobo da corte com fim de alegrar a burguesia.
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