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Leiam na Integra a entrevista concedida pelo Cangaceiro Ingaense, ZÉ DE TOTÔ, ao Diário de Pernambuco, no momento de sua prisão em 21 de maio de 1944. ( Materia publicada pelo Blog O Ingaense onde Não é preciso inventar mentiras para satisfazer verdades.)

Professor Alexandre historiador e amante da natureza

O Ingaense

 

 

terça-feira, 30 de março de 2021

 

Leiam na Integra a entrevista concedida pelo Cangaceiro Ingaense, ZÉ DE TOTÔ, ao Diário de Pernambuco, no momento de sua prisão em 21 de maio de 1944.

“Dramática história de um bandoleiro do Nordeste

Como apareceu Zé de Totô no cartaz do crime- muita calma no rosto indecifrável- livrando-se de emboscada e Armando algumas outras – o assassino de sua primeira mulher- trabalhando e dormindo no mato -traído pelas mulheres e levado pelos amigos- sua prisão em Campos Sales no Ceará

João Pessoa, 17 (Agência Meridional) – José Afonso de Oliveira, vindo de São João do Cariri, onde nasceu, chegou ao Ingá com 13 anos. Não trazia armas, mas aos primeiros contactos com Manoel Amaral, chefe político de fama e de coragem em Ingá firmou-se como um homem capaz para servir de guarda-costas.

Nasceu em 1897 e era filho de Justino de Oliveira e li piscina de Oliveira Lima, agricultores em São João do Cariri.

Produto do Ingá do Bacamarte

 Fugiu José Alonso de Oliveira às marcas e estigmas fixados pelos criminalistas. Não tem anomalias do craneo e da face, nem mandíbulas prognatas, nem orelhas assimétricas. A sua fisionomia, entretanto, engana o melhor observador e à sua frente ninguém pensa que realmente se trata do Zé de Totô, a figura sinistra do Nordeste. No seu rosto pardo, nublado, absolutamente insensível, apenas os olhos falam demais. No decorrer do interrogatório é que ele se mostra todinho. Os olhos que não apresentam vivacidade, ao calor das perguntas, tomam um brilho surpreendente e parece extravasar todo o ódio que o animou ao Crime durante 40 anos. Sente-se que aquele homem podia ter sido um homem honesto se vivesse em outras terras. Toda a sua história gira em torno de questões de terras arrendadas entre fazendeiros poderosos, movimentos eleitorais, choques armados entre senhores feudais produto puro do meio. Ingá não é ambiente para homens pacatos e simples. Hoje é uma cidade bucólica. Outrora agitada por encontros mortais entre inimigos de ferro e fogo. Ingá era a terra do amor e do ódio. Chegou até os nossos dias com o apelido que o define INGÁ DO BACAMARTE –  a voz do Bacamarte era mais poderosa que a que a justiça, que o direito. As soluções pacíficas não serviam aos senhores de terra. Uma região acidentada cheia de serras e de grutas serviu de clima ideal para a proliferação do crime. Era o habitat maravilhoso para os homens de espírito aventureiro que ignorantes e rústicos aos primeiros atritos com a lei, tornavam-se bandoleiros assaltando, roubando e matando em nome de princípios que não conheciam, mas a serviço de instintos incontroláveis feras humanas soltas como as de Hitler.

Zé de Totô encontrou em Ingá um ambiente propício ao seu espírito. Logo se destacou como um atirador de fama. Sacudindo um limão para o alto, espatifava-o com uma bala. Isso servia Manoel do Amaral estava bem protegido contra inimigos políticos ou quaisquer outros… Era assim o Ingá de outros tempos.

Ligeiro intermezzo assinala a sua ausência de Ingá na sequência de sua vida acidentada e cheia de sangue e mortes. De 1902 a 1912 ganhou dinheiro com a alta da borracha, trabalhando no Amazonas. Foi até ali em companhia de seu patrão o Coronel Manoel do Amaral. No inferno verde cometeu das suas, mas ninguém sabe ao certo o que se passou com ele, dizendo-se que exterminou uma família inteira composta de 12 pessoas, para herdar uma propriedade. Ganhou dinheiro no Acre e com 25 anos fixou-se definitivamente no Ingá. Logo depois, em 1915, por questões de terra entre grandes senhores, matou um morador da família Trigueiro Lins. Essa família exerce na vida de Zé de Totô grande influência. Os Trigueiros então sempre em luta contra Manoel do Amaral e Zé de Totô não brinca com os cabras dos Trigueiros. Foi não foi o Bacamarte está em ação e vão caindo algumas vidas. Até a sua mulher Maria Gonçalves e, na intimidade Lia, entra no ódio de seus inimigos. Em 1918, Lia foi alvejada por vários homens de identidade desconhecida para nós, mas não para Zé de Totô que logo depois, tomando na estrada com Antônio Batista, Manoel Batista e Francisco Mendonça moradores na fazenda dos Trigueiros bate mão ao Bacamarte e trava uma luta tremenda. Com um pouco de modéstia ele vai contando. Pulando para aqui e para ali, desviando-se de um golpe de foice de uma peixeira de um tiro certeiro, aos poucos põe em debandada, o grupo, deixando, entretanto, impossibilidade de fugir porque já se achava morto um deles, o Antônio Batista.

 Três meses depois estava absolvido. Pela morte de gente ruim o júri nunca condenou ninguém. na épocas que foram e que ainda hoje revivem quando se focaliza tipos como Zé de Totô. E quem tinha coragem de condenar Zé de Totô?

Na trilha do crime

Os tempos vão passando. A mesma vida. Luta com uma luta com outro, mais uma morte, menos uma morte, tudo era natural em Ingá do Bacamarte e os jurados conheciam de perto o ambiente. Tudo ficava impune em 1928, entretanto, o monstruoso crime de Lagoa do Remígio fez a justiça se movimentar. Tinha sido assassinado a tiros, dentro de seu próprio estabelecimento, o Coronel João Soares Chefe político de renome e cheio de amigos. O Coronel João Soares foi morto com um filho. Os bandidos em pleno dia de feira cercaram a sua casa e nada pouparam. Sabia-se que tinha sido um assalto organizado por Zé de Totô. Cumprem pena na cadeia apenas o famigerado Pilão – autor de várias mortes –  José Vieira, vulgo Rebuliço e mais uns 10 homens assalariados sem fama. Zé de Totô negando sua participação nesse crime não explica bem as coisas e Coincidências onde a sua figura aparece entre Pilão e seus companheiros horas antes do crime. Vieram outros assaltos na estrada de Cachoeira de cebolas, o fazendeiro Domício Leopoldo de Andrade é assaltado. Apezar de morto o motorista do seu Ford o Coronel Domício consegue fugir gravemente ferido.

Diferente de Lampião e Antônio Silvino

Zé de Totô continua negando a participação nos assaltos em que Pilão e Zé Luiz Aparecem. Mas a polícia sabe de tudo. Zé de Totô não aparecia nos assaltos. Não se fazia necessária à sua presença. Ele dava ordens e estas eram cumpridas. Ele não se banalizava. Era mais Sagaz do que Lampião e Antônio Silvino. Nunca marchava à frente de seu bando. Esses bandos marchavam sob a inspiração do Chefe.  A Sua Majestade no reino tenebroso do cangaço era indiscutida. Sabia Zé de Totô que a tática dos bandoleiros teria que mudar. Teria que se adaptar às novas circunstâncias criadas pela civilização. Essa cousa de bandos armados permanentemente era cousa do passado. Com boas estradas de ferro e de Rodagem com luz elétrica, em toda com polícias bem organizadas e melhor comandada, com tudo isso a serviço da ordem e da lei, a tática do crime teria que ser diferente e muito diferente a sua estratégia. Fazer amigos, protegendo fazendas e defendendo os que nada tinham era uma tática segura. Garantir bons esconderijos. Agir em pequenos grupos. Simultaneamente em vários setores. Dispersando-se em seguida. Era uma estratégia garantidora de pleno êxito. Garantia de sucesso. Em Terras tão vastas, as guerrilhas davam mais resultado. Em sua perseguição soldados organizados não conseguiriam nada. Assim é que Zé de Totô foi criando em torno de si uma lenda. Diziam que tinha corpo fechado. Que estava em toda parte. Que se encantava em um pé de marmeleiro. E de fato, o bandido era genial. No mato ninguém me batia. Sabia sair em qualquer lugar sem bússola, sem nada. Orientando-se apenas pelo seu instinto. Nunca dormia em casa. Nunca andava em estradas. Nunca confiou em amigos. Sempre vigilante. E os fazendeiros de Ingá precisando de uma figura lendária assim. Ainda faziam mais propaganda de Zé de Totô. Com isso o que acontecesse seria Zé de Totô o perseguido mesmo que nada tivesse com o peixe.

Cai a estrela do bandido

 Mas a boa sorte de Zé de Totô estava por pouco. Pouco depois de terem assassinado misteriosamente uma companheira de sua mulher, de nome Madalena, era a própria sua esposa que em primeiro de março de 1936 vítima de um trucidamento. Cortaram-lhe o pescoço. Chorou muito a morte de sua Leal companheira. Era ela quem tratava de todos os seus negócios vendendo gado, algodão e cereais, cuidando da fazenda e etc.  Com a sua morte Zé de Totô ficou desolado. Construiu uma capela no local do crime e mandou erguer um mausoléu no cemitério de Ingá. Bateu seca E meca à procura de uma mulher chamada Josefa Cirilo de quem suspeitou o crime. Josefa Cirilo era empregada de sua casa e logo depois do crime desaparecerá. Finalmente conseguiu encontra-la e meteu-lhe quatro balas de aço em nos intestinos. Deixou a Josefa Cirilo numa poça de sangue na linha da Great Western, certo de que estava bem morta. Mas o fato é que Josefa depois contava a história em Ingá. Completamente restabelecida dos tiros. Foi um fato de que se falou e ainda se fala em Ingá com assombração.  Como teria escapado Josefa Cirilo? … Foi o seu organismo que era de Aço. Reagiu e salvou-se.  Zé de Totô ficou desolado. A sua mulher continuava morta e sem Vingança. E Zé de Totô cobria-se de lendas na crendice popular. Falando de sua mulher assassinada o bandido chora. Exaltou-se na descrição do acontecimento. E em seguida vem a crise. Era uma verdadeira criança. Rói até as unhas. Confundiu o repórter e até a polícia… sim, era um gesto de humanidade que ainda emergia daquele homem que viveu perigosamente sem sentir medo sem imaginar o que era a dor humana, e que agora entre quatro paredes reduzia-se a uma inexpressiva carcaça de velho no crepúsculo da vida.

Fuga do Ingá

Quando Zé Luiz, Ota Virgolino e Belinho Foram liquidados pela polícia do Doutor Manoel Morais e Coronel Ivo Borges então Zé de Totô viu que as cousas iam se tornando pretas para o seu lado. A polícia voltaria logo a procurá-lo e com maior insistência. Era um contra um Estado inteiro. E, depois estava amando novamente. Iraci de Araújo, com 19 anos apenas, acompanhando-o para toda parte cheia de Amor e confiança em seu marido, precisava ser poupada de uma sorte cruel. Encarregou amigos de venderem o que possuía em Ingá. Foi enganado. Deram-lhe pouco dinheiro por fazendas, algodão e gado. Mas quem foge da polícia paraibana não tem tempo a pensar em amigos falsos e Ursos. O principal era fugir. Deixar o Estado. Assim, dirigiu-se para o Ceará, indo fixar-se no município de Campos Sales. Onde comprou a propriedade denominada Bolandeira. A terra era boa e ele começou a plantar milho, feijão, arroz, algodão, criando cabras ovelhas e vacas. O homem -terror que ditava leis no surrão do Bacamarte estava transformado em um pacato criador e agricultor. Mas o crime não compensa. Aquelas vítimas que tinham ficado em sua história não deixavam o homem viver em paz. A polícia tinha que agir em nome da lei. Ninguém pode ficar impune. E, mais do que nunca era necessário acabar com a influência de Zé de Totô. No Ingá, frequentemente, apareciam pelas estradas cadáveres. Ninguém procurava identificar o morto que passava logo a ser a se chamar mais uma vítima de Zé de Totô. Cartas ameaçadoras eram dirigidas a fazendeiros como se partissem de Zé de Totô. Tudo se fazia sobre a proteção da fama de Zé de Totô. O homem agora preso, tudo isso desapareceram. E os bandoleiros Mirins serão logo desmoralizados. O bode expiatório desapareceu …

A prisão

Afinal, na madrugada de 4 de maio chega a Campos Sales o major Jacob Frantz, o Sargento José de Souza e o soldado da Força policial da Paraíba e do Ceará. Zé de totó dormia quando ouviu o tropel na fazenda. Pressentiu, disse para mulher, estou liquidado, mas ainda há um jeito. Ouviu então os gritos de Renda-se e Bandido, Amém as metralhadoras se não falar liquidaremos tudo.  Com um filho de 12 anos por cima de si e com a sua jovem esposa ao seu lado pensou Zé de Totô em resistir. Foi um pensamento rápido. Logo lhe veio a ideia de garantir o futuro de sua família. E para que a “sua voz Não servisse de rumo aos tiros dos Soldados” mandou que sua mulher falasse. Dispôz-se mesmo a se entregar quando ouviu o major Jacob Frantz ordenar aos soldados que não maltratasse segundos o major Jacob Frantz estava ao seu lado algemando-o. Era o fim de tudo.

Pela primeira vez teve medo de morrer 

Quando em Lavras o carro que o conduzia parou na estrada, confessou Zé de Totô que tinha sentido pela primeira vez medo de morrer. Descia de um automóvel oficial do Dr. Manoel Morais, chefe de polícia da Paraíba, que desfrutava entre os bandidos o conceito de o mais temível perseguidor de cangaceiros. Textualmente Zé de Totô disse –   quando os meus olhos deram no homem gordo de cabelos grisalhos, eu senti que estava liquidado. Mas enganara-se, o Doutor Manoel Morais tratou como um cavalheiro. Hoje Zé de Totô entregou o seu destino ao Doutor Morais. Diz-se, abaixo de Deus só o Dr.  Morais pode resolver o destino de minha família, pois quanto ao meu confio na justiça humana…

 Pesam sobre Zé de Totô dezenas de crimes. Ele se defende, mas isso não quer dizer falta de culpa. Sua tática é atacar os bandidos que já morreram e não fazer alusão aos que estão vivos. Conservá-lo encarcerado será uma obra de profilaxia social. Zé de Totô é pronunciado nas comarcas de Areia, Ingá e Campina Grande.

A vida amorosa de Zé de Totô 

Dizia-se que Zé de era homem muito chegado as mulheres. Que era dado às conquistas. Mas, o Don Juan brejeiro contesta a opinião de seus julgadores. Era um pouco amigo de festas, gostava de cerveja. Não chegava a ser mesmo um barba azul. Era um amoroso. Um sentimental.  – Qual foi a mulher de quem mais você gostou? –  perguntamos: Zé de Totô fica meio perturbado e diz: O primeiro bocado é sempre o melhor. Minha primeira mulher era muito boa. Trabalhava em meio a 30 homens. Não fazia com preguiça, trabalhava com vontade. Fazia tudo por mim. Era o meu anjo da guarda. Muito religiosa e as suas rezas me protegiam. A segunda era uma doida, traiu-me. A terceira também. A quarta sim, é uma moça de família, bem educada e muito boa. A quarta é a Iraci.  A que acompanha agora.

Conheceu Iraci quando menina de 1 ano de idade, na casa do seu pai Bento Araújo, morador no Cedro, em Ingá, de quem era amigo. A menina cresceu. Fez-se moça. Quando chegou aos 17 Anos Zé de Totô levou-a para casar-se em Picos, no Ceará, sendo a cerimônia oficializada por um frade beneditino. Zé de Totô nunca teve filhos mas cria um sobrinho desde um ano. Chama-se Francisco Alonso de Oliveira aluno do Colégio Salesiano de Juazeiro Ceará. O menino tem Zé de Totô como seu pai. Iraci interrogada pelo repórter, disse que preferia Zé de Totô a qualquer branco de família. Entregara-se a ele por amor. Não vendo a sua fama. Pensava regenera-lo. Ele tinha no fundo bons sentimentos. Ela ia aproveitá-los. Mostrar-se Iraci com inteligência sendo, entretanto muito desconfiada com os repórteres. É uma mulher de verdade…

E assim deixamos Zé de Totô no xadrez triste e com aspecto normalíssimo de um mortal qualquer. Aquela coragem, aquela bravura, aquele temperamento, tudo nele tinha desaparecido. Trocando os campos por uma cela, quem sabe se poderá resistir a nostalgia do terror e da fama com seus Bem vividos 59 anos?  Hora Antônio Silvino ainda está aí contando lorotas…” (Diário de Pernambuco, Domingo, 21 de maio de 1944 páginas 3 e 8).

1 comentário em “Leiam na Integra a entrevista concedida pelo Cangaceiro Ingaense, ZÉ DE TOTÔ, ao Diário de Pernambuco, no momento de sua prisão em 21 de maio de 1944. ( Materia publicada pelo Blog O Ingaense onde Não é preciso inventar mentiras para satisfazer verdades.)”

  1. amigo vavá não tá dando pra ler as matérias. poster com letras menores que agente da o zoom e fica beleza tuuudo de bom.

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