Roberto Sá garante ainda que UPPs não vão acabar e disse não ter informações sobre presença maçiça de facção paulista no estado.
Há pouco mais de 80 dias no cargo, o secretário de Segurança do Rio de Janeiro, delegado federal Roberto Sá, já utiliza o discurso do antecessor José Mariano Beltrame para reclamar do sistema de aplicação da lei penal. Com uma reportagem do G1 nas mãos sobre a prisão do traficante Thomas Bruno Dantas, o Mongol, de maio de 2016, o secretário recebeu os repórteres e disse pedir ajuda. Falou que não entende como o criminoso, em seis meses, foi detido, solto e acabou morto em um confronto com os policiais na última semana.
“Quem é mais violento tem que ter um rigor maior na lei. Um preso que está condenado a 25 anos por um crime grave pode visitar a mãe?”, questiona Sá, que chega a dizer que a volta de criminosos às favelas é parte do problema que enfrenta atualmente com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).
“A polícia fez o papel dela. Mas o cara sai, queima ônibus, invade a favela do lado, e [as pessoas] vêm bater aqui para reclamar. A gente fez o que pôde. Eu entendo que alguma coisa além da polícia tem que ser verificada com esse novo pacto de justiça criminal. A polícia prende as mesmas pessoas muitas vezes. A polícia apreende os mesmos menores infratores muitas vezes. Então, não pode botar nos ombros da polícia essa carga toda. Quantas vidas precisam ser perdidas para a polícia cumprir o seu papel, um ano depois, com o mesmo criminoso violento?”, questiona.
Ele também lembrou o caso dos traficantes Cláudio e Fu da Mineira, que saíram do presídio em 2013 para visita à mãe, após receberem benefício de progressão de regime, e só foram recapturados em 2015, no Chapadão.
“Essas pessoas foram presas pelo Bope com fuzis, com explosivos. Somando a pena dos dois, chega a 160 anos. Ora, por que condenar a uma pena como essa e colocar para visitar a mãe e conceder progressão em regime? É a lei em vigor. O meu questionamento é: essa lei está atrelada ao grau de violência que eles praticam? “, pontuou o secretário.
Debate
A questão levantada por Sá gera debate entre pessoas que trabalham com o setor penitenciário. Marlon Barcellos coordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário (Nuspen) da Defensoria Pública do Estado, afirmou que não há relação entre crimes graves e supressão ou concessão de direitos.
“Alta periculosidade não é um critério que a lei trabalhe em nenhum momento, é um critério que fica na avaliação do juiz. Esse é um juízo de valor muito complicado de fazer. A pessoa não foi banida nem está morta, então, a princípio, essa pessoa que está na cadeia pode voltar. O caminho é longo. De um certo modo, a gente tem que liberar a pessoa aos poucos”, explicou Marlon.
Segundo ele, os números não indicam muitos beneficiados pelo regime de progressão de regime entre os principais autores de crimes.
“Os números de presos que têm direito ao benefício e cometem crimes são baixos. O Instituto Penal Flávio de Sá Carvalho, em Bangu, tem 3,5 mil presos e 150 têm direito ao benefício de progressão meio regime. Lá os presos ficam soltos durante o dia. Acontece eventualmente de dois desses 150 cometerem crimes graves. Talvez essas duas pessoas não merecessem esse benefício, em uma análise subjetiva”, disse ele.
Já Renata Gil, presidente da Associação de Magistrados do Rio de Janeiro (Amaerj), avalia que a lei de execuções penais é “defasada”, e que é necessário que o poder executivo avalie se essa legislação atenda ao momento de violência que o país e o estado do Rio enfrentam:
“Isso é uma questão que o parlamento tem que avaliar se essa lei atende ao quadro de violência do nosso país. A gente tem no Rio a audiência de custódia funcionando muito bem. Sobre prender e soltar, a polícia tem uma visão e o sistema de justiça criminal tem outra.
Renata Gil, que é juíza criminal na Justiça do Rio há 19 anos, lembrou do que considera um detalhe importante: “Em geral, o preso mais periogo tem um comportamento adequado na prisão. Os grandes criminosos têm bom comportamento na prisão”, afirmou ela.
Presença do PCC no estado e no presídio
Na mesma semana em que um massacre terminou com 56 mortes em um presídio em Manaus, o secretário confirmou que houve transferência de presos, a pedido dos próprios, devido à possibilidade de confronto ou associação de facções detro do complexo penitenciário de Gericinó, em Bangu, na Zona Oeste do Rio.
“A preocupação é de outra pasta, da Seap. O fato de ter feito algumas movimentações já mostra que há alguma preocupação, e o trabalho de Inteligência funcionando. Então, essa cautela é sempre bem-vinda. Nas notícias de alguma movimentação entre facções, seja para se associar ou seja para entrar em confronto, ele separar esses grupos.”
Segundo Sá, há dados da inteligência da Secretaria que indicam contatos entre uma facção de São Paulo e outra facção que domina a favela da Rocinha, na Zona Sul. No entanto, ele garantiu não possuir informações sobre a presença física da facção na favela.
“Eu não posso falar de hipóteses que eu não conheço. Eu posso falar das informações de inteligência que eu tenho. A informação que eu tenho é que há interesses comerciais entre uma facção de São Paulo e uma do Rio de Janeiro. Para além disso, não verificamos nada de mais concreto”, garantiu.
Continuidade das UPPS
Mesmo em meio à crise econômica que atinge o estado desde o final de 2015, o secretário garantiu a continuidade do programa das Unidades de Polícia Pacificadora. Desde 2016, o programa, que previa a construção de unidades no conjunto de favelas da Maré, não possui novas expansões. Policiais de unidades constantemente sofrem ataques de criminosos e traficantes voltaram a dominar áreas em diversos pontos de UPPs consideradas fundamentais, como no Alemão, Penha e no Complexo do Lins.
Segundo o secretário, no entanto, é possível reverter o quadro com a presença de outras instituições nas áreas de UPP, que pouco chegaram os últimos anos de Beltrame à frente da pasta.
“A UPP não acaba. A UPP vai continuar. E eu vou fortalecer levando para esse ambiente um abraço institucional.”
“É provocar as outras instituições para estarem presentes na medida do possível. A Polícia Civil tem tido um papel muito importante com os comandantes de UPP, porque tudo é estado. Isso está compreendido na possibilidade de usar esse escasso recurso e dar uma resposta um pouco melhor, e me dá uma esperança de reverter essa tendência de crescimento e pensar até numa redução desses números”, disse ele.
O secretário, no entanto, já deixou claro que o programa tem espaço para ajuda do governo federal, município e outras pastas do executivo estadual. Segundo Sá, ainda não foi discutida uma atuação conjunta com a Guarda Municipal em determinadas áreas.
“Eu acho que tem espaço para outras pastas do executivo, para o governo federal, para os municípios. Segurança Pública é dever do Estado e responsabilidade de todos. Tem espaço para todo mundo, mas não vou ficar esperando que as pessoas venham. O que está ao meu alcance é o trabalho de polícia ostensiva e polícia judiciária. A gente não vai zerar o problema, não é essa uma utopia, e a UPP não é panaceia, mas a gente pode retornar ao tráfico de drogas e a uma convivência desse espaço como era na década de 80. O criminoso tentando vender sua droga, a polícia fazendo seu papel, dando segurança para as pessoas e garantindo direitos, mas como presença estatal e segurança pública, se deparar com o crime, ela vai atuar”, garantiu.
Índices altos em todo o estado
O secretário comentou também os altos índices de criminalidade do estado em 2016. Foram mais de 4620 homicídios, 811 homicídios decorrentes de intervenção policial e 8,5 mil roubos de carga entre janeiro e novembro, último mês registrado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), além da tendência de alta dos roubos de rua desde 2015.
“A minha fala pra população é: a polícia está fazendo o que tem de melhor. Alguns indicadores de produtividade mostram que ela está atuando mesmo nesse cenário tao antagônico, e atuando como nunca. Em dezembro de 2015, a polícia prendeu 1,5 mil pessoas. Em dezembro de 2016, em meio a essa crise, com as pessoas me perguntando o que fazer para motivar esses policiais, eles prenderam 2,3 mil pessoas [em dezembro de 2016], 800 prisões a mais [que no mesmo mês em 2015]. Eu tenho uma polícia que está respondendo, mas tem suas limitações, estruturais e até legais, uma vez que prende um cara como esse e meses depois ele está solto”, reforçou o secretário.
“Tenho uma esperança, principalmente ao ver esse alinhamento com as polícias e com o foco no cidadão. A primeira diretriz da minha gestão é de preservar vidas, e isso está sendo compreendido. Esse dado de que foram 800 prisões a mais fala muito para mim. Infelizmente, não foi possível reverter uma tendência de crescimento? A gente vai buscar essa tendência”, acrescentou.
Os roubos de carga são motivo de atenção da secretaria: Foram 8,5 mil até novembro de 2016. Segundo a associação comercial do Rio, eram previstos 9 mil até o final do ano. A maioria dos roubos, de acordo com o órgão, ocorre em uma área de apenas quatro quilômetros, no entroncamento das rodovias Presidente Dutra, Washington Luis e Avenida Brasil. A área dos complexos do Chapadão e da Pedreira, em Costa Barros, na Zona Norte do Rio, é considerada a mais crítica e o principal receptáculo de cargas roubadas do Estado.
“Hoje estamos em pleno andamento com Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar, Força Nacional de Segurança, para uma operação naquele local onde o número de roubos de carga é muito grande, e onde temos uma composição geográfica que facilita isso. Os primeiros resultados mostram uma redução. Houve essa necessidade de atuar junto com a Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal, e o Ministério da Justiça também instituiu uma portaria. Houve flagrantes de carro com motorista sendo feito refém, a carga sendo roubada, e a polícia conseguiu fazer pontos de interceptação e recuperar a carga”, explicou Sá. No dia 27 de dezembro, a polícia prendeu um criminoso conhecido como Funa da Pedreira, considerado como o número 2 do tráfico de drogas da região.
Homicídios
Enquanto o Rio registrou uma média de pelo menos 13 homicídios diários, entre janeiro e novembro de 2016, o secretário disse que ainda não foi chamado para reuniões com o ministro da Justiça Alexandre de Moraes. Sá ainda elogiou a atuação da Divisão e das Delegacias de Homicídios no Estado, inclusive nos crimes contra policiais. Até a sexta-feira (6), pelo menos seis policiais haviam morrido no Estado.
“Eu ainda não conversei com o Ministro. Preciso falar que com relação ao homicídio doloso, temos três delegacias de uma divisão de homicídios, que têm toda uma doutrina e está exportando essa doutrina. A atuação vem sendo exemplar. O Rio de Janeiro tem feito o seu papel e tem uma estratégia. Claro que nós temos uma sociedade violenta e que se mata por muito pouco. Essa morte da grávida com o feto, esse crime passional com o embaixador. A nossa sociedade está doente. A polícia deu a resposta nos dois casos. A DH criou um grupo específico para investigar as mortes de policiais. Então, o Rio tem feito o seu papel”, acredita o secretário.
Segundo o chefe da Divisão de Homicídios, Rivaldo Barbosa, 40% dos homicídios do Rio ocorrem em cinco bairros: Bangu, Realengo, Pavuna, Santa Cruz e Campo Grande.
G1/vavadaluz
Creio que o código civil e sistema prisional deveria ser revisto; uma vez que condenados de pequenos delitos são colocados lado a lado com bandidos de alta periculosidade.
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