Atolada em esquemas de corrupção em compras de material escolar, sacolas plásticas e coleta de lixo, a Prefeitura de Mangaratiba fraudou também licitações na área da Saúde. Uma auditoria da Secretaria Estadual de Saúde detectou medicamentos e equipamentos hospitalares com até 9.000% de superfaturamento. Pelo menos 50 mil unidades de medicamentos foram comprados por preços com sobrevalorização de 1.000%, em relação a valores de referência do Ministério da Saúde (MS). Uma escova dental da marca Robinson, por exemplo, que custaria R$ 1,99, foi comprada por R$ 101,70, 5.010% mais cara.
Uma pílula do remédio Paclitaxel, usado no tratamento contra câncer, avaliado pelo ministério por R$ 19,60, foi comprado pela Secretaria Municipal de Saúde por R$ 1.766 — superfaturado em 8.910%. A compra foi feita na farmácia Venâncio Produtos Farm, empresa que forneceu 11 medicamentos, com superfaturamento de mais de 1.000%.
Uma pílula do antiflamatório Diclofenaco Potássico, com preço de R$ 0,01 no Banco de Preços em Saúde do MS, foi adquirida por R$ 0,40. Foram compradas 40.500 pílulas por este valor, 3.233% acima do valor. Na área de Odontologia, o esquema é o mesmo. A secretarial estadual constatou uma média de sobrepreço de 394% nas notas fiscais, entre elas, a das escovas de dente de R$ 100.
A devassa da secretaria foi feita a partir de um levantamento do Conselho Municipal de Saúde, que comunicou ao órgão as irregularidades em Mangaratiba. Eles vistoriaram o Hospital Municipal Victor de Souza Breves e os postos de Saúde da Família da Serra do Piloto e Manoelito Dias Moraes, entre 26 e 28 de maio de 2013. A secretaria determinou que a prefeitura cumprisse as recomendações da auditoria para resolver os casos de superfaturamento, argumentando que “o observado no processo de auditoria é inquestionável, pois as documentações de referência substanciam as observações”. Porém, nada foi feito.
As denúncias foram enviadas aos ministérios públicos estadual e federal. Uma das fornecedoras dos itens superfaturados, a Proll Comércio e Serviços Ltda., aparece na ação proposta pelo Ministério Público Estadual referente a licitações de cartas marcadas no município. O processo resultou na prisão do agora ex-prefeito Evandro Bertino e de dois secretários de governo, na sexta-feira.
Membro do Conselho Municipal de Saúde, Paulo Fabrício Nigro afirmou que os sete conselheiros que reprovaram as contas da saúde da prefeitura em 2012 suportaram fortes pressões do governo de Evandro e de seu vice, Ruy Quintanilha, para mudar os votos que reprovaram as contas. “Apesar de hostilizados e até ameaçados, os conselheiros mantiveram as suas corajosas decisões”, disse Nigro.
Um relatório do Conselho de Saúde de Mangaratiba também foi citado no parecer do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) que reprovou as contas da prefeitura, derrubado mais tarde pelos vereadores da Câmara Municipal.
O TCE determinou à Coordenadoria Municipal de Auditoria Governamental que considerasse, em futuras auditorias a serem realizadas no município, as observações que levaram o conselho a não aprovar a aplicação dos recursos na Saúde pelo gestor municipal.
Com a prisão de Evandro Bertino, na sexta-feira, assumiu o vice, Ruy Quintanilha, do mesmo partido (PSD). Ruy, que é médico, já era vice de Evandro na época em que foi realizada a auditoria da secretaria estadual e era responsável, conforme o próprio declarava, por “tomar conta” da Saúde no município.
O vice rompeu com o ex-prefeito em agosto do ano passado, durante período em que o município passava pela investigação sobre licitações de cartas marcadas do MP. De acordo com informações de seu gabinete, o relatório teria “sumido ou sido queimado pelo ex-prefeito”. Em seu perfil no Facebook, Ruy anunciou que daria início a uma auditoria na prefeitura nesta semana.
Fornecedora de merenda escolar teve valores reajustados para cima
Uma das empresas denúncias pelo MP por fraudar as licitações com pregões de cartas marcadas em Mangaratiba renovou neste mês contrato com o município. A Mercearia Ideal de Jacareí, que fornece a merenda escolar para as unidades de ensino municipais, fechou contrato com a prefeitura, no início do mês de abril, com valor total de R$ 4,376 milhões.
O valor ainda aumentou em relação ao ano passado, quando foram pagos R$ 3.971 milhões à empresa. Na denúncia do MP contra a mercearia foram citadas mais 15 empresas. Os responsáveis por elas e mais 17 funcionários da prefeitura foram denunciados por formação de quadrilha, fraude em licitação e uso de documento falso. As penas variam de um a seis anos de prisão.
Duas das pregoeiras denunciadas pelo esquema das fraudes das licitações, Bruna Seiblerlich de Souza e Priscila Tereza Conceição dos Santos Martins Leão, que também atuavam na mesma função na Prefeitura de Itaguaí, foram exoneradas deste município pelo prefeito, Weslei Pereira, que tomou posse no dia 1º de abril. Isso porque o ex-prefeito Luciano Mota, do PSDB, conhecido como “o homem da Ferrari”, foi afastado do cargo há cerca de 20 dias pela Justiça Federal, também sob a acusação de corrupção.
Depois do Mensalão e Petrolão, chegou o Escovão….
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