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O Cheiro da Minha Lancheira ( Dunga Jr. )

O Cheiro da Minha Lancheira

Meados de 2009, era tarde de um dia da semana, eu vinha na BR 230, saindo de João Pessoa, destino Campina Grande, na Paraíba. Tinha como companheiro de viagem @camurcajoaopaulo. Sabedor que eu ia lançar o livro “Para Guardar na Lembrança que é Amiga da Saudade 2010”, que já estava em fase de impressão, deu-me um mote para o próximo: “O Cheiro da Lancheira”. O mote foi tão interessante que comecei imediatamente a escrever e, na chegada de Riachão do Bacamarte, já me pus a declamar.
Em 2010 tive meu computador notebook levado num assalto e, junto, foi o belíssimo poema, hoje, que me atrevo a reescrever.
“Minha lancheira era tão simples como os lanches contidos nela, mas, seu cheiro, basta eu fechar os olhos que o cheiro me invade a alma, aperta o coração, os olhos se molham e os sabores voltam e enchem a boca d’água.
Era pequena, de cor forte, ou mesmo um embrulho bem feito, acomodado na bolsa que eu levava nas costas. A toalha branca, com minhas iniciais, mostrava o carinho e amor ali presentes: tudo isso tem o cheiro da lancheira.
Eita, que o cheiro da bolacha Maria, recheada de doce de goiaba; a banana com o pão assado na manteiga de gado; a bolacha assada; o bolo feito em casa, com uma gota de Nescau no meio; a goiaba madura; a vitamina de banana ou abacate: eram os cheiros e sabores de minha lancheira.
Era tudo tão simples e puro, era tanto amor de minha mãe, que eu nem notava; era tanto cuidado, que eu nem via; era amor verdadeiro, amor materno, que me acalantava – tudo isso era o cheiro da lancheira.
No acordar, com a preguiça natural de ir para a escola, o medo de enfrentar o dia de prova que não tinha estudado, eu nunca tomava o café da manhã para ir pra escola, apesar de ser oferecido com tanto fervor. Os passos lentos na chegada da escola, os encontros, as intrigas, as confissões; mentiras e verdades contadas, umas faladas e outras nunca ditas; tudo isso tinha o cheiro da lancheira.
Foram vários lanches permutados, foram vários lanches cobiçados; era a partilha da amizade, dos primeiros amores, dos primeiros beijos; dos olhares trocados, dos sonhos sonhados; dos tempos nem tanto lembrados; da nota baixa guardada; do 10 proclamado; da recuperação, final e ré-ré prestados: tudo isso tinha um cheiro da lancheira.
Hoje, repousando em mim, fecho os olhos e lembro desse cheiro, que na abertura da lancheira levantava em fragrância e aroma, mas, tinha o cuidado, o querer bem, o sabor de mãe e pai, de casa e de vida. Era o que tinha na hora, e dia que nem tinha, mas, só lembrar desse cheiro, sacia-me a danada da saudade e alimenta a alma.
Quanta gratidão, quanto ensinamento contido, quanto verbo expresso, quanto adjetivo referido, quanto valor criado – estes eram os resultados dos sabores e cheiros de minha lancheira.
Obrigado, Mãe e Pai – podia faltar até o que comer, mas, o cheiro sentido, o amor contido, a presença, o olhar, o dizer, o dar, o receber, a prece e a oração, o sentir e o prazer, fazem esse cheiro viver e reviver.
Agora, desafio: fecha os olhos e traduz o cheiro da sua lancheira.

Dunga Jr.
De um dia de Domingo 19/03/23

1 comentário em “O Cheiro da Minha Lancheira ( Dunga Jr. )”

  1. Até hoje tenho lembrança e saudades do cheiro de minha lancheiro. E esse cheiro tinha tanto sabor….sabor do amor de mãe.

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