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    O banquete que não é a ceia (Damião Ramos Cavalcanti)

 

 

          O mundo vivencia o retorno separador da Guerra Fria, guerra sem fogo, com armas nucleares, apenas para se mostrar poderio bélico ameaçador: faz-se temido quem tiver armas mais mortíferas que abatam, na maior velocidade, o inimigo mais distante ou tecnologicamente onde ele estiver… Nesses aspectos, os leaders seriam os representantes de dois blocos, sempre ideologicamente antagônicos.

          Por aqui, numa “guerra quente”, há quem se dedique, diuturnamente, o que me parece bem pago, à divulgação de fake news e de bobagens políticas, fazendo piada com as coisas mais sérias, como se fosse uma forma de ridicularizar as ideias alheias, desde que a deturpação favoreça particularmente sua política dentro da sua religião, e elegendo políticos, fieis às suas igrejas. Ora, a liberdade religiosa deveria apregoar a liberdade política… É uma peste na internet, de baixo nível intelectual, religioso e político, que atinge o bem-estar da nossa dignidade, a qualidade da nossa visão crítica e a civilidade da nossa convivência.

          Nossos celulares recebem mensagens vazias que atacam “a esquerda francesa”, na pessoa de Thomas Jolly, comunicador e Diretor Artístico da abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, junto a aristas coadjuvantes, por terem escolhido o Banquete dos Deuses, do holandês Jan Van Bijlet, para uma releitura que representasse, num banquete dionisíaco, a festa da diversidade, no palco desta olimpíada. Tal tela de Bijlet trata de um banquete pagão, cuja figura central é o deus grego Dionísio. Não poderia ser alguma figura religiosa ou política, já que as regras olímpicas, rigorosamente, proíbem, durante os jogos, qualquer manifestação política ou religiosa, como, nestas Olimpíadas, foi vetada a impressão do Cristo Redentor na prancha de Chumbinho …

          E aí lá vem, através de WhatsApp e outras mídias afins, a “direita” culpabilizar a “esquerda francesa” de uma suposta e enganosa semelhança, em trocar os deuses pagãos do Olimpo pelos apóstolos; e Dionísio ou Baco por Jesus Cristo. A sociologia e o relativismo antropológico demonstram que até as ideologias e as religiões são constituídas por uma enorme diversidade de princípios, de valores, de doutrinas, enfim, culturalmente, de fé e de credos. Subsistem, com direito a conviverem ecumenicamente, observando como substrato o amor, e especialmente na política, o pensamento maior do Bem Comum, das ideias de Platão, Aristóteles e Cícero.

          Dividir simploriamente o mundo, em direita e esquerda, remonta ao período da Revolução Francesa (1789 – 1799), quando os conservadores e moderados parlamentares, defensores do status quo, chamados de girondinos, sentavam à direita do Presidente da Assembleia; e os progressistas e radicais defensores dos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, do grupo dos jacobinos, à esquerda. Ainda corroborava esse dualismo, a coincidência da elite ou nobreza habitar à margem direita do rio Sena; e os pobres de Paris, à margem esquerda. Como isso perdurar entre nós, atual e intensamente, se as nossas realidades religiosas e, sobretudo, políticas, são compreensivelmente muito mais complexas? 
          Finalmente, nem tudo que tem gargalo estreito é vaso ou garrafa… Que se saibam distinguir os conteúdos e características da Última Ceia, de Leonardo Da Vinci, da de Jan Van Bijlet, que pintou o banquete que não é ceia, cuja releitura pelo artista Thomas Jolly se tornou polêmica para além da Olimpíada.

 

 

Damião Ramos Cavalcanti

1 comentário em “    O banquete que não é a ceia (Damião Ramos Cavalcanti)”

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