No próximo domingo, 2 de novembro, é dia de finados, esses estarão isentos, nem lamentam, nem se contentam com o envelhecimento. Tal assunto, post mortem, tanto faz… O que significa que faixas etárias e coisas como andar rápido, correr ou trepar em telhados ou em coisas sui generis, só em vida. Acredito que o pior seria a perda progressiva da memória, como se fosse a perda da capacidade de um gravador de rolo; e como não esqueço do meu excelente Akai, que vem desaparecendo com seus rolos de música boa e prolongada.
Mas, os equipamentos tecnológicos, ultimamente, não envelhecem, fabricam rapidamente as suas substituições, com apenas inovações, inclusive as que surgem da IA, robôs que se vestem de branco no lugar dos médicos; máquinas que se vestem de macacão cinza no lugar dos operários e chips como motoristas nos avançados carros elétricos. Apenas Flávio Tavares diz não deixar a IA tocar nos pincéis das suas pinturas. Haverá médico lendo essa crônica e incluindo-se: “Eu também não, a AI é uma mera auxiliar, sobretudo na cirurgia”.
O que a AI não faz é afastar a necessidade do envelhecimento, como se inteligentemente reconhecesse que sem velhice morrer-se-ia cedo, viver-se-ia apenas e talvez a metade da vida… Então, concluo também que por isso envelhecer é necessário, para se viver totalmente a vida. Ainda mais a maior coisa que se teria para um completo discernimento é a experiência da vida e quanto mais se vive ou vida se tem, mais experiência se adquire, também é o que alimenta o nosso bom senso. Daí, envelhecer é continuar vivendo.
O general romano Pompeu, um dos cônsules da Roma Antiga, que se achando na Sicília por estratégia política, onde ouviu as reclamações dos seus patrícios aos quais lhes faltavam pão. E determinou seus soldados enfrentarem o mar, que, temerosos de se tornarem marinheiros, precisaram da exortação de Pompeu, admoestando-os a superarem a paúra de zarpar num mar agitado e cheio de piratas vikings, para trazerem trigo do Egito à Roma, onde se poderia haver posterior e plenamente o verbo viver… Então discursou aos seus milites e lapidou a frase que teria aprendido numa citação do historiador grego Plutarco, no século I a.C., que subsiste até aos dias de hoje: Navigare necesse, vivere non est necesse ou “Navegar é preciso, viver não é preciso”, sentença trazida ao português pelo poeta Fernando Pessoa; caiu em letra de fado; depois muita usada aqui por artistas e políticos, num contexto histórico bem diferente …
Como ele, inspiro-me para usá-la nesta crônica: Senectus necessaria est ou a velhice é necessária, para que a vida saiba ser bem concluída. Talvez como o Sol, o fim da velhice é como se fosse o nosso último poente… Maravilho-me na Canção dos Dinkas, lida em Max Scheller, no livro Mort et Survie, p. 13: “Um dia Deus criou todas as coisas./ Criou o Sol./ O Sol levanta-se, deita-se e depois volta./ Criou a Lua./ A Lua levanta-se, deita-se e depois volta./ Criou as estrelas. As estrelas levantam-se, deitam-se e depois voltam./ Criou o homem./ O homem aparece sobre a terra, desaparece e não volta”.
Por isso, antes de desaparecer, a velhice se faz necessária…
Meus agradecimentos aos leitores da minha crônica.