Apagadas as cinzas das fogueiras juninas, ficaram registrados alguns protestos com referência à infiltração de músicas de outros estilos nos palcos armados para homenagem a Santo Antônio, São João e São Pedro. O tradicional forró-pé-de-serra, o xote e o baião imortalizados na voz e na sanfona de Luiz Gonzaga abriram espaço para as duplas sertanejas. Discriminados por terem sido arautos de críticas mordazes em anos anteriores, Alcimar Monteiro e Elba Ramalho por exemplo, amainaram seu desconforto e terminaram ganhando algum espaço. Outros permaneceram esquecidos.
As festas juninas são patrimônio cultural do nordeste. As comidas típicas, as danças que celebram um casamento matuto e as canções que movimentam os grandes salões ou as praças públicas devem ser preservadas. Poucos vivem essa preocupação. Fiquei orgulhoso quando vi e ouvi Amazan, em Conversa com Bial, proclamar ao Brasil que Bananeiras, na Paraíba, conseguira manter o tradicional forró-pé-de-serra. A experiência iniciada por Marta Ramalho como prefeita e Ana Gondim como secretária, gerou um evento de grandes proporções sem precisar requisitar maiores nomes televisivos, mas figuras que praticam a música genuína do nordeste.
Fosse vivo, Ariano Suassuna estaria incorporado a essa luta, da mesma forma como se enfileirou aos que combatem as letras musicais que nada dizem mas ocupam espaços nobres da crítica. Que se esperar de versos que repetem esse refrão: “Toda parede espera por um prédio/Um cavalo morto é um animal sem vida/ Ao redor do buraco tudo é beira”. Por outro lado, quando se aproxima do regionalismo, o chamado “forró de plástico” repete versos de péssimo gosto. Ariano destaca a Banda Calypso, cujo cantor, Ximbinha, é qualificado por um jornal como “genial”. Retruca o imortal: – “se eu gasto um adjetivo desses com Ximbinha, o que poderei dizer de Beethoven?”. Se “tudo começou naquela festa”, “prá me conquistar você tem que dançar/pra me conquistar você tem que balançar/prá me conquistar você tem que suar/prá me conquistar você tem que rebolar” eis um produto da genialidade ximbiesca, na composição de Edilson Moreno.
Muito diferente são as músicas compostas por Petrúcio Amorim ou Maciel Melo cantadas por Flávio José, poesia pura mergulhada “nos becos do meu passado/perdido na imensidão desse lugar/ ….deixe meu verso passar na avenida/ um forro fiado tão da bexiga de bom”. O mesmo intérprete imortaliza o linguajar do nordestino do interior quando canta Acioli Neto: “Se avexe não/ amanhã pode acontecer tudo/inclusive nada/ Se avexe não, a lagarta rasteja até o dia/ em que cria asas”.
Além de Flávio José, outros forrozeiros autênticos sobem aos palcos da maior festa nordestina. Waldonys, Santana, Nando Cordel, Jorge de Altinho, Os três do Nordeste, Aleijadinho de Pombal, Deijinha de Monteiro, Wagner Viana, além de Elba, cujo repertorio inclui Dominguinhos, Luiz Ramalho e o velho Luiz Lua Gonzaga. Esse sim, um genial e genuíno cantador das coisas do nordeste nas composições de Zé Dantas, Humberto Teixeira, Rosil Cavalcanti e muitos outros. Para exemplar, nada melhor do que os versos de Patativa de Assaré que Gonzagão eternizou: “Meu Deus, que é de nós/Assim fala o pobre/do seco nordeste/com medo da peste/ da fome feroz”.
Essas são “Canções que falam por nós”, como diria o especialista Rui Leitão. E o verso, “Ao redor do buraco tudo é beira”, fala por quem? (Republicado por incorreção dos promotores de festas juninas, que, agora, inventaram um tal de “forronejo”, mistura incestuosa do forró com sertanejo. Só rindo)
Muito bom o texto com a realidade cretina dos que tem poder de mando. Bananeira que não perca a linha!
Mas faltou falar de meu conterrâneo Jackson do Pandeiro, incrível rei do ritmo não menos regionalista!
Não é possível comentar.