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QUINHA :Um exemplo de vida (confira)

 

A “mulher do tamborete” foi batizada de Ângela Maria da Silva, acha lindo o nome recebido, e é conhecida no bairro do Coque como “Quinha”. Apelido de infância. “Nasci para ser cantora”, diz a vendedora de banquinhos de madeira. A mãe sonhou com o estrelato desde que Ângela Maria se entende por gente. A fama acaba de chegar para ela, aos 44 anos. Mora na Favela do Papelão (Coque), periferia das mais pobres do Recife, a mais nova celebridade da internet.

A prova do sucesso: já foi visto mais de 55.145 vezes um vídeo caseiro que mostra Quinha cantando para vender os bancos que ela fabrica no quintal de casa com madeira colhida no lixo. Foi gravado por um grupo de estudantes secundaristas. Está no Youtube, site popular de compartilhamento na rede mundial de computadores, sob o título “mulher do tamburete” – assim mesmo, com %u2018u”. Tamborete, no Nordeste, é sinônimo para banco simples, sem encosto, feito de pau. “Nunca imaginei que a internet me levasse tão longe nem que essa gente toda me visse e gostasse da minha voz”, diz ela. A vendedora deixou sua casa de dois cômodos sem reboco para ver o próprio show por três vezes. Assistiu em computadores de conhecidos. As imagens dela na labuta diária foram gravadas do alto de uma varanda de um prédio residencial do bairro da Boa Vista.

 

No vídeo ela aparece interpretando uma composição de sua autoria. “É assim a música: O tamborete só paga cinco, óia. E ainda serve pra sentar, pra conversar, pra namorar, falar de bem, falar de mal, óia%u2026”, entoa um de seus versos, em timbre alto, soltando o quanto pode a voz. “A partir dali, virei a cantora dos bancos”, diz, orgulhosa com a repercussão. Foi tanta que, na semana passada, a melodia criada por Quinha do Tamborete ganhou versão na voz da personagem Dulce, uma vendedora de cocadas interpretada pela atriz Cássia Kiss, na novela das 19h da TV Globo, Morde e Assopra. Dulce sofre com a pobreza e com a discriminação. Um roteiro que muito se assemelha ao da vida real de Quinha e da maioria dos residentes do Coque, comunidade onde 6 em cada 10 pessoas são consideradas indigentes e sobrevivem com apenas 1/4 do salário mínimo.

Ao Coque, a ilustre cidadã recifense Ângela Maria deu o que há muito os moradores não sentiam: auto-estima. É ela passando e os vizinhos elogiando. Para os moradores da Favela do Papelão, tida como área violenta bem próxima ao Viaduto Joana Bezerra, Quinha é o retrato de uma maioria de gente trabalhadora, do bem, que lá reside. “É bonito aparecer na internet como uma pessoa que luta pelo pão. Para mim, tudo mudou”, afirma a nova celebridade da internet. Por onde anda hoje, ela distribui autógrafos (“Acho ótimo porque a sociedade pode ver que no Coque tem gente guerreira”). Os amigos e familiares se emocionam com cada novidade (“Uns até choram”). Aumentou a venda dos banquinhos fabricados por ela com resto de madeira desprezada por outros (“Eita, deixa eu contar: até passei a ganhar mais madeira do povo”). O preço do tamborete continua o mesmo: “É R$ 5,00, óia”. Só cresceu a disposição da vendedora para fabricar, junto com o marido e instrutor de carpintaria Francisco José.

 

Confira a história de Quinha

Aprendeu a serrar e martelar há 15 anos para ajudar seu Francisco no sustento dos dois filhos, Aliete e Francisquinho. Atualmente desempregado, seu Francisco dedica-se à fabricação artesanal do tamborete. “Só volto para casa quando vendo todos os tamboretes que tenho. Tem vezes que são cinco, seis. Depende da madeira que ganho”. Nas ruas dos bairros dos Coelhos, Cabanga, Mustardinha ou Centro do Recife, é reconhecida. “Pedem pra eu cantar e eu canto”. Na filmagem improvisada pelos estudantes ou numa conversa sentada no quintal da casa modesta localizada no beco da rua Apuã, os olhos de Quinha do tamborete brilham de emoção ao cantar. Sem esforço, ela assume seu lado Ângela Maria. Diverte-se, mas continua preocupada com o básico: comida no prato. Os sonhos dela? Ter carteira assinada como vendedora e ganhar uma maquita, instrumento para cortar madeira, para vender bancos nas ruas e cantar mais e mais.

Diario de Pernambuco