Pular para o conteúdo

Blog do Vavá da Luz

O CAUÍRA (Marcos Souto Maior)

 

 

                                                                                                                           MARCOS   MARCOS SOUTO MAIOR (*)

                               Um cara de classe média alta, com todos os luxos que pudesse ter: casas próprias, de residencial e para veraneio, dois automóveis novos, alegre, conversador, querido e frequentando o high society. O único pecado era não gastar dinheiro! Nos tempos do famigerado e decadente Plano Collor, ele abriu no banco predileto trinta contas poupanças. Rigorosamente, todos os dias, aguardava o banco abrir as portas para ver, e conferir várias vezes, seus recheados saldos bancários. Às vezes tirava também no final da tarde.

                               Charles fez logo amizade com uma gerente muito simpática que atendia todos os santos dias, de lápis na mão anotava todas as operações aritméticas e, finalmente, os respectivos e repetitivos saldos. Quando o sistema estava fora do ar, em visível nervosismo, pedia um cafezinho com biscoitos, especialmente para os clientes Vips, repetindo a dose, até os extratos serem entregues em mãos.

                               No período de veraneio, se mudava para a praia com a sua família, mas não convidava parentes nem amigos para evitar gastos… Logo cedinho, ele se levantava, empurrava uma surrada sandália Do Pé e, deixava camisa de linho para vestir as de propaganda de políticos, produtos ou serviços. Cumprimentava a gorda cozinheira Marly e entregava três palitos de fósforos para acender o fogão no café matinal, no almoço e no jantar. A recomendação à única doméstica da casa, de forno e fogão, era sempre colocar pouca coisa nas caçarolas para não sobrar ou estragar… 

                               Os detalhes econômicos eram inacreditáveis e insuportáveis pela família, a ponto de pedir a mulher e filhos que só dessem descarga no vaso sanitário, se a água estiver amarela bem escura ou com fezes!

                               Certo dia, antes dos caixas conduzirem dinheiro para o caixa, meu herói teve sua atenção surpreendida por vários bancários conversando animadamente sobre o casamento da tal Gerente que lhe atendia especialmente. Logo se chegou de onde partia a conversa, tirou do bolso um papel riscado pela metade e, na parte que sobrou anotou a data do casório. Claro que, prudente e economicamente, não compareceu ao casamento, mesmo num sábado que não tem trabalho por grande parte do povo.

                                Depois da merecida lua de mel, Charles entrou no banco e avistando de longe a noiva, sua Caixa predileta, dando com a mão em sinal de que voltaria. Desceu ao estacionamento do banco e voltou conduzindo um grande embrulho. Logo que ultrapassou a porta elétrica desfilando entre clientes e funcionários, levantou o pacote como se fosse um importante troféu, bem se parecendo com uma caixa com baixelas ou talheres. 

                               Querida amiga desculpe não ter ido ao seu casamento porque adoeci com uma incontrolável dor de barriga. Mas, aqui está a minha lembrancinha e votos de felicidades! Saldou nosso amigo, Charles, com ares de importância e suspense. A curiosidade foi irrecorrível e na pressão do coro popular: abre, abre, abre, abre eis a caixa desnudada mostrando seis pacotes de macarrão grosso, bom prá engordar uma saborosa sopa de feijão seco.

                                Vazou comentário de um bancário gaiato, confirmando que Charles teria sugerido a seus familiares usar papel higiênico, em frente e verso.

                                                                                                (*) Advogado e desembargador aposentado