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Blog do Vavá da Luz

NO REINO DA CAROCHINHA (Marcos Souto Maior)

 

       MARCOS SOUTO MAIOR (*)

O reizinho estava eufórico com a aquisição da nova carruagem voadora, o que lhe permitiria sobrevoar os feudos do seu império e também os demais reinados do mundo. E andava pelo Palácio rindo à toa, ao lado da bela Rainha!

                                               A vassalagem logo partiu com sacolas cheias de moedas de ouro, para providenciar a estocagem com toneladas de frutos do mar na geladeira, notadamente: lagosta, camarão da água salgada, salmão, siri e kani kama. Este último, um prato exótico japonês em forma de bastão, feito de carne branca de peixe, aromatizado com extrato de caranguejo e algas com molho de crustáceos, vinho de arroz e glutamato monossódico que, trocado em miúdos, é o sal presente em todas as proteínas animal e vegetal que deixa a comida rica e suave.

Para acompanhamento do bom vinho ‘gran reserva’ e do uísque dezoito anos, compraram os queijos importados, salgadinhos, azeitonas, salames e outros quitutes cinco estrelas.

                                               Só em ler, imagino dever dar gosto na boca do leitor!

                                               A turbinada carruagem imperial, com capacidade para sete ou nove pessoas, fora batizada de “Rei do Ar”, em versão atualizada para nossa língua. O povo se dividia entre a realeza enciumada e os súditos abestados que batiam palmas toda vez que o rugido da máquina soava nos céus.

                                               Foi na carruagem novel que o Reizinho, sempre aborrecido e mau humorado, abandonou as festivas eleições dos Condados (shires) de Cornwall e Lincolnshire indo se esconder para não ver um adversário vencer nos votos da população.

                                               E o Reino da Carochinha elegeu um jovem e experiente príncipe para administrar o Condado mais importante da região, com direito à festa de arromba, que varou as madrugadas das ruas pacatas da bela praia.

                                               Indo muito longe, o monarca não ouviu o espocar de fogos, a música eletrizante e a alegria do povo liberto. Nem mesmo o Bobo da Corte conseguiu contar uma piada apimentada ou o Procurador-Mor inventar a mentira de que os Precatórios foram pagos a todos. Também a Rainha, o Príncipe herdeiro, os Duques e os vassalos estavam tristes como uma noite de velório.

                                               Se espreguiçando na reclinável poltrona da bela e veloz carruagem, o Imperador olhava para as nuvens que nem menino quando via ‘algodão doce’ na saída das escolas. Com dois dedos apoiando um lado das faces, seu pensamento era só de vingança aos que não cumpriram com suas ordens.

A carruagem nas altas nuvens balançava pela força do vento, como se a natureza ousasse atrapalhar o repouso monárquico lhe chamando para o real. Mais ou menos tempo, a coroa do rei vai ser levada ao Conselho Supremo onde não existem garantias de um dos seus herdeiros ser coroado.

A esnobe comida e bebida não fora consumida. E engolir a notícia triste da derrota nas urnas nem com sonda nasogástrica entrava. E o rei resmungou: “hoje não existe mais monarquias nem Reis, a rebeldia precisa ser contida, mesmo no pau!”

(*) Advogado e desembargador aposentado