Fui ali a Cubati-PB
Numa tarde de sábado em janeiro de 17, parti de Campina rumo ao Seridó paraibano, precisamente para a pequena e aconchegante cidade de Cubati, conhecida pelo evento de supercross; ali me esperava um grande compromisso: seria na manhã do domingo oficializado como padrinho da menina Clarice Maria, filha dos meus amigos Thuca Kércia e Bruno Gaudêncio, historiadores que há muito conheço e recolho sincera amizade.
Saindo de Campina na companhia de Bruno, sua mãe e sua irmã Aluska subimos cerca de 150m até chegar ao fim do distrito de São José da Mata e os seus 704m de altitude. A partir dali se descortinam “as quebradas do sertão”, descemos sinuosamente aquele relevo sendo espiados ao lado direito pela serras do Maracajá e do Engenho, emoldurando aquele cenário onde o sol já dava sinais de cansaço. Os blocos rochosos pareciam itens de decoração, majestosamente dispostos, curiosamente equilibrados.
Passamos pela lendária Praça do Meio do Mundo com destino a Soledade, até ali a vegetação se beneficiava das poucas chuvas, juremas pretas e brancas, unhas de gato, marmeleiros e outras espécies se mantinham verdes, cor que não duraria muito tempo. Aos poucos, os tons iam mudando até que, nas proximidades da antiga Ibiapinópolis o verde se desfez. Em Soledade e sua movimentação urbana denunciava o cair da tarde de sábado, muita gente na rua, crianças a brincar, homens e mulheres nas praças, um colorido intenso. No fim da cidade tomamos a PB 177. Dali em diante o caminho estava mais apreciável, até porque não havia a movimentação incessante de carros que tem na BR 230. Ali pude ir mais devagar e curtir aquelas paragens sem ser demasiadamente exigido pelo trânsito.
Com forte nebulosidade, a temperatura estava amena, desci os vidros do carro, senti aquele cheiro acatingado. A brisa que ali passava nos envolvia trazendo os cheiros do mato ressequido e levantava a fina poeira branca que tomava o leito seco daqueles riachos. Vimos um redemoinho cruzando a estrada, seria a Comadre Florzinha? A estrada possui muitas curvas e as cruzes no acostamento testemunham de que muitos ali sucumbiram, por imprudência da velocidade ou por distração em encanto àquele torrão. Aqueles carrascais pelos quais passávamos, aquela terra arenosa, calangos e pequenos pássaros coloridos, tudo era belo e o cenário se tornava admirável para se trilhar e reverenciar.
Passamos pela estrada de Seridó e em seguida rumamos à direita pela PB 167 até surgir na paisagem uma antena e o telhado de zinco de um ginásio esportivo, era ali nosso destino. Adentramos a cidade e já percebemos o calçamento cuja curiosidade eram as pedras irregulares e lisas, já sabíamos que pisávamos em solo histórico. Cubati já foi chamada de Canoas quando ganhou status de distrito em 1915 voltando ao antigo nome em 1943. Passamos pelas ruas principais e observamos muitos populares nas calçadas, sentados em cadeiras de balanço ou mesmo no chão, curtindo aquele cair da tarde. Aqueles 25ºC de nada incomodava.
Na rua principal, cujo destaque é a Igreja de São Severino Bispo, caminhamos observando a arquitetura e fomos ao Casarão bar, com sua decoração semelhante a botequins antigos, com azulejaria na parede, etc. Preferimos a calçada e ali observamos o cotidiano. Nesse momento chega um tipo popular, o Piriroca. De olhar fixo em um ângulo perdido, busca relógio, pulseira ou algo de metal: “–Não quero roubar não, quero limpar!” e assim segue seu périplo, após a insistência e a seguida limpeza, ele estira a mão em busca de uma “prata”, recompensa pelo serviço executado. Piriroca deve ter perto de seus 40 anos e perambula pela cidade atrás de ‘pratas’ e novidades entrando sem timidez em qualquer porta aberta.
Na missa de domingo, Piriroca* – sem qualquer cerimônia – caminha pela igreja, se posiciona ao lado do padre fitando-o e procura um desconhecido dentre os fiéis para seguir sua peregrinação, eis que ele me encontra, com terno preto e óculos escuros. Como minha posição no banco era central, ela não tinha acesso a mim, mas ficou de longe, esperando uma oportunidade. Um ou outro desavisado acaba não tendo a paciência necessária e é rude com aquela figura folclórica. Por Deus, a maioria das pessoas o tratam com parcimônia, inclusive o Pe. Fernando, que em determinados momentos parecia não conter o sorriso diante de algumas cenas provocadas por este cidadão histórico.
No fim, batizei Clarice, portei a vela santa e participei de todo o processo, desde a reunião do dia anterior. Entre águas, orações e óleos, senti reacender traços ritualísticos e uma sensibilidade cristã esquecida há muito. Experiência ímpar e um compromisso para a vida inteira. Para ser ainda mais marcante, estávamos diante dos 3 primeiros batismos da nova Paróquia de São Severino Bispo e São Vicente Ferrer. Quanto a Clarice? Aquilo é um amor! Depois de dormir a missa toda, acordou para o batismo e no alto de seu décimo terceiro mês de nascida, se comportou direitinho e ainda esbanjou sorrisos para o Padre e padrinhos.
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Publicado na coluna ‘Crônica em destaque’ no Jornal A União de 10 de abril de 2021.
*estamos para conseguir um retrato melhor de Piriroca, ainda esta semana postaremos aqui.