Em sua primeira palestra após deixar a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva falou nesta quarta-feira (2) sobre os oito anos de seu governo e destacou que um dos piores momentos que viveu como presidente foi durante a crise financeira internacional, no fim de 2008. Ele relembrou o episódio em que comparou a crise a uma “marolinha” e disse que foi “achincalhado”.
“As pessoas diziam nos jornais: ‘Quero ver se o Lula agora vai conseguir governar com a crise’. O mundo até então estava crescendo, eles diziam que era sorte. Quando [então] veio a crise, eu disse que era uma marolinha. Por conta da marolinha, eu fui achincalhado, diziam que eu estava menosprezando a crise”, afirmou a funcionários da empresa LG durante palestra sobre macroeconomia em evento no Expo Transamérica, na capital paulista.
O evento foi aberto por volta das 18h40, mas Lula só começou a falar às 19h30. O ex-presidente foi apresentado por um executivo da LG que afirmou que o bom momento da empresa devia-se ao “resultado da política econômica conduzida por Lula em oito anos”. O ex-presidente intercalou a palestra entre leitura de páginas e falas de improviso. O discurso durou cerca de 40 minutos.
Ao falar sobre a crise a funcionários da LG, Lula disse ainda que foi um ato de “coragem” ter feito em rede pública de televisão o que chamou de “apologia do consumo”. “Eu fiz uma coisa que poucos políticos tiveram coragem de fazer. Quando começou essa história de que o povo estava com medo de comprar, eu chamei o Franklin (Martins, ex-ministro da Comunicação Social), e disse: ‘Se prepara que eu vou à TV fazer pronunciamento fazendo apologia do consumo’.”
Ele disse então que foi criticado dentro do próprio governo. “Tinha gente que não queria que eu fosse porque era arriscado. Mas eu acho que ajudou a resolver.”
Para Lula, a política de “diminuição da desigualdade e distribuição de renda foram importantes para reduzir os impactos [da crise]. (…) Não foi por força de qualquer mágica que superamos a crise.”
Expertise no BB
O ex-presidente relatou ainda um momento durante a crise que arrancou risos da plateia. “Quando vi que as montadoras estavam entrando em crise, chamei o Banco do Brasil e disse: ‘Preciso que o banco financie carro’. Me disseram: ‘Mas o BB não tem expertise’. Falei: ‘Mas quanto tempo precisa para que a gente forme essa tal expertise?’. E me responderam que em uns dois anos. Eu falei: ‘Então vamos comprar essa tal expertise. E compramos o Votorantim.”
‘Complexo de inferioridade’
Quase ao término de sua fala, Lula disse também que, antes de seu governo, havia no país um “complexo de inferioridade”. “O Brasil sempre teve problema de autoestima. Havia quem dissesse que tinha complexo de inferioridade. Nelson Rodrigues dizia que tinha complexo de vira-lata.”
Ele afirmou que atuou contra esse complexo, relembrando um encontro entre líderes internacionais. “Tinha um tanto de gente importante: Bush, Tony Blair. Eu estou lá e estava todo mundo sentado. Cheguei e fui sentar. Quando o Bush chegou, todo mundo começou a levantar. Eu segurei na mão do [Celso] Amorim [então ministro das Relações Exteriores] e disse: ‘Nós não vamos levantar’. E ele veio justamente falar com a gente. Sem precisar de nenhuma lambeção de bota porque ninguém gosta de puxa-saco.”
“Como diz Chico Buarque, a gente não fala grosso com a Bolívia, mas também não fala com os Estados Unidos como os outros faziam. A gente fala manso e respeitosamente com todos”, completou o ex-presidente.
Dados sobre o governo
O ex-presidente começou sua fala apresentando dados sobre a economia e disse que é preciso aumentar ainda mais o poder de compra da população. “Não basta ter um terço da população tendo acesso às coisas”.
Ele então citou o aumento do investimento estrangeiro no país, a redução da taxa de desemprego, dados do Luz para Todos e do Bolsa Família. “Em oito anos, demos um salto no enfrentamento da pobreza e da miséria. Agora tem mais gente trabalhando e consumindo, fazendo a roda da economia girar”, disse.
O ex-presidente disse que seu governo se empenhou a aumentar o crédito e citou dados dos bancos públicos, como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Eu brinco sempre que o Brasil era um país de economia capitalista que não tinha capital de giro nem financiamento. Pobre não conseguia entrar no banco, não tinha bancarização para o pobre.”
Ele não esqueceu de citar a sucessora, a presidente Dilma Rousseff: “Esse é o país que nós queremos continuar construindo. E tenho certeza, pelo que conheço da companheira Dilma, esse país vai permitir que a classe C logo vá para a classe B.”