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Blog do Vavá da Luz

CLUBE DE HISTÓRIA EM : Onde estão as estrelas?

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Onde estão as estrelas?
São sempre as mesmas noites, a mesma planície escura sobre nós. Intensa, negra e
infinita. Mesmo quando nos prometem, como noticiaram, uma «chuva de estrelas, quando
os meteoros em combustão invadirem a atmosfera terrestre…», o céu permanece
impávido, como se recusasse a participar no espírito do tempo, a festa da abundância.
Em vão aguardamos sinais extraordinários no céu. Adormecemos cansados de
esperar. Sonhamos com as estrelas em movimento de um quadro de Van Gogh, mas o céu,
esse pedaço de eternidade, mantém-se imperturbável, como se escondesse, no fundo das
gavetas do universo, o enxame de estrelas cadentes.
Soube, já ao amanhecer, que as cidades matam as estrelas, que elas foram
dispensadas de aparecer nas noites luminosas dos centros urbanos e que se tornaram objeto
de estudo para cientistas, como se fossem coisas do passado. Talvez por isso elas estejam
ressentidas e só exibam o seu brilho, de tempos a tempos, a certas pessoas, as que ainda
persistem em espreitá-las no horizonte arroxeado do entardecer.
Revejo, neste tempo inaugural, o que fomos como povo que atravessou oceanos
orientado pelo mapa celeste, como fomos peregrinos que cruzaram continentes até abraçar
santuários guiados pelo reflexo ténue vindo do céu, e como outrora adormecemos em paz,
embalados pela contagem irregular dos astros cintilantes.
As estrelas fazem-nos falta.
Perdemo-nos encandeados pelo brilho excessivo das cidades.
Estamos bloqueados pelas luzes intermitentes e enfeites provisórios.
Enquanto dura este Advento, procuro habituar-me ao escuro para que possa
contemplar, com nitidez, a luz de infinita claridade que surge no Oriente.

Nélio Pita, 2018