Braços biônicos com nervos naturais e membros robóticos acionados pelo pensamento são os avanços mostrados em congresso científico
Comando: os nervos e músculos que restaram no braço amputado comandam a prótese robótica
O uso da tecnologia para ajudar pacientes com lesões na medula espinhal ou membros amputados está chegando a níveis inéditos, segundo uma série de seminários durante a reunião anual da AAAS (na sigla em inglês, Sociedade Americana para o Avanço da Ciência), em Washington. Apenas nos Estados Unidos, em 2008, 1,7 milhões de pessoas tinham algum tipo de amputação, e esse número pode dobrar até 2050. Lesões na medula respondiam por 311.000 casos no país, em 2009.
Nesta quinta-feira (17) foram apresentados à imprensa quatro iniciativas dos Estados Unidos e Europa, que mostram que está cada vez mais perto o dia em que o homem poderá mover uma máquina apenas com o pensamento.
Melhor comando de braços robóticos
Todd Kuiken, diretor do Centro de Reabilitação de Chicago, apresentou uma nova técnica chamada Reenervação de Músculos Focalizada (Targeted Muscle Reinnervation, cohecida como TMR). “Os nervos e músculos que sobraram comandam a prótese robótica, o que consegue ser eficiente em movimentos grandes e simples como dobrar do cotovelo, mas não para movimentar mãos, dedos e pulsos com precisão,” explicou o médico.
A técnica TMR consiste em reimplantar nervos do próprio paciente no músculo do membro restante, o que amplifica os impulsos nervosos e permite movimentos mais precisos e comandos mais intuitivos — ele precisa apenas pensar no que movimento que quer fazer e a prótese, ligada a um sistema de computadores, responde. Glen Lehman, um sargento que perdeu o antebraço na Guerra do Iraque, demonstrou o uso da nova técnica. “Eu só preciso pensar no movimento que a protése se mexe de acordo,” descreveu aos presentes.
Já Andrew Schwarz, da Universidade de Pittsburgh, usou eletrodos implantados no cérebros de macacos cobaias para estabelecer com precisão quais neurônios estavam envolvidos no comando de um braço robótico, bem como interpretar os comandos neurológicos enviadas para cada movimento diferente.
Os testes com humanos vão começar em junho. Os pesquisadores pretendem colocar braços robóticos na cadeira de rodas de pacientes com lesão medular, que vão deverão movimentá-lo apenas com o pensamento.
Na Europa, experiências fora do corpo e robôs multitarefa
Na sequência, o professor José Millán, da Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça, apresentou seu Robotino, um pequeno robô comandado pelo cérebro que consegue “aprender” com seu usuário. “Em interfaces cérebro-máquinas que temos hoje, a pessoa precisa repetir o comando mental seguidamente, como por exemplo, mandar uma cadeira de rodas seguir em frente,” explicou Millán. “Ninguém aguenta fazer isso por mais de uma hora”. O ideal seria que a máquina conseguisse entender a “vontade” do usuário, em vez de um comando mental repetido indefinidamente.
Com o Robotino, a equipe de Millán está perto de conseguir isso. O sistema consegue compreender a intenção do usuário, o que permite que este consiga descansar a mente e desempenhar tarefas secundárias como ler em silêncio ou em voz alta enquanto usam o robô. O sistema também processa imagens, de modo a conseguir evitar obstáculos no caso de uma distração do usuário, que “envia” os comandos via uma touca que lê os sinais elétricos do cérebro como um eletroencefalograma.
Olaf Blanke conduz experimentos para entender como o cérebro entende estar consciente
Também da Politécnica de Lausanne, o neurologista Olaf Blanke trouxe uma pesquisa que a princípio, parece mais metafísica que neurológica: como o cérebro entende estar consciente. Sabendo que boa parte das experiências de se sentir fora do corpo acontecem por estímulo ou lesão em partes específicas do cérebro, a região frontal e temporo-parietal, Blanke usou realidade virtual com voluntários com lesões nessas áreas. “A ideia era entender o que acontecia com alguém quando mudamos a posição do seu ‘eu'”, explicou o médico suíço.
Nos experimentos, os voluntários se inseriam num corpo de um avatar, usando tecnologias de Realidade Virtual, e eram submetidos as experiências que visavam dividir seus sentidos. Por exemplo, eram tocados em uma parte do corpo, enquanto viam seus avatares serem tocados em outra, e as sensações e percepções foram registradas pela equipe de Blanke.
As aplicações desse estudo estão no melhor entendimento da consciência corporal e a sensação de pertencimento de membros robóticos ao corpo dos pacientes, bem como o problema dos “membros fantasmas”. “O paciente sentir que a prótese faz parte do corpo dele é meio caminho andado,” disse Kuiken. Nesse ponto, os macacos podem estar na nossa frente — segundo Schwarz, seus Rhesus se acostumam tanto ao braço robótico que tentam penteá-lo como se fosse um de seus peludos bracinhos normais.
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