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RAMALHO AINDA NÃO DISSE TUDO, por Rubens Nóbrega

RAMALHO AINDA NÃO DISSE TUDO, por Rubens Nóbrega

 

Confesso que não é fácil para mim vir aqui e falar em público, diante de assistência tão qualificada. Digo assim porque sou portador de crônica timidez que me acompanha por toda a vida. E é algo que só piora quando faltam ao orador uma estampa razoável e voz de boa dicção que ajudem a esconder naturais defeitos de oratória ou carência de conteúdo.

Mas não poderia dizer não, jamais diria não, a uma convocação de Ramalho Leite. E o faço tentando vencer todas as minhas inibições, mas contando com a indulgência de todos vocês que vindo aqui confirmam todas as minhas expectativas de quão bonita e acolhedora é Dona Inês, terra que visitei algumas vezes, ainda muito criança, quando vinha passar dias ou férias na fazenda Carnaúba, então propriedade de Seu Joca Barbosa e Dona Severina, meus avós maternos.

Bom, eis-me aqui escalando e forçando uma fluência e uma descontração que só desaparecem por completo quando me vejo só, diante de uma tela, de um teclado e cercado por quatro paredes. É exatamente nesse ambiente, entre quatro paredes, onde faço a segunda coisa que mais gosto, que é escrever. A primeira, lógico, é dormir.

Bem, neste ‘Era o que tinha a dizer’ o autor revela e expõe suas mais escolhidas memórias. Digo escolhidas porque, obviamente, nem todas as vivências e experiências de Ramalho poderiam ser acolhidas em apenas um volume. Teria que escrever uma trilogia, no mínimo, para comportar tudo o que esse multifacetado e criativo ser humano tem para contar.

Inclusive porque esse livro traz, em retrospectiva, a história da Paraíba e de sua gente nos últimos 70 anos. A obra reúne em suas páginas tanto as histórias dos ilustres como as histórias dos mais comuns dos mortais. Seu protagonista e coadjuvantes estão expostos em suas vidas públicas e privadas, em suas vertentes e variantes políticas, sociais e econômicas.

Ramalho experimentou todas as variações, humores e eventos do seu tempo. De um tempo que também é nosso, no papel de testemunhas ou figurantes, mas contemporâneos dele e daqueles que remanescem sobre a terra e debaixo do céu há tanto tempo quanto ele.

Daí por que, sem prejuízo de que venha a escrever os volumes dois, três ou mais da presumida série, este ‘Era o que tinha a dizer’ pode até não esgotar, mas já diz muito do homem e cidadão que atende pelo nome de Severino Ramalho Leite. Uma pessoa que botei na conta de amigo-irmão mais velho, a quem aprendi a admirar por sua inteligência, sua conhecida verve e reconhecida integridade moral.

No quesito da integridade, aliás, que soma seriedade à capacidade de trabalho em tudo a que se destina e se empenha, não há como não destacar a eficiência proativa com que Ramalho exerceu funções de Promotor de Justiça ou de Procurador do Estado. Não há como esquecer que também se destacou a serviço do público através de missões que cumpriu. Tanto com o talento de jornalista quanto com a habilidade de político que conquistou mandatos de deputado estadual e federal e postos de alta direção no Banco do Nordeste e no primeiro escalão do Governo da Paraíba.

Mas a versão escritor-barra-historiador é, sem dúvida, a melhor desse filho de Dona Eurídice e de Seu Arlindo. Prova maior é esse livro que me causa certa e boa inveja, particularmente por ter sido editado e revisado pelos queridos amigos em comum que são os inesquecíveis Juca Pontes e Martinho Moreira Franco.

Temos aqui, realmente, o melhor de Ramalho Leite. Quem ler ‘Era o que tinha a dizer’ vai se deparar com um texto primoroso de um memorialista cuidadoso, dono não apenas de uma memória prodigiosa, mas, sobretudo, de obra extremamente enriquecida por uma pesquisa criteriosa que dá brilho e consistência ao seu relato e nos fornece incríveis detalhes de uma história de vida admirável.

Tudo isso narrado com arte da melhor escrita, capaz de envolver o leitor em todas as emoções, alegrias e tristezas contadas por Ramalho, por ele vividas com todos aqueles que compõem seu entorno afetivo mais próximo e mais amado. E nesse universo, não tenham dúvidas, é onde impera a sua inseparável e insuperável Marta, que é, sem dúvida, a sua maior expressão e melhor referência. Dela própria e de Ramalho Leite.

  • Texto de apresentação do livro ‘Era o que tinha a dizer’, de Ramalho Leite, lançado na noite do sábado 19 de agosto do ano da graça de 2023, no Café Literário do Espaço da Memória da cidade de Dona Inês, Curimataú Paraibano, evento promovido pela Secretaria Municipal de Cultura