Palestinos classificam mudança da embaixada brasileira em Israel como provocação
Mudança da sede da embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém proposta por Bolsonaro foi chamada de medida “hostil” e “provocadora” ao povo palestino por autoridades da região. Entenda
Elas dificilmente concordam, mas nesta sexta-feira (2), diversas autoridades palestina se uniram para criticar o anúncio do presidente eleito Jair Bolsonaro de mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. A proposta de Bolsonaro já tinha sido criticada antes, mas confirmada recentemente após a confirmação de sua vitória na disputa presidencial foi alvo de pronunciamentos oficiais de diversos líderes palestinos.
A primeira autoridade palestina a se manifestar foi Hanan Ashrawi. Líder do Comitê Executivo da Organização para a Liberação da Palestina (OLP), ela classificou a proposta de mudança da embaixada brasileira em Israel como uma “medida provocadora, que é ilegal diante do direito internacional e que não faz nada mais que desestabilziar a região” que é alvo de conflitos entre palestinso e israelenses há décadas.
A líder palestina que foi porta-voz de sua delegação nas negociaçòes de paz com Israel e é uma das principais vozes em Ramallah, no território Palestino, além da primeira mulher a ser eleita para o Conselho Nacional Palestino classificou como “muito infeliz [o fato de] que o Brasil tenha se unido a essa aliança negativa contra a lei internacional”.
Para além de Ashrawi, no entanto, a proposta de Bolsonaro também foi criticada pelo movimento islamita Hamas acusado de radicalismo que domina a faixa de Gaza e já travou três guerras contra o poderoso estado de Israel nos últimos dez anos também afirmou através de seu porta-voz, Sami Abu Zahri, em uma rede social que “consideramos que se trata de uma medida ostial em direção ao povo palestino e ao mundo árabe e muçulmano”.
O grupo Hamas também disse “rejeitamos a decisão do presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, de mover a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém e pedimos que ele abandone sua decisão”.
A polêmica se criou depois que Bolsonaro prometeu em campanha e confirmou na última quinta-feira (1º) em entrevista publicada pelo jornal israelense Israel Hayom que pretendia fazer a mudança da sede da embaixada brasileira em Israel. O presidente eleito afirmou que o o país deveria ter liberdade para escolher sua capital e ignorou o fato de que Jerusalém, declarada capital do estado de Israel, é alvo de disputa entre judeus, árabes e muçulmanos.
Na ocasião, Bolsonaro declarou “quando me perguntaram, durante a campanha se eu faria isso uma vez que me tornasse presidente, eu respondia que ‘sim, cabe a vocês decidirem qual é a capital de Israel, não a outras nações”.
A declaração que gerou repercussões negativas do lado palestino, por outro lado, foi comemorada horas depois pelo primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, que agradeceu Bolsonaro e parabenizou o “meu amigo presidente eleito, Jair Bolsonaro, pela sua intenção de transferir a embaixada brasileira para Jerusalém, um passo histórico, correto e emocionante!”.
O líder israelense pretende ir à posse de Bolsonaro em janeiro e, segundo o texto do mesmo jornal, o presidente eleito brasileiro também afirmou que pretende visitar Israel em breve.
Entenda o caso e a polêmica transferência da embaixada brasileira em Israel
A se confirmar as palavras de Bolsonaro, o Brasil seria apenas o terceiro país do mundo a transferir sua embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, depois de Estados Unidos e Guatemala. Isso porque a postura da comunidade internacional é de não interferir na disputa entre israelenses e palestinos.
Para especialistas, assim como muitas medidas na área da diplomacia, a mudança na sede da embaixada brasileira não teria nenhuma função prática, mas teria simbolicamente.
Além de gerar algum gasto no processo de transição da sede, poderia provocar uma indisposição com parte do mundo árabe que apoia a Palestina e que é um importante parceiro internacional do Brasil, consumindo alimentos e mercadorias nacionais.
Juntos, os países árabes são o segundo maior comprador de proteína animal brasileira. Em 2017, as exportações somaram US$ 13,5 bilhões e o superávit para o Brasil foi de US$ 7,17 bilhões. Diante disso, segundo Rubens Hannun, presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, uma possível retaliação dos países árabes poderia abrir espaço para fornecedores concorrente do Brasil no setor de proteína animal, como Turquia, Austrália e Argentina.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, Hannun afirmou que “já tivemos ruídos com a [Operação] Carne Fraca e com a paralisação dos caminhoneiros, mas conseguimos superar. Temos a fidelidade dos países árabes”, afirma o representante que alerta, porém, que a mudança da sede da embaixada é algo muito mais forte e sensível aos países árabes.
Além disso, o presidente da Câmara do Comércio Árabe Brasileira também ressalta a possível perda de investimentos árabes na região. Ele explica que “cerca de 40% dos fundos soberanos estão nesses países e eles já demonstraram interesse em investir em infraestrutura no País, como estradas, ferrovias e elétrica. São planos futuros que podem ser cortados”, afirmou expondo que as sanções impostas por esse bloco de países podem não surtir efeito em economias mais robustas que tomaram o mesmo caminho, no caso dos Estados Unidos, mas pode afetar fortemente o Brasil.
A polêmica se cria porque Israel, um Estado judeu, considera toda a cidade de Jerusalém como sua capital, enquanto os palestinos reivindicam uma parte do território, a Jerusalém Oriental, para si a fim de torná-la capital de seu futuro e prometido país.
Israel, no entanto, ocupa Jerusalém Oriental desde a guerra de 1967 quando anexou o território que nunca mais foi reconquistado pela Palestina. O ato, no entanto, nunca foi reconhecido pela comunidade internacional.
A decisão de Bolsonaro de fazer a mudança da embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, além das mudanças já confirmadas dos Estados Unidos e da Guatemala, significa, portanto, reconhecer a cidade como capital do Estado judeu. A medida, no entanto, vai na contramão do consenso do resto do mundo que compreende que o status de Cidade Sagrada para os povos deve ser negociado por ambas as partes e as embaixadas não devem se estabelecer em Jerusalém até que haja um acordo.