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Blog do Vavá da Luz

 O dia em que derrubaram o pau mole… – Por Agnaldo Almeida

 O dia em que derrubaram o pau mole… – Por Agnaldo Almeida

1612732811186332 - NÃO ERA APENAS UM BAR: O dia em que derrubaram o pau mole... - Por Agnaldo Almeida

Perdoem-me os eventuais leitores da coluna, mas hoje não há como falar de política. Derrubaram o Pau Mole. Em meio aos escombros, no final da tarde ontem, quando tudo ali já era passado, bebi o último gole de cerveja. Um pouco quente – já tinham levado o freezer – talvez empoeirado, mas eu tinha comigo que aquela teria de ser uma cerveja inevitável. Tomei-a, como diria Jânio, porque qui-lo, mas tomei-a também porque era absolutamente necessário.

O Pau Mole é uma instituição. De caridade, podemos dizer assim, se considerarmos a faixa etária dos seus freqüentadores. Para todos, sempre ficou evidente que aquilo não era apenas um bar. Não era uma barraquinha de praia como tantas outras que existem na orla pessoense. O Pau Mole era um senado. Um senadinho no melhor estilo. Como centenas de outros que existem nas capitais brasileiras.

Mas, enfim, derrubaram-no. A bem da urbanidade, da paisagem asséptica e da indústria turística puseram abaixo um dos espaços mais democráticos de João Pessoa. Mesmo caindo aos pedaços, sem luxo, requinte ou coisa que o valha, o Pau Mole conseguia juntar numa mesma mesa todo o espectro político da Paraíba.

Os maranhistas dividiam suas doses com os cassistas; os comunistas – se ainda os há – não se constrangiam em conversar com eventuais empresários capitalistas, sempre em busca de lucro. Os gays, e não raro eles apareciam, eram tratados com respeito. Com distância, mas com respeito. As prostitutas, os mendigos, os alcoólatras de sarjeta – todos tinham seu espaço naquela pequena e estranhamente agradável barraca.

Jornalistas, escritores, advogados, empresários e juizes aposentados, ex-políticos, velhos fiscais de consumo e funcionários fugindo do expediente sempre podiam ser encontrados por ali. Numa conversa onde tinha vez quem falava mais alto, surgiam piadas, histórias do arco da velha, as novas da política e as maledicências sobre o high-society. Ah, essas maledicências eram o perfeito tira-gosto daqueles encontros.

Ao ver o amontoado de telhas, tijolos e madeiras, na tarde de ontem, me ocorreu que instituições como o Pau Mole são como idéias: ninguém as derruba completamente. No tempo do regime militar, por exemplo, centenas de esquerdistas foram mortos, outros em igual número foram presos e outros ainda continuam desaparecidos. Por mais que tenham feito para eliminar os “agentes da subversão”, os militares nunca conseguiram acabar com a idéia subversiva.

Acho que no caso dos boêmios se dá a mesma coisa. E de maneira muito mais saudável e pacífica. Ninguém precisa morrer ou ser preso. Ninguém ficará para sempre no rol dos desaparecidos. Derrubem-se quantos bares quiserem. Destruam paredes, tetos e quebrem garrafas – mas acabar com boêmios jamais conseguirão. O mundo não seria o mesmo sem eles. Muito menos seria melhor.

Sentencia Millor, com a sua embriagada sabedoria, que a história do mundo registra muitas guerras, mas nenhuma entre dois exércitos de bêbados. E como dizia Martinho Moreira Franco, essa coluna não quer fazer apologia de bebidas alcoólicas, mas se atreve apenas a dizer que a boemia é um dos traços da natureza do homem, assim como acompanhar a moda é da natureza das mulheres. O que não significa que mulheres não possam ser boêmias nem homens sejam impedidos de adotar suas roupas de griffe.

O Pau Mole, por onde já andaram tantos que se foram, não é o primeiro nem será o último refúgio boêmio a ser capturado pela onda do progresso. A Bambu, na Lagoa, era uma catedral. Derrubaram-na na administração Dorgival Terceiro Neto. E o mundo não se acabou por conta disso. O Luzeirinho, o Pietros, o Drive-in, o Gambrinus e tantos outros foram sendo tragados pela fúria do desenvolvimento. Resultado: nem o desenvolvimento chegou nem os boêmios sumiram.

É da índole dos boêmios não reclamar muito. Vão-se os bares, vão-se até mesmo os amigos – e no Pau Mole se foram tantos – mas ficam os copos. Fica a amizade sempre relembrada, a saudade permanente, a nota íntima de um tempo que só acabará quando ele não mais existir.

No coração da boemia não cabe ressentimentos. No máximo, uma tristezazinha porque quando derrubam uma instituição como o Pau Mole, a turma sempre se pergunta: qual vai ser a próxima? Tim-tim.👏👏👏🍻🍻🍻

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