Ao votar contra proibição de doações de empresas a políticos, ministro diz que houve tentativa de uso político do Supremo
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, fez duras críticas ao PT em meio à sua apreciação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 4650, de autoria do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que trata do financiamento privado por empresas para campanhas eleitorais. Ele deu o segundo voto contrário à ADIn da OAB. Parte de seu argumento foi o suposto uso político do STF numa questão política na ação da OAB, o que a entidade rejeita.
Com voto pendente desde abril do ano passado após pedir vistas do processo, Mendes afirmou, nesta quarta-feira (16), ao longo das mais de quatro horas e meia de duração da leitura de seu voto que o objetivo do esquema petista seria asfixiar a oposição. Para ele, “se formos rigorosos, daqui a pouco o mensalão terá de ser julgado em juizado de pequenas causas”.
Com o voto de Mendes, o placar passa a ser de seis em favor da ação da OAB (Luiz Fux – relator do caso –, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski) e dois contra (Teori Zavascki e Gilmar Mendes). Ministros podem rever votos, mas essa possibilidade não é tão comum. Por isso, a votação continua aberta e deverá ser concluída nesta quinta-feira.
“O ministro Celso de Mello, do alto de seus 44 anos de serviços relevantes prestados ao País, qualificou o esquema como a grande vergonha da nossa história política, na ação penal 470. Hoje vemos o quão modesto foi o mensalão: orçado em R$ 170 milhões, não corresponde sequer a esse valor, essa nova moeda chamada de Barusco (referência ao ex-gerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco), que não era para finalidade partidária, era para apropriação”, discursou o ministro.
O argumento central de Mendes foi defender a tese de que o PT, no poder, teria criado um esquema de auto financiamento por meio de desvios em estatais que permitisse ao partido não depender de doações eleitorais. “Doações privadas são elemento de reequilíbrio do processo eleitoral. O partido (PT) já se locupletou ao limite e aí quer proibir a doação para outros partidos, desequiparando por completo o processo eleitoral. E vamos chancelar isso?”, questionou ele durante a leitura de seu voto.
Por mais de uma vez, Mendes disse que seu pedido de vistas foi benéfico para a apreciação da ADIn porque deu a chance para que o esquema de corrupção da Lava Jato fosse revelado. Ele ironizou as críticas de que foi alvo por ter demorado mais de um ano para liberar o pedido de vistas para retomar a votação da ação.
Assista à entrevista do ministro abaixo:
“O Brasil é um país surpreendente. Entre a concepção desta ação e o início do julgamento houve muitas mudanças, inclusive no cenário político. Entre o início do julgamento e a data de hoje, mudanças radicais. Eu me regozijo pelo fato de ter pedido vistas, porque hoje sabemos muito mais do que ontem”, declarou ele.
“Basta ver as revelações que vêm pela mídia dessa Operação Lava Jato, que dá a dimensão da corrupção do aparato estatal brasileiro. Isso tem parte a ver só com o financiamento do sistema político eleitoral. Na verdade, tudo está a indicar um modo de governança em relação a só uma empresa, a Petrobras. As revelações são chocantes quando se diz que 3% deveria ser vertido para o partido político permanentemente de cada contrato da Petrobras. Isso nada tem a ver com campanha eleitoral, tem a ver com o sistema político, em geral, com o modo de administrar.”
“Se pudéssemos dizer, e não tivesse havido o episódio da Lava Jato, que o financiamento agora só poderia ser público, ou só de pessoas físicas, estaríamos decretando a falência de qualquer sistema de oposição. Por quê? Porque o partido da situação não precisa de dinheiro.”
Para Mendes, o esquema de desvio da Lava Jato proporcionaria ao PT uma posição financeira que o tornaria auto suficiente nas disputas eleitorais – daí derivaria a defesa que o PT faz historicamente do financiamento 100% público de campanhas.
Clima tenso
Mendes abandonou a sessão antes do seu término depois que o secretário-geral da OAB, Claudio Pereira de Souza Neto, pediu a palavra. Mendes argumentou que a fala do representante da OAB não faria sentido por não se tratar de uma questão de fato. Ricardo Lewandowski, presidente do STF insistiu para que Souza Neto falasse.