A comitiva de industriais brasileiros que viajou aos Estados Unidos, nela incluída o presidente da Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (FIEPB), Cassiano Pereira, e que foi coordenada por Ricardo Alban, presidente da poderosa Confederação Nacional da Indústria (CNI), está frustrada com a viagem, que em relação ao “tarifaço” de Donald Trump, obteve resultado zero.
– “Eles querem que sejamos ousados e propositivos. É um governo que pensa fora da caixinha, então nós também temos que pensar”, afirmou Alban revelando pragmatismo com descontentamento.
Outro membro da delegação chateado com os negativos resultados, uma vez que autoridades norte americanas não deram bola para a presença dos industriais em solo de Tio Sam, foi o Embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Roberto Azevedo.
Para ele, “ficou claro que a dimensão política é muito importante, uma espécie de chave para que possamos desenvolver soluções concretas [para o tarifaço]”, afirmou. Além de Embaixador, Roberto Azevêdo é consultor da CNI e ex-diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. Ele revela que em todos os encontros a carta de Trump a Lula foi citada – e a redução global das taxas não parece provável em um horizonte próximo.
Azevêdo reconheceu que “entraves políticos” e a própria lista de prioridade e capacidade burocrática do Executivo dos EUA impede que um diálogo como esse se aprofunde agora.
– “Eu fiz a pergunta a eles: ‘Quais são as áreas de interesse de vocês?’ E essa resposta não foi muito clara”, afirmou o ex-diretor da OMC, que seguiu: “Eles estão assolados de coisas pra fazer, estão negociando acordo comercial com o mundo inteiro, estão usando o tempo deles pra estudar outros países com negociação mais avançada, não pararam para se debruçar sobre o que poderia ser feito com o Brasil”.
Outro fato lamentável, citado por reportagem do UOL, informa que de um “certo desconforto” a um “super constrangimento”, ao menos seis empresários ou representantes setoriais brasileiros relataram incômodo e surpresa com a presença do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do comentarista político Paulo Figueiredo no hotel em que parte da delegação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) que veio a Washington tentar negociar tarifas se hospedou.
Na manhã de ontem, Eduardo e Figueiredo conversaram com um empresário supostamente do setor da pesca no café do hotel. No entanto, a Abipesca, que compõe a comitiva de cerca de 130 pessoas, negou à reportagem que algum de seus representantes tenha convidado Eduardo para uma conversa ou se encontrado com ele. Nos grupos de WhatsApp, os empresários especulavam quem seriam os “anfitriões” de Eduardo – mistério que permanecia até o início da noite na capital americana.
– “Não foi a CNI que nos chamou. Foram cinco empresários, encontramos com alguns ontem e fizemos um café da manhã menor hoje. Mas não faz sentido dizer quem são, não vamos expor”, afirmou Figueiredo ao UOL. Segundo ele, Eduardo teria sido convidado por interlocutores a falar para um público de vários empresários, mas condicionou a conversa a conhecer previamente a lista de quem estaria presente, o que não foi entregue ao deputado. No fim, a conversa ficou restrita a um pequeno grupo de empreendedores que ele já conhecia previamente.
Eduardo e Figueiredo fazem há meses uma campanha junto à administração de Donald Trump por sanções ao Brasil que, segundo eles, possam levar à aprovação de uma anistia a Jair Bolsonaro e seus aliados. Na carta em que determinou o tarifaço de 50% sobre o Brasil, Trump ecoa os argumentos da dupla ao chamar de uma “caça às bruxas” o processo judicial por golpe de Estado contra Bolsonaro.
– “É algo que não tem nem sentido, né?! Não foi ele [Eduardo] quem criou o problema? Agora vai aparecer aqui para vender solução?”, questionou à reportagem do UOL um dos representantes de industriais do Sudeste. Outro qualificou a situação como “estranhíssima”. Todos falaram reservadamente por temor de retaliação política. Nenhum integrante da comitiva ouvido defendeu a presença de Eduardo entre o grupo.
Segundo Ricardo Alban, a delegação empresarial foi cuidadosamente planejada para excluir o fator político do discurso. Por isso, não foram admitidos parlamentares ou mesmo quadros técnicos do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), que expressaram desejo de participar da comitiva. O próprio Alban foi pego de surpresa pela presença de Eduardo. O deputado admite abertamente que está em Washington em busca de novas sanções ao Brasil, enquanto seu pai, Jair Bolsonaro, é julgado por tentativa de golpe de Estado no Supremo Tribunal Federal.
– “Por que é que nós vamos perder a razão, para quê vamos misturar alhos com bugalhos? A visita dos senadores [brasileiros, há algumas semanas] era política, queríamos fazer uma visita empresarial”, disse Alban, sobre a tentativa de blindagem política do grupo. “Eu sei que a CNI não convidou [Eduardo], mas não sei se alguém convidou porque tem relação pessoal”, completou.
CNI ACENA A TRUMP COM MINERAIS E ETANOL
A questão política, porém, foi colocada como “prioritária” para o governo dos EUA em todas as reuniões com autoridades que a comitiva da CNI teve. O grupo foi recebido no Departamento de Estado, no Departamento de Comércio e no Representante Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês).
Na missiva à Lula, o líder da Casa Branca lista o processo contra Bolsonaro e as decisões do STF sobre big techs como motivos para a imposição das tarifas. Desde o início da crise, uma efetiva mesa de negociação entre representantes dos dois governos não foi estabelecida. Os americanos condicionam o diálogo à negociação sobre esses dois pontos. O governo Lula afirma que não aceita negociar com a independência do Judiciário e a soberania nacional.
– “Há uma certa frustração dos empresários com o fato de que os canais oficiais não estão funcionando a contento”, reconheceu Azevêdo, sobre o atual estado diplomático das relações bilaterais.
Para tentar atrair os norte-americanos para a mesa de negociação, a CNI apresentou a eles a possibilidade de explorações comerciais em parceria em três diferentes áreas: a mineração de terras-raras, o mercado de etanol e a construção de data centers. A estratégia, segundo Alban, teria sido adotada com a anuência do MDIC. O vice-presidente Geraldo Alckmin, que comanda a pasta, lidera no governo brasileiro as tentativas de negociação.
As terras-raras estão na lista de minerais críticos para os EUA, que atualmente têm uma forte dependência da China para abastecer seu mercado interno. O Brasil possui reservas significativas dos materiais e haveria oportunidades para iniciar mineração. Quanto ao etanol, o Brasil se mostrou disposto não apenas a abrir seu mercado, como a trabalhar conjuntamente no desenvolvimento do Combustível Sustentável de Aviação (SAF), à base de etanol.
Por fim, a delegação acenou aos americanos com um grande potencial de produção de energia elétrica de fontes renováveis para a instalação de data centers para treinamento de Inteligência Artificial no Brasil – a questão está na ordem do dia para a administração Trump: entre maio de 2024 e o mesmo mês de 2025, o preço da energia subiu quase 7% no país, puxada pela demanda desses centros de supercomputadores.
CAFÉ DE CASSIANO COM IMPRENSA
Integrante da comitiva da CNI, o presidente Cassiano Pereira, da FIEPB, que retorna ao Brasil neste domingo, organizou um encontro com a imprensa paraibana para terça feira, dia 09, na sede da Federação em Campina Grande, segundo ele para fazer uma “prestação de contas” e mostrar os resultados do encontro patrocinado pela CNI.
Fonte: Da Redação (Com UOL)