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Blog do Vavá da Luz

A MEMORIA DE PAPEL DE TIÃO LUCENA, POR 1BERTO DE ALMEIDA

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A memória não lê as cartas alheias. A máxima que ainda hoje máxima continua. Mais um aforismo de Vilhelm Ekelund. Sueco bom nessas coisas que não conheceu o Tião Medonho e acredito que ele, o Tião, também não o conheceu. Mas, mesmo assim, não o conhecendo, há muito que ele, o Tião, disso sabia de cor e sem salto alto.

Tião Lucena, como também é conhecido por outros, esses também muitos, assim como Sebastião Lucena, em papos arretados contando causos que sempre mereceram entrar num livro pela porta da frente, ou melhor, primeira página, é também um escritor e jornalista preocupado com a sua história e com o seu tempo.

Um exemplo? Terei muitos. Mas, entre esses, direto como um chute do infalível Bruce Lee em seus melhores dias, fico com o seu ótimo livro Guerra de Princesa, esse em que ele conta essa história como se dela tivesse sido o responsável pelo seu – dela, da “guerra” – começo e a sua pacificação.

Mas, como dizia, Tião Lucena tem uma memória privilegiada. Nesse seu Memória de Papel, Tião conta/escreve sem meias palavras ou palavras e meias, mas na medida certa, a historia de sua passagem, umas longas e outras nem tanto, por esse mundo feito de papel impresso e exposto à curiosidade e prazer de um público sedento de novidades.

Em Memória de papel, Tião Lucena traz à tona sua historia e a de muitos companheiros jornalistas que com ele dividiram essa história agora passada a limpo pela sua memória privilegiada. Memória de Papel vem escrito, marca de quem sabe contar histórias, com a leveza das melhores crônicas. Tião sabe que o salário é o salário.

Sem perder a irreverência e o bom humor, fortes característica do escritor, ácido e ferino também quando é preciso, Tião Lucena, mais uma vez, prova que é capaz de jogar em todas as posições, sem apelar para a falta por trás ou meter na bola mão na bola dentro da área pequena.

A sua memória é um privilégio dos que viveram a verdade e, através dela, conta tudo o que viu. Pois o mentiroso, se muitos não sabem deveriam saber, tem memória curta. Afinal, como dissera outro, esse mais conhecido e com razão, Abraham Lincoln, nenhum mentiroso tem uma memória suficientemente boa para ser um mentiroso de êxito.

Tião Lucena, contando as histórias que viveu e ajudou a escrever em nossos melhores matutinos, jornais O Norte, Correio da Paraíba, Momento e outros, passando muito bem por todos os setores desses como repórter, chefe de reportagem, editor e secretário de redação, conta as suas lembranças e sabe que todas são verdadeiras.

No entanto, com o passar dos anos, assim como acontece com todos aqueles que vivem em constante estado de evolução/revolução, um dia Tião Lucena se cansou desses veículos usados por ele como meio para suas mensagens e histórias. Saco cheio, sem que os censores de plantão permitissem que escrevendo ele o esvaziasse, resolveu descer do trem ainda andando sem medo de perder a linha. E assim criou o seu sítio. O Sitio do Tião.

Desde então, passou a ser o Tião que nunca deixou de ser. Um sujeito que vive e escreve sem medo e sem censura, consciente de que não sendo assim, aquele que escreve não é o Tião sem medo, o Tião Medonho, o filho de seu Miguel Fotógrafo e dona Nila.

Essas memórias de Tião, muitas espalhadas no seu – dele – Sítio e acompanhada por este “malabarista de palavras, agora em livro fornido e batizado de Memória de Papel, foram escritas como se ele estivesse num sítio de sua Princesa Isabel, balançando-se na rede, sem precisar do impulso do pé na parede ou troco de arvore mais próxima. Tião escreve suas memórias como se contasse mais um causo, sem mudar o sotaque característico e a melodia das palavras na pronúncia do sertanejo típico, nascido e criado naquelas brenhas onde o sol parece nunca dormir.

O estilo de Tião tem como marca a clareza. Não complica. Não apela para os afrescalhados eufemismos. Não usa vaselina na palavra escrita para que ela entre macia pela porta da compreensão.  E se tudo isso não bastasse, Tião escreve fazendo cócegas no cérebro do leitor.

Agora, hábil contador de histórias e causos, memória privilegiada, mesmo pretensão de marcar a historia com as suas lembranças de jornal, Tião conta um pouco da história da imprensa paraibana. História que mesmo para aqueles que não viveram nesse “meio de papel escrito”, dela participam lendo essa “carta alheia”. Uma carta escrita, vivida e lembrada de Tião Lucena.

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