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Blog do Vavá da Luz

CLUBE DE HISTORIA EM : Um entendimento perfeito

Um entendimento perfeito
Era uma vez, numa aldeia longínqua do País da Manhã Calma, dois irmãos que se davam
maravilhosamente. Nunca se largavam: caminhavam, jantavam, cantavam e trabalhavam
juntos durante o ano inteiro.
Quando acabava o inverno, as azáleas cor-de-rosa desabrochavam na montanha e
inclinavam-se diante dos dois irmãos que cultivavam o mesmo campo. No final do verão, as
pegas tagarelavam, cumprimentando os dois irmãos que se juntavam para irrigar o arroz ainda
verde. No outono, o céu, de um azul incrível, admirava os cestos cheios de espigas de arroz,
maduras e douradas que ambos possuíam.
Para cada um dos irmãos, o que realmente importava era a felicidade do outro. E, ainda
que só houvesse um pequeno grão de arroz na tigela, queriam sempre compartilhá-lo! Na
aldeia, não havia ninguém que não admirasse esta entreajuda e o perfeito entendimento.
Um dia, o mais velho, vestido com o seu traje azul
tradicional, casou-se. Como estavam todos felizes!
O irmão mais novo foi o primeiro a felicitar o noivo.
— Irmão, desejo-te as maiores felicidades!
E pensam que o casamento afastou os dois irmãos?
Não! Continuaram a trabalhar juntos, cultivando o arroz,
temporada após temporada.
Alguns meses mais tarde, nasceu um bebé em casa do mais velho. E quando chegou a sua
vez, o mais novo também casou. Evidentemente, isso foi motivo da maior satisfação para o que
já estava casado.
Nesse ano, quando acabaram a colheita, os dois irmãos abraçaram-se:
— Obrigado, fizeste um bom trabalho!
— Eu é que tenho de te agradecer. Trabalhaste mesmo bem!
E ambos tinham as reservas cheias do mesmo bom arroz maduro e dourado.
Mas, naquela noite, o mais velho não conseguiu
pregar olho. Levantou-se e olhou lá para fora…
“O meu irmão mais novo acabou de casar, vai precisar
de vender muito arroz para montar a sua nova casa.”
Decidido, foi à sua reserva, pegou em alguns molhos
de espigas de arroz e foi juntá-los aos do irmão mais novo.
Quando voltou para a cama, tinha a alma bem mais
leve!
Nessa mesma noite, o irmão mais novo dava voltas na cama e pensava: “O meu irmão
acaba de ser pai, precisa de mais arroz do que eu!”
Decidido, avançou para as suas reservas, colocou algumas espigas num cesto e foi juntálas às do irmão mais velho. Quando voltou a entrar na cama, tinha a
consciência bem mais tranquila!
Na manhã seguinte, ao sair de casa, o mais velho olhou para a sua
reserva de arroz e ficou estupefacto:
— Terei sonhado que fui levar uma parte do arroz ao meu irmão?
Mas os seus sapatos estavam bem sujos da lama ainda fresca.
Por sua vez, o mais novo dirigiu-se também para o seu armazém.
Ficou surpreendido, porque estava tudo cheio.
— Será que sonhei que fui esta noite dar arroz ao meu irmão?
No entanto, a sua roupa não estava ali, mas no seu quarto.
Naquele dia, os dois irmãos trabalharam juntos no campo, mas nada disseram acerca do
que se tinha passado na noite anterior. À noite, o mais velho pensou: “O meu irmão vai mesmo
precisar de mais arroz, vou voltar lá!”
E encheu o cesto.
Num passo discreto e seguro, aproximou-se da casa do irmão e encheu a reserva.
Quando o dia começou a nascer, o mais novo pensou: “Tenho mesmo de levar mais arroz
para o meu irmão e para a família, vou lá voltar!”
E carregou ao ombro mais feixes de espigas.
Qual não foi a surpresa do mais velho quando, ao acordar, viu que a sua reserva não
tinha descido nem um centímetro!
E qual não foi a estupefação do mais novo quando se deu
conta de que da sua reserva não tinha desaparecido nem um só
feixe de espigas!
Naquele dia, os dois irmãos voltaram a trabalhar no
campo, sem falarem do acontecido.
Quando a noite chegou, o mais velho tirou alguns feixes
da sua reserva e fez uma marca com giz para saber o que ficava.
Ao mesmo tempo, o mais novo pôs arroz no seu cesto e verificou a altura do que restava.
O mais velho levou os seus molhos.
Pesavam-lhe bastante no ombro!
E o mais novo dobrava o pescoço sob o peso do cesto.
Assim carregados, ambos se iam aproximando da casa do
outro.
O mais velho ouviu barulho: um homem passava com o seu
cesto na noite escura. “ Será um ladrão?” pensou, estremecendo.
O mais novo ouviu o restolho de folhas na noite. “Olha! Está
um homem a aproximar-se! Que será que ele quer?” inquietou-se ele
também.
Quando as nuvens desapareceram, a lua iluminou os rostos de
ambos.
— Ah, és tu, meu irmão!
— Ah, és tu, meu irmão!
Emocionados, pousaram os fardos para se abraçar!
Hoje, a lua continua a sorrir no País de Manhã Calma ao ver os filhos dos dois irmãos
que procuram ainda ajudar-se uns aos outros.
Ano após ano.
Noëlla Kim ; Virginie Aladjidi ; Aurélia Fronty (ill.)
Une si belle entente
Paris, Flammarion, 2012
(Tradução e adaptação)