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Blog do Vavá da Luz

CLUBE DE HISTORIA EM Resgatar um cão, resgatar um homem

Resgatar um cão,
resgatar um homem
O meu pai estava a terminar uma sessão de radioterapia quando o cão dele, Duno, desapareceu.
Após uma série de crises, esta perda revelou-se quase fatal para o meu pai. Duno era um
Queensland Heeler em plena forma, que nunca deixara a quinta onde tinha sido criado. O meu pai
tinha-o treinado desde que ele era um cachorrinho minúsculo e peludo. À voz de comando do meu
pai, Duno sentava-se, ajoelhava-se, ia buscar uma bola ou saltava para as traseiras da carrinha dele.
Era um cão que nunca saía da beira do dono. Julgo que o meu pai gostava tanto dele como dos
filhos e até como da minha mãe. Quando o meu filho Christian tinha quatro anos, ficou uma vez
em casa dos avós. Mal regressou a casa, disse-me:
— Estou morto por ter a idade do avô. A vida dele é tão divertida: só come e vê televisão com o
seu melhor amigo.
— Estás a falar da avó? — perguntei.
— Não! Estou a falar de Duno!
Na altura, ri-me, mas, agora que o cão se perdera, tinha plena consciência de que o seu
desaparecimento era um duro golpe para o meu pai. Deprimira muito depois da operação e esta
perda punha seriamente em causa a sua recuperação. Resolvi encontrar Duno custasse o que
custasse.
Contudo, a minha busca parecia votada ao fracasso. Pus um anúncio no jornal local. Ninguém
telefonou. Durante semanas, esquadrinhei todos as notícias de uma página do abrigo para animais
da nossa zona, na esperança de ver uma fotografia do cão perdido. E telefonei-lhes tantas vezes que
já me atendiam com irritação.
Certa manhã, ao ligar-lhes pela enésima vez, disseram-me que tinham um cão que correspondia
à descrição, mas que era uma fêmea com uma coleira nova e vermelha, ao contrário da coleira de
couro velha de Duno, que era macho.
— Vieram trazê-la, porque não parava de ladrar — informou-me a rececionista.
O cão do meu pai nunca ladrava. Era o bicho mais calmo e sossegado que havia.
Fiquei profundamente triste por ter de dar esta notícia ao meu pai, mas sabia que tinha de fazêlo.
— Pai, o abrigo diz que o teu cão não está lá. Mas talvez devamos ir ver com os nossos próprios
olhos.
Nem sei o que me fez dizer aquilo. Tinha tanto que fazer naquele dia…
— Ajuda-me a encontrar aquele cão! – pedi com todas as minhas forças, embora soubesse que
Deus tinha assuntos mais prementes em mãos.
O meu pai veio buscar-me na carrinha e fomos ao abrigo. Uma vez lá, expliquei aos
funcionários que apenas queríamos dar uma olhadela aos cães que lá estavam para descartar
qualquer possibilidade. Fomos conduzidos ao longo das jaulas, onde cães de todas as raças
esperavam que os donos os encontrassem. Mas não havia nenhum Queensland Heeler.
Era difícil conversar no meio de tantos latidos. Insisti com o funcionário:
— Só têm estes cães?
— Só, se excetuarmos os que estão à espera de ser postos a dormir — disse, embaraçado.
— Onde estão? Queremos vê-los — pedi, determinada.
O funcionário levou-nos a um outro lado da propriedade, onde se situava o edifício que
albergava os pobres animais. Adiantei-me ao meu pai, que caminhava ainda devagar por causa dos
efeitos da terapia, e percorri uma a uma as celas daquele corredor da morte. Quando cheguei ao
fim, disse ao meu pai, desencorajada:
— Duno não está aqui.
Mas, mal o meu pai entrou, um cão que até então se mantivera no fundo de uma cela, saiu da
sombra e pôs-se a ladrar e a saltar. Ergueu-se nas patas traseiras e apoiou as dianteiras nas grades.
Abanava a cauda cheio de alegria, enquanto saudava o dono ruidosamente. Era como se dissesse
“Estou tão contente por te ver, querido amigo! Tira-me deste lugar horrível e leva-me para casa.”
O meu pai percebeu toda a linguagem muda que só donos e animais de estimação partilham.
Abriu a porta da jaula e pôs os seus braços grandes à volta do pescoço de Duno.
— Vamos para casa, rapaz! — disse em voz baixa, enquanto fazia festinhas ao seu cão. — Vai
correr tudo bem.
O meu pai falava com uma confiança que não lhe ouvia há meses.
Uma vez em casa, Duno teve direito a um banho e a uma caminha nova e fofa. O meu pai
deixou que ele ficasse com a coleira vermelha. As pessoas que o tinham roubado tinham deitado
fora a velha coleira e tinham-no amarrado em casa como cão de guarda. Mas, como ele ladrava sem
parar, levaram-no para o canil para se livrarem dele.
Apesar de tantas semanas transcorridas, acabámos por encontrar Duno a tempo. Pode haver
pessoas que não queiram incomodar Deus com algo tão insignificante como o desaparecimento do
melhor amigo… Todavia, quando esse companheiro canino dá a essa pessoa uma nova razão para
viver, eu chamo a isso um assunto de primeira importância. E vocês?
Cynthia Culp Allen