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Blog do Vavá da Luz

CLUBE DE HISTORIA EM : O menino que cresceu no jardim

O menino que cresceu no jardim
Era nisso que o menino acreditava: se as flores crescem assim, por que razão
não crescerei eu, também, com a ajuda da água? E o jardineiro lá lhe fazia a
vontade: regava-o, com delicadeza, como regava as suas mais belas plantas.
Devido a esta mistura com o jardim ou talvez por causa de qualquer outra
razão misteriosa este menino cheirava tão bem que as abelhas não o largavam.
Porém, rodeavam-no com modos pacíficos. Que simpáticas eram as abelhas!
Como se fossem animais domésticos, amestrados. As minhas abelhas, dizia o
menino.
E sucedia algo ainda mais estranho: as abelhas, em vez de fazerem aquele
barulho desagradável que faz tremer os ouvidos, produziam, pelo contrário, uns
sons suaves, melodiosos: como sons de piano. E o menino ficava tão embalado
com a música suave deixada no ar pelas abelhas que adormecia três vezes por
dia; o que era francamente melhor do que só adormecer uma.
As abelhas, além de se portarem como uma orquestra privada, ainda
deixavam, como presente, algum mel no copo que o menino costumava trazer.
No final de semana, o menino ia vender o mel para o mercado. As abelhas,
entretanto, não paravam de andar à volta dele, tocando música e depositando mel
no copo, mal este se esvaziava.
Com este negócio o menino ganhou bastante dinheiro. Com o dinheiro ele
pensava que conseguia crescer muito mais rápido do que o normal e que apenas
em cinco anos ficaria um adulto grande. O certo é que não aconteceu isso. Mesmo
com muito dinheiro o menino não cresceu mais rápido, cresceu ao ritmo de todos
os outros colegas da escola. Percebeu nessa altura que o dinheiro não dava para
tudo, mas só mais tarde agradeceu essa lentidão no crescimento.
O dinheiro não dava para crescer, mas a água sim.
A seu pedido, o jardineiro continuava a regá-lo todos os dias. Ele crescia ao
mesmo ritmo que os outros, mas a água permitia que ele crescesse com um
perfume emprestado das flores. E as abelhas continuavam a rodear-lhe a cabeça.
Durante alguns meses imaginou em adulto vir a ser um príncipe, mas depois
cansou-se de imaginar os outros todos a curvarem-se à sua frente, cheios de
respeito. Pensou que se viesse a ser príncipe provocaria muitas dores de costas
nos seus amigos, que estariam sempre a curvar-se diante dele, e por isso quis,
logo ali, antes dos dez anos, mudar de profissão. Não iria ser príncipe.
Decidiu, então, ser maestro, e transformou-se rapidamente (na sua
imaginação) no maestro mais famoso do mundo. E era um maestro famoso
precisamente porque não precisava de orquestra. Eram as abelhas que faziam
todos os sons à volta da sua cabeça. Cada movimento das suas mãos provocava
um movimento harmonioso das abelhas, e deste movimento nasciam belos sons.
A verdade é que, mais tarde, em adulto, o menino não foi príncipe nem
maestro.
Escolheu uma profissão bem mais modesta: foi jardineiro. Considerava-se
mesmo o jardineiro mais feliz do mundo. E tinha razões para isso. Eram muitas já
as crianças que iam ao seu jardim, pedir para serem regadas de modo a crescerem
saudáveis e cheirosas como ele, o jardineiro que na infância tinha sido um menino
com muita imaginação.
Gonçalo M. Tavares