Amanhã, eu vou voltar Todas as saídas estão fechadas, mas uma coisa eu sei, amanhã eu vou passar… Tens de me compreender, eu não quero mais esta miséria, nem para mim nem para os meus irmãos.
Eu queria muito ter um futuro e, por isso, tenho de fugir… Por que razão esta determinação me deixa sem palavras? Não vês que eu nasci na desgraça? Lá longe, ainda criança, eu ouvia falar de um outro mundo que existia e me atraía. Eu que vivia no meio de conflitos, de violência, de doenças, e de miséria, precisava de liberdade.
Quero a liberdade de viver para mim e para a minha família. Sabes, eu sou o filho mais velho e todos contam comigo. Não os deixo de ânimo leve, apenas quero ter a esperança de ser como tu. Tu que és livre de pensar, de comer e de viajar, olha à tua volta esta gente que só conhece o sofrimento e que vive na indiferença. Eu sei que desesperei nesta longa viagem para chegar até ti.
Vi mesmo a morte bem de perto, longas horas sem beber nem comer, cansado e desesperado… Sou um sobrevivente… E vou começar de novo… Amanhã, eu vou voltar… Tentativas perigosas… Passando por mendicidade, por escaramuças, escondido em acampamentos fortuitos, dormindo no chão, à chuva e ao vento frio, arriscando a minha vida em velhas embarcações ou em frágeis jangadas para escapar à miséria e à falta de um futuro. Eu sou um milagre.
Porém, eles mandaram-me de volta… Mas amanhã eu vou voltar. Eles não me quiseram… Mas amanhã eu vou começar tudo de novo…
Karine Epenoy Demain, je reviendrai Le Puy-en-Velay, L’atelier du poisson soluble, 2013 (Tradução e adaptação)