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CLUBE DA HISTORIA EM : A Páscoa em Cranberry

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– Vejam só! Chegou a primavera! – exclamou o Sr. Whiskers, à porta da loja do Seth, com um ramo de pequenos salgueiros nos braços.

– Vim para planearmos a caça aos ovos da Páscoa, Seth – continuou. – Este ano, tu pintas os ovos e eu visto-me de coelho da Páscoa.

Seth franziu o sobrolho.

– Não! Nada de caça aos ovos da Páscoa este ano. Vou vender a loja e migrar para sul. Já terei partido quando chegar a Páscoa.

– Vender a loja! – o Sr. Whiskers não podia acreditar no que ouvia. – Pelos meus bigodes, Seth! Quem é que me vai vender as minhas camisas de noite e as minhas ceroulas? A quem é que vou ganhar ao xadrez aos sábados à noite?

– A mim não será de certeza! – disse Seth, abanando a cabeça. – Não faço falta a ninguém. Ninguém se importa comigo. Sinto-me tão sozinho neste lugar tão grande! Estou decidido a dizer adeus a Cranberryport.

Este tem sido um longo e solitário inverno para Seth. A sua mulher morreu no final do verão e ele sente a falta de uma voz durante a noite. O Sr. Whiskers gostaria de o animar, mas não conseguiu lembrar-se de nada.

– E estou farto deste céu sempre cinzento – acrescentou Seth. Despediu-se do Sr. Whiskers, bateu com a porta e foi dormir uma sesta na parte de trás da loja.

 

O Sr. Whiskers foi até à casa da Avó e da Maggie para lhes contar as novidades.

– Eu também estou muito incomodada – disse a Avó, atarefada a preparar chocolate quente. – Tanto a Nan como a Avó Gates, as minhas duas amigas, decidiram que não conseguem aguentar mais um inverno com tanta neve, sozinhas nas suas quintas. Precisam de arranjar quartos na cidade mas não há nenhum para alugar.

– Lembrei-me de uma coisa, Avó – exclamou Maggie. – Os quartos por cima da loja do Seth já pertenceram a um hotel. Será que não dariam para as tuas amigas?

O Sr. Whiskers olhou espantado para Maggie.

– É mesmo isso, Maggie! – exclamou. – Estão cheios de mobília velha. Vamos pedir ao Seth que os limpe.

A avó sorriu, deliciada, para Maggie.

– Vou fazer uns telefonemas – disse. E percorreu rapidamente o corredor até ao telefone.

Encantado, o Sr. Whiskers voltou para a loja do Seth.

Mas Seth recusou a ideia.

– Isso nunca! – resmungou. – Estou demasiado cansado para limpar aqueles quartos todos.

Mesmo assim, o Sr. Whiskers não desistiu.

– Pelos meus bigodes, Seth! Aquelas pessoas estão completamente sozinhas. Alguém tem de as ajudar. Elas precisam de ti! – disse, a andar de um lado para o outro.

– Bem, – refletiu Seth – lá em cima está uma grande confusão, mas talvez possamos dar uma vista de olhos.

 

Dali em diante, o Sr. Whiskers tomou o caso em mãos. Depois de terem vendido as cadeiras e as mesas que havia a mais, ainda sobrou dinheiro para comprar tintas e pincéis.

Até o presidente da junta e o xerife se juntaram a esfregar, pintar e polir. Maggie e os amigos limparam as janelas e a Avó fez as cortinas.

Os quartos, limpos e brilhantes, foram uma surpresa maravilhosa quando o Sr. Whiskers, a Maggie e a Avó os mostraram às novas residentes.

A Avó Gates ficou especialmente agradada.

– Nunca mais vou ter de sair no meio de uma tempestade para ir à mercearia – exclamou toda excitada.

Nan olhou pela janela para a praça em frente.

–  Oh, Seth! Podemos ver a caça aos ovos da Páscoa daqui! –  disse.

Seth deu-se por vencido.

– Ganhaste – disse ao Sr. Whiskers. – Parece que terei de ficar em Cranberryport um pouco mais. Maggie, diz às crianças da escola que a caça aos ovos da Páscoa está de pé.

As árvores começaram a florir e, em breve, havia uma névoa verde mágica por toda a terra. Na loja, Seth deu consigo, volta e meia, a prestar atenção aos sons agitados que vinham do andar de cima. No sábado de Páscoa, a Avó Gates ajudou Seth a pintar os ovos.

 

O domingo de Páscoa amanheceu com um sol radiante.

Bem cedo, Seth e o Sr. Whiskers começaram a esconder ovos de todas as cores – laranja, amarelo, violeta – atrás dos arbustos e árvores e debaixo das pedras no parque da aldeia.

Seth sentia-se quase feliz por fazer parte desta celebração da Páscoa.

– Olhem-me só para este céu azul – exclamou, pensativo.

Ao meio-dia, uma multidão de crianças felizes e barulhentas começou a juntar-se no centro da aldeia. O Sr. Whiskers reuniu-as e preparou-as para a caça. Foi então que gritou:

– Um, dois, três, PARTIDA!

E começou a caça aos ovos da Páscoa. As crianças precipitavam-se por entre as pedras e os arbustos à procura dos ovos. Sabiam que havia um prémio – um ovo de chocolate enorme num embrulho dourado – para a criança que encontrasse mais ovos.

Quando quase todos os ovos tinham sido descobertos, Seth foi à procura do Sr. Whiskers e sussurrou-lhe qualquer coisa ao ouvido. Os olhos do Sr. Whiskers reviraram-se e ele resmungou.

– Tu prometeste – lembrou-lhe Seth enquanto empurrava o amigo em direção à loja.

Minutos mais tarde, surgiu um coelho da Páscoa, grande e gordo, a saltar em redor da praça. As crianças correram para ele aos gritos.

– O que é isto? – perguntou um rapazinho, a puxar pela cauda do coelho.

– Pelos meus bigodes! Eu sou o coelho da Páscoa! – gritou o Sr. Whiskers. – Não vês?

Trazia em cima da cabeça um cesto gigante com ovos de chocolate embrulhados em papel dourado.

– Hoje há prémios para todos – anunciou Seth.

As crianças congratularam-se. Até o mais pequenino teve direito a um prémio dourado para levar para casa.

–  Esta foi a melhor caça aos ovos da Páscoa de sempre! – gritou uma das crianças para Seth, enquanto todos se despediam.

Seth ficou radiante.
– Então até para o ano! –  bradou ele de volta.

– Até para o ano! Ouviu isto? – perguntou o Sr. Whiskers à Avó Gates, sorrindo.  – O Seth vai mesmo ficar por aqui.

Começou a saltar de volta até à casa da Avó para se vestir para o jantar, mas a dada altura, parou. Maggie estava a dizer a Seth aquilo que iriam comer no almoço de Páscoa.

– Vamos ter cordeiro assado, batatas novas, gelatina de menta e tarte de mirtilo – explicitou ela.

– Iupi! – gritou o Sr. Whiskers.

– Ah, mas isso é só para nós! – disse a Avó, piscando o olho a Seth. – Para si, há um molhe de cenouras, lá atrás, na coelheira.

O Sr. Whiskers começou a sorrir. Não conseguiam enganá-lo. Haveria sempre um lugar para ele à mesa, na casa da Avó durante as férias – assim como um lugar para  Seth.

Ele sabia que os amigos tomam sempre conta uns dos outros.

É assim em Cranberryport – nas férias e durante todo o ano.

 
 

Wende and Harry Devlin

Cranberry Easter

New York, Aladdin Books, 1993

(Tradução e adaptação)