Um passinho… outro passinho Inácio tinha o mesmo nome do seu melhor amigo, o avô Nacho. Quando Inácio nasceu, o seu avô disse a toda a gente: — O Inácio não irá a aprender a dizer avô antes dos três anos, por isso vou ensiná-lo a chamar-me Nacho.
E Nacho foi a primeira palavra que Inácio aprendeu a dizer. Foi Nacho quem ensinou Inácio a andar. — Agarra-te às minhas mãos — dizia-lhe o avô. — Um passinho… outro passinho. Um passinho… outro passinho. Nacho e Inácio gostavam muito de brincar com os velhos cubos de madeira, guardados numa prateleira no quarto de costura.
Os cubos tinham letras em dois lados, números em dois lados e nos outros dois lados havia desenhos de animais e outras coisas. Inácio e Nacho iam colocando os cubos uns em cima dos outros, muito devagar, para construir uma torre. Muito alta. Havia trinta cubos. Às vezes, quando ainda nem iam a meio, a torre caía. Noutras alturas, a torre ia crescendo, crescendo, cada vez mais alta, até quase não haver mais cubos para pôr. — Já só falta um — dizia Nacho. — E é o cubo do elefante — dizia Inácio. E com todo o cuidado, punham o cubo do elefante no cimo da torre. Mas depois, Nacho soltava um espirro e a torre inteira caía por terra. Inácio ria-se como um perdido. — Os elefantes fazem-te sempre espirrar, Nacho — dizia Inácio. — Da próxima vez é que vamos fazer uma torre que não vai cair — dizia-lhe o avô.
Então ele sentava o neto nos seus joelhos e contava-lhe histórias. — Nacho, conta-me como foi que me ensinaste a andar — pedia-lhe ele. E o avô contava-lhe que o agarrava pelas mãos e lhe dizia: Um passinho… outro passinho. Um passinho… outro passinho. Até que um dia Inácio soltou as mãos do avô e andou sozinho. Quando Inácio fez cinco anos, ele e Nacho passaram um dia muito especial. Foram à Feira Popular. Andaram na montanha russa, comeram gelados e cachorros quentes. Tiraram fotografias e cantaram canções. E, à noite, foram ver o fogo-de-artifício.
No regresso a casa, Nacho ia-lhe contando histórias. — Agora — pediu Inácio — conta-me como foi que me ensinaste a andar. E Nacho contou-lhe. Algum tempo depois do aniversário de Inácio, o avô adoeceu gravemente. Quando Inácio regressou da escola, já não o encontrou em casa. — Nacho está no hospital — disse-lhe o pai. — Teve uma coisa que se chama AVC. — Quero ir vê-lo — pediu Inácio. — Não se pode, meu amor — respondeu-lhe a mãe. — Nacho está muito doente e não pode ver ninguém. Não pode mexer os braços nem as pernas. E também não pode falar.
O médico diz que se calhar nem conhece as pessoas. É preciso esperar que melhore. Inácio ficou sem saber o que fazer. Não queria comer e à noite não conseguia adormecer. A única coisa que queria era que Nacho se curasse. Passaram-se muitos meses e Nacho continuava hospitalizado. Inácio sentia muito a falta do avô. Um dia, quando Inácio chegou da escola, o pai anunciou-lhe que o avô viria para casa. — Mas ainda está muito doente — diz-lhe o pai. — Não pode andar nem falar. Quando me vê a mim ou à tua mãe não sabe quem somos. E o médico pensa que não irá melhorar. De modo que não fiques assustado se não se lembrar de ti. Mas Inácio assustou-se muito. O avô não se lembrava dele.
A única coisa que fazia era ficar deitado o dia todo. Às vezes o pai de Inácio tirava Nacho da cama e sentava-o num cadeirão. Mas ele não falava nem sequer se movia. Uma vez Nacho quis dizer qualquer coisa a Inácio, mas tudo o que conseguiu fazer foi um som horrível. Inácio fugiu do quarto a correr. — O Nacho deu um grunhido de monstro — disse ele à mãe. — Não foi de propósito — respondeu ela. Inácio voltou para o quarto onde o avô estava sentado. Pareceu-lhe ver uma lágrima deslizar-lhe pela cara. — Eu não queria ter fugido a correr, Nacho. Mas fiquei assustado. Desculpa. Sabes quem eu sou? Inácio teve a impressão de que o avô lhe piscou um olho. — Mamã, mamã! O Nacho reconheceu-me! — gritou ele. — Não, Inácio. O teu avô não nos reconhece — disse-lhe a mãe. — Acalma-te.
Mas Inácio tinha a certeza. Correu ao quarto de costura. Tirou da prateleira a caixa dos cubos e correu de novo para o quarto do avô. Na cara de Nacho apareceu um pequeno sorriso. Inácio começou a fazer a torre. Chegou a meio… Depois quase até cima… Faltava só um cubo. — Bem, Nacho — disse Inácio — agora o cubo do elefante. E Nacho emitiu um ruído estranho, que parecia ser um espirro. A torre caiu por terra e Nacho riu-se e mexeu um pouco os dedos para cima e para baixo. Inácio riu-se muito. Agora tinha a certeza de que o avô se iria curar. E assim foi.
Aos poucos começou a dizer algumas palavras. Pareciam estranhas, mas quando dizia Inácio percebia-se mesmo muito bem. E depois o avô conseguiu mover os dedos e a seguir as mãos. Inácio ajudava-o a comer, até que um dia o avô conseguiu segurar sozinho a colher. Mas ainda não era capaz de andar. Quando a época das chuvas chegou ao fim, o pai de Inácio pôs uma cadeira no jardim para Nacho. Inácio sentou-se à sua beira. — Inácio — pediu Nacho. — Uma história. E então o neto contou-lhe uma história. Depois, devagarinho, o avô levantou-se da cadeira. — Tu. Eu. Andar — disse ele.
]O neto compreendeu. Pôs-se diante do avô para que este se apoiasse nos seus ombros. — Já está, Nacho. Um passinho… E o avô deu um passo. — Agora outro passinho. O avô deu outro passo. No fim do verão, Inácio e o avô já conseguiam caminhar até ao parque, e o avô, a cada dia que passava, ia falando cada vez melhor. Quando fez seis anos, Inácio foi buscar a caixa dos cubos. A pouco e pouco, levantou a torre. Só faltava um cubo. — E agora, cubo elefante — disse o avô. Inácio pô-lo no cimo. O avô espirrou. — Os elefantes sempre te fizeram espirrar, Nacho — disse Inácio. — Da próxima vez, vais ver que a torre não vai cair.
Conta-me agora uma história. O avô contou-lhe. E depois pediu-lhe: — Inácio, conta-me como me ensinaste a andar. — Bem, Nacho, tu apoiaste-te nos meus ombros e eu disse-te: Um passinho… outro passinho. Um passinho… outro passinho.
Tomie de Paola Un pasito y otro pasito Caracas: Ekaré, cop. 1986 (Tradução e adaptação)