Era uma vez uma cidade sem jardins, sem árvores, sem verde de espécie nenhuma. A maioria das pessoas passava o tempo dentro de casa. Como se pode imaginar, era um lugar muito desolado.
No entanto, havia um rapaz que gostava de andar na rua. Mesmo em dias de chuva, quando toda a gente ficava em casa, o Jorge andava sempre a chapinhar alegremente pelo bairro.
Foi numa manhã assim que o Jorge fez diversas descobertas surpreendentes. Andava a passear ao pé da velha linha férrea, como fazia de tempos a tempos, quando deparou com umas escadas escuras que conduziam lá acima à linha.
A linha férrea tinha deixado de funcionar havia muito tempo. E como o Jorge sempre quisera explorar a linha, o curioso rapaz só podia fazer uma coisa.
O Jorge correu escadas acima, empurrou a porta e saiu lá para fora para a linha. A primeira coisa que viu foi uma solitária mancha de cor. Plantas e flores selvagens eram a última coisa que esperava encontrar lá em cima.
Mas quando olhou mais de perto, tornou-se claro que as plantas estavam a morrer.
Precisavam de um jardineiro.
O Jorge podia não ser um jardineiro, mas sabia que era capaz de ajudar. Por isso voltou à linha férrea logo no dia seguinte e pôs-se a trabalhar. As flores quase se afogaram e ele teve alguns problemas com a poda, mas as plantas esperaram pacientemente que o Jorge descobrisse maneiras melhores de jardinar.
À medida que as semanas passavam, o Jorge começou a sentir-se um jardineiro a sério, e as plantas começaram a sentir-se um jardim a sério. A maioria dos jardins ficam sempre no mesmo sítio. Mas este não era um jardim vulgar. Com quilómetros de linha férrea pela frente, o jardim começava a sentir-se irrequieto.
Queria explorar. As resistentes ervas daninhas e os musgos foram os primeiros a mexer-se. Rebentavam linha fora cada vez mais para diante, e eram seguidos de perto pelas plantas mais delicadas. Nos meses seguintes, o Jorge e o jardim curioso exploraram todos os recantos da linha férrea.
Depois de passar a primavera e o verão e o outono com o jardim, o tempo do Jorge na linha férrea foi finalmente interrompido no inverno. Pesados mantos de neve cobriram a cidade. E pela primeira vez desde que se transformara em jardineiro, o Jorge não podia ir visitar as plantas.
Em vez de desperdiçar o tempo a preocupar-se com o jardim, o Jorge passou o Inverno a preparar-se para a Primavera.
Ao fim de três meses de frio, a neve começou finalmente a derreter.
O Jorge meteu o seu novo material de jardinagem num carrinho de mão e dirigiu-se a linha férrea.
O inverno tinha sido duro para o jardim. Mas graças ao planeamento do Jorge, as suas belas ferramentas novas e a uma ajudinha do Sol, as plantas não tardaram a acordar do seu sono invernal.
O jardim sempre quisera explorar o resto da cidade, e nessa primavera estava finalmente pronto para iniciar a caminhada.
Mais uma vez, as resistentes ervas daninhas e os musgos foram os primeiros. Rebentaram cada vez mais afastados da linha férrea, e foram seguidos de perto pelas plantas mais delicadas.
O jardim tinha especial curiosidade por coisas velhas e esquecidas. Algumas plantas apareceram onde não deviam. Outras apareceram de forma misteriosa e repentina.
Mas as coisas mais surpreendentes que apareceram foram os novos jardineiros.
Muitos anos mais tarde, a cidade inteira tinha florescido. Mas, de entre todos os jardins, o Jorge preferia o jardim onde tudo começara.
Peter Brown
O jardim curioso
Lisboa, Editorial Caminho, 2010