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VALE O ULTIMO FAVOR (RAMALHO LEITE)

VALE O ULTIMO FAVOR

O meu pai foi vereador por vários mandatos e prefeito duas vezes, além de forte cabo-eleitoral dos candidatos que apoiava. Sua votação era baseada na afinidade que criava com o eleitorado, tão reduzido que permitia sua visita, casa a casa, antes das eleições que sempre ganhou, em Borborema. Depois que ampliou sua área de atuação para Bananeiras, aposentou a seringa que adquirira logo depois que o comercio o deixara. A aplicação de injeção não teria muita utilidade em uma cidade com hospital e outros recursos para atender aos seus amigos e compadres. E estes eram muitos. Em uma Missão de Frei Damião, encheu a igreja, sozinho, com os afilhados a serem crismados.
O tipo de política que se fazia então, ainda hoje persiste em alguns grotões do interior. Herança do passado, essa política do favor que resulta no voto futuro, tem nome bonito: clientelismo. Para os cientistas políticos, a herança colonial seria o fator predominante da presença do clientelismo na democracia moderna. Nesse cenário, o eleitor aceita um beneficio imediato em troca do voto ao invés de optar por vantagens mais amplas, tidas como incertas. Essa descrença no exercício do mandato ou na retribuição da representação que delega, faz do portador do voto um “interesseiro imediatista”, como diria Odorico Paraguassú. Na sua sabedoria, meu pai não censurava esse comportamento. Para ele, a eleição era a safra do eleitor…
Não vou aqui desenvolver qualquer tese para mudar a relação entre o eleitor e o candidato. Não sou cientista político. Como um dos atores desse processo, aproveito o espaço para contar a minha experiência, submetido que fui a esse método desgastante por muitos anos. Claro que o volume de votos obtidos não se prende, exclusivamente, ao favor direto ou à troca de alguma vantagem. A ação do candidato, o discurso, as teses que defende, completam os votos necessários à sua eleição. Os “pirangueiros”, como o deputado Orlando Almeida os carimbou, são uma minoria identificada facilmente. Como político ouvi muitos pedidos. O mais estranho foi o de uma jovem mulher que desejava um emprego para poder justificar ao marido, as joias que recebia do amante. E me explicou isso com todas as letras, por telefone. O nariz de cera terminou se alongando. O que eu queria mesmo era mostrar que o ultimo favor é que ganha o voto.
Morei algum tempo ao lado da Federação dos Trabalhadores, na rua da Palmeira. A entidade mantém uma hospedaria para seus associados do interior, em tratamento médico na Capital.O deputado Edvaldo Motta hospedou alí uma família de Patos, com um deles doente. A mulher perguntou a ele como seriam as refeições e ele, brincalhão:
– Vocês vão comer aí na casa vizinha, do deputado Ramalho Leite.
Estava acompanhando Antonio Mariz em um comício na feira de Patos quando fui chamado por uma mulher. Desci do palanque para atendê-la e surpreso, ouvi a sua historia:
– O senhor vai ter dez votos aqui em Patos. É o que minha família tem para agradecer à sua mulher, que nos alimentou por quinze dias, lá na Federação.
Edvaldo cuidou do doente e Marta o alimentou. Ganhei os votos. Valeu a tese de que o último favor prevalece.