Ramalho Leite
Quando terminei a faculdade de direito, instalei escritório de advocacia na rua Arthur Achiles, quase um beco, por trás de onde ficava o antigo Pronto Socorro. Saberia mais tarde que era pequena a homenagem que a cidade prestou a esse grande jornalista que viveu entre o final da Monarquia e as primeiras décadas da República. Arthur Achiles é o patrono da Cadeira 07 da Academia Paraibana de Letras, cujo fundador, foi o mesmo da Academia, o imortal Coriolano de Medeiros, sucedido por Maurílio Almeida e Dorgival Terceiro Neto. Ao tomar assento naquela cadeira, tracei os traços principais da atuação do seu patrono, finalizando com o texto que transcrevo abaixo:
“Com essas pequenas investidas publicitárias, ocupando parcos espaços nas páginas de O Commércio, Artur Aquiles sustentava a sua batalha cívica e mantinha o seu estado de pobreza. Maurílio Almeida, de quem me ocuparei adiante, transcreve referência de Tavares Cavalcante, no prefácio do livro de Apolônio Nóbrega – A Historia Republicana na Paraíba: “É-me grato gravar aqui o nome de Arthur Achilles com os melhores sentimentos de veneração e respeito. Foi a mais pujante organização de jornalista que nosso Estado produziu e fora da Paraíba poucos a igualaram… Não houve problema paraibano que ele não tratasse, interesse de sua terra que ele não advogasse. Sua posição sempre foi moderada e construtiva, salvo quando queimado pelo fogo da politicalha. Sua maior critica resultou da presunção de que “as sucessivas administrações não correspondiam aos vitais interesses do Estado”.
Artrur Achilles alimentava a esperança de que a República fosse o prenúncio de melhores dias para a sua Paraíba. Frustrado no seu íntimo por batalhas inglórias que teria travado, ensarilhou as armas “para evitar o contato dos homens iludidos com as aparências do prestígio e do poder,tudo envidando para não perdê-las”.
Achilles tinha razão. Viviam-se as primeiras décadas da República.O Marechal Deodoro da Fonseca, que a historia oficial rotulou de Proclamador da República, de tão doente não teve forças para fazê-lo ou evitou a oficialização do ato para não contrariar seu íntimo monarquista. Conta Laurentino Gomes, em livro 1889, que, mesmo enfermo, o marechal tinha que se fazer respeitar pela imponência do momento. Ao se aproximar do Campo de Santana, pede uma montaria e lhe oferecem um manso cavalo baio, herói involuntário da República, por suportar as nádegas ilustres do Marechal Deodoro da Fonseca. A partir desse serviço cívico inusitado, imortalizado em quadro do pintor Henrique Bernardelli, o cavalo foi “aposentado do serviço militar por serviços relevantes prestados ao novo regime, passaria o resto dos seus dias sem fazer nada, vivendo confortavelmente no estábulo do seu quartel no Rio de Janeiro”. Estava inventada a sinecura!
O próprio Deodoro reconheceria: “Vejam os senhores, quem lucrou no meio de tudo aquilo foi o cavalo”.
O golpe que resultou na República, trouxe benefícios não somente para o cavalo de Deodoro, mas também para os militares que dele participaram, e alguns civis de escol, que ganharam a patente de generais “sem nunca ter envergado uma farda”. Rui Barbosa passou a ser chamado de general Barbosa e Quintino Bocaiuva, de general Bocaiúva. Tal ação entre amigos recebeu do monarquista Eduardo Prado uma sentença reveladora: “O Quinze de Novembro não foi, portanto, um ato heróico; foi um bom negócio”.
A nossa Republica, que já nasceu capenga, levaria mais de um século, aos trancos e barrancos, para, finalmente, incorporar o povo em seu contexto. Campanhas como a malograda Diretas Já trouxeram o povo para efetivas manifestações populares, hoje mais comuns, mais freqüentes e mais intensas, expondo reivindicações e cobrando seu atendimento.Premonição de Ulisses Guimarães: “ Lula, nós botamos o povo nas ruas.Quem vai tirá-lo de lá?” Descontados os atos de vandalismo, louve-se nas manifestações populares a troca do cômodo “dormir eternamente em berço esplêndido” pela afirmação de que nesta pátria “um filho seu não foge à luta”.” (do meu discurso de posse na APL)