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Blog do Vavá da Luz

PILAR, DOM PEDRO II E O AMIGO MAROJA ( Por Frutuoso Chaves)

PILAR, DOM PEDRO II E O AMIGO MAROJA

PILAR, DOM PEDRO II E O AMIGO MAROJA ( Por Frutuoso Chaves)

Eis-me, aqui, a lembrar da visita do Imperador à Paraíba, nos idos de 1859, véspera do Natal. Com dona Tereza Cristina, a imperatriz, a reboque, ele desembarcou do APA, no Porto do Varadouro, ainda profundo o suficiente para receber, em plena João Pessoa, o vapor da frota imperial. Conta-se que Epitácio Pessoa, décadas depois, despejaria, em vão, rios de dinheiro para o desassoreamento desse curso d’água e que tal providência de nada serviu a não ser para engordar alguns bolsos. Mas essa é outra história.
Depois dos salamaleques de costume, com visita, inclusive, a Cabedelo, o imperador, no dia seguinte, cedo da manhã, pegava o rumo de Pilar. Viagem feita a cavalo, com dona Tereza, numa carruagem, a tomar poeira. Cavaleiro exímio, ele puxava o ritmo da marcha e, logo mais, com sua comitiva, batia à porta do Engenho São João para o desjejum.
José Lins do Rego, aparentemente baseado na conversa dos mais velhos, ouvida à mesa do Corredor, escreveu que na parada seguinte, a do Engenho Maraú, o grupo desmontou para o almoço e o descanso dos animais. Ali, um pé de fruta-pão exibia-se com sua melhor carga. Servido de uma bacia para lavar o rosto e as mãos, Dom Pedro contemplou nuvens pesadas que então se formavam: “A atmosfera está carregada”, observou. O barão de Maraú, dono da casa e matuto com dinheiro suficiente para a compra do título nobiliárquico, olhou para a árvore e, todo solícito, deu sequência à conversa: “Vossa Majestade não viu nada. Carregada estava no ano passado. Era cada atmosferão”…
É do mesmo José Lins a história da prisão do presidente da Câmara Municipal de Pilar, um parente seu, que recebera bom dinheiro a fim de preparar a cidade para a mais importante visita de toda a história de seus atuais 265 anos, há pouco tempo completados. Quase nada havia sido feito. Dom Pedro chegou à casa onde deveria pernoitar, jogou o chapéu-do-chile no chão e deitou na rede do pedreiro.
Passei um tempão a acreditar nessa história até pôr as vistas no livro do historiador Maurílio de Almeida, “Presença de Dom Pedro II na Paraíba”. Ele a desdiz, completamente. O romancista, neste ponto, falou mais alto do que o memorialista. Aliás, todos os volumes do chamado “Ciclo da Cana de Açúcar”, a essência literária de José Lins, são um misto de ficção e realidade. Mas, o que seria desses enredos sem as artes e o poder de criação do autor?
Pois bem, Maurílio teve acesso, em Petrópolis, às anotações feitas, do próprio punho, por dom Pedro acerca dessa viagem. E as reproduziu, fielmente, na obra com que brindou a Paraíba e sua história.
Impressionante a forma detalhada como Dom Pedro descreve o Pilar daqueles tempos. A Igreja e a Casa de Câmara e Cadeia, uma de frente para outra, as ruas em paralelo com o rio e o fogo lambendo o canavial a poucos passos dos quintais. É incrível como a paisagem pouco mudou por ali.
Eu sugeri a Heitor Maroja, então presidente da Fundação Menino de Engenho, que se valesse dos préstimos do primo Odilon Ribeiro Coutinho para tirar cópia das notas do imperador, a fim de exibi-las no arremedo de museu que, na ocasião, tentava implantar na mesma Casa de Câmara e Cadeia, onde dom Pedro concedeu beija-mão à sociedade paraibana. Humberto Lucena, outro primo de Heitor, conseguiu, no governo de Sarney, a restauração desse prédio com técnicos e recursos do Iphan.
Era uma época na qual Dom Joãozinho, um dos príncipes inscritos na ordem de herdeiros da coroa, desembarcava na Paraíba em campanha pela volta da monarquia. Odilon o recepcionava. Dias depois, Heitor me contava que sua proposta fora bem recebida. De todo modo, a ideia não avançou: morreu com meu velho amigo e com o projeto de ascensão ao trono dos príncipes brasileiros.