Li e escrevi muitas palavras. Inúteis? Algumas feias, mas úteis. As pensadas e talvez úteis já tenho escrito em muito mais de milhares de páginas, formato ofício, muitas delas, para ser crônica, o que me faz contá-las em cada linha, como exigência do jornal, para caber no espaço que me é, há anos, reservado. Reclamações vinham, desde Lena, no Correio da Paraíba, onde iniciei os meus textos, a partir 2005; sim, são muitas crônicas que, se escolhidas, já dariam livros. Depois, veio Walter Galvão para me advertir: “Diminua duas linhas”. O jornal encerrou a sua então brilhante trajetória, e a convite de Naná, migrei para o único da cidade, A União, onde, por sua vez, apareceram Clóvis, e agora, nosso dileto Luiz Carlos, que vem me aturando, quando sou prolixo, não contando palavras. Não prolixo, apenas primando pela clareza… Mas, habituei-me e com ajuda do computador, zelo a exata quantidade de 534; caso 600, devo repensar o que escrever. Difícil, porque uma palavra é importante. E duas, mais ainda… Como elas pedem espaço para se mostrar!
Isso acontece com todos os cronistas, que também reclamam, de repente, como se fosse um surto de esterilidade verbal. Troca-se de lápis; volta-se à caneta de pena. Até procura-se o que beber, mesmo que seja água… Mas, ao retornar, traga o assunto e as palavras adequadas para dizê-lo. À falta de palavras, decidi me servir delas sobre elas. Que não aborreça o leitor. Talvez tenha sido falta de assunto e a palavra levou a culpa. As palavras são inventadas para externarem nossos pensamentos, então que haja pensamentos, ideias e imagens… Alguns se desculpam que imaginam, mas não têm a palavra para o que quer dizer; e expressam-se: “Fugiu-me a palavra”.
Ou é o conceito que foge da palavra que o encerra? Os filósofos, e mais os lógicos, distinguem como a palavra sendo um termo (terminus), que em latim significa limite. O limite separador dos conceitos, das ideias, dos valores, dos indivíduos, dos fenômenos, das coisas e dos et cetera da vida. Ao simbolizar, a palavra isola, define. É por isso que quem não sabe palavras, quase tudo mistura e pouco discerne.
A palavra ou o termo pode manifestar amor, ódio ou indiferença; une e desune; aproxima ou distancia. Na política, as palavras brigam entre si, e dividem-se em “situação e oposição”. Discutem sem saber o significante e o significado das palavras sobre as quais se confrontam, ou não percebem que se trate da mesma palavra e do mesmo conceito… Anatole France, em O Manequim de Vime pondera tais confrontos: “Os homens brigam com mais frequência por palavras. É por palavras que eles matam e de preferência se fazem matar”.
Enfim, passo a palavra ao mestre Machado de Assis que, em Histórias sem Data – Primas de Sapucaia, aborda a razão pela qual cronistas começam e terminam uma crônica naquela quantidade de palavras: “Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo, ou uma revolução; alguns dizem mesmo que assim é que a natureza compôs as suas espécies”. Nos meus tempos de menino, ouvi de pais: “Não diga essa palavra”. E lia-se na Missa: In principio erat Verbum, impressionava-me a tradução: “No início era a Palavra”…