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Outros dias e o Dia do Professor (Damião Ramos Cavalcanti)

 

 

          Há dia em que está dando tudo errado ou ao contrário. Hoje, vai-se ao médico, mas a consulta marcada na próxima sexta-feira; joga-se na roleta no número 4 e dá oito; no oito e dá quatro. Já veio, no dia 24 de março, à minha casa uma amiga, bem vestida, trazendo-me um presente, quando meu aniversário seria, nesse dia, mas em abril. Enganos da vida.  “- Não vai ter aula, hoje é feriado, morreu o professor de português. Corrigiu o colega, mais ou menos eufórico: “- Não, hoje é Dia do Professor!”  Dubiamente, o mais calado deles, finalizou:” – Foi o seu dia”. Enfim, não houve aula. Certamente , não acontece aula, quando faltam os alunos ou o professor, que, no caso, morreu.
          Praticamente, nada lhe sobrava depois de fazer suas despesas de rotina, como pagar o aluguel da casa, sua feira, a prestação do seu velho carro, o combustível que gastava a caminho da escola e remédios. Caracterizava-se pelo seu saber, assiduidade ao serviço do ensino e pelo seu surrado guarda-chuva, que protegia do sol seu câncer de pele. Vivia nas livrarias como quem buscasse renovação. Mas, após folhear livros, ao perguntar o preço, colocava-os de volta na estante.
         Abandonara seu costumeiro lazer de passear, aos domingos, à beira-mar, depois que contraiu vivas manchas avermelhadas no rosto. No velório, escutavam-se os cochichos:” – Viveu para o ensino. Nada deixará aos filhos e à viúva”. Dispensados da aula para acompanharem o enterro, apenas três dos colegas da escola e dois alunos compareceram, além de familiares, para velarem o morto. Lá descansava junto à única coroa de escassas flores, doada pela sua Diretora. Dia seguinte, as aulas prosseguiram…

          O magistério é uma profissão muito antiga. Seus primórdios na história da educação demonstram que o ensino é indispensável à boa organização político-social. Em certas culturas, o professor devém imprescindível à comunidade e a única autoridade que não se inclina diante do rei. Na verdade, onde não existiu professor, além de se estabelecer a desorganização social, os “Einstein” da vida nasceram e cresceram bem distantes da sala de aula, sem aprenderem a tabuada.

          Políticos abusam do chavão: “Sem educação, não existe desenvolvimento”. A que se deveria acrescentar: Sem professor, não há educação. Do que também se deduz: Sem educação, o povo não sabe votar… Porém, nos planos orçamentários, é notória a falta de compromisso político para com a educação. A isso se somam as negociatas políticas, indicando desastrosas escolhas dos dirigentes educacionais. Em consequência, os índices educacionais, no nosso país, colocam-nos nos primeiros lugares do ranking do analfabetismo e dos alfabetizados que não sabem ler.  E também, no elevado percentual de crianças, após o ensino fundamental, que  abandonam a escola ; assim como estudantes do ensino médio com aprendizagem insuficiente ao ensino superior.

          Dom Pedro I, em 15 de outubro de 1827, decretou que “todas as cidades, vilas e lugarejos tivessem escolas de primeiras letras”. Esse decreto previa também um bom quadro curricular e assegurava bons salários aos professores. Porém, essa determinação foi muito pouco cumprida. Em 1947, o dia 15 de outubro passou a ser o Dia do Professor. Mas, o dia foi oficializado, como feriado escolar, pelo Presidente João Goulart, através do Decreto Federal n.º 52.682, de 14 de outubro de 1963. Feriado, em que faleceu o professor de português…  

 

Damião Ramos Cavalcanti

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