Manoel José de Lima ficou conhecido na história da cidade, como o poeta Caixa Dágua. Nasceu no município de Cruz do Espírito Santo, em 05 de janeiro de 1934. Chegou em João Pessoa aos 13 anos de idade, onde aprendeu a ler e escrever, havendo concluido o curso ginasial. Era pai de três filhas, do seu casamento com Maria de Lúcia Oliveira. Ainda criança, quando da morte de sua mãe, escreveu seu primeiro poema “Caminho Perdido”, em que continha os versos: “Se as noites envelhecessem./ Se meus olhos cegassem./ Se os fantasmas dançassem em blocos de neve./ Para que ensinassem./ O caminho por donde eu caminhei./ A cidade sem porta./ As ruas brancas de minha infância que eu não volto mais. Se minha mãe se abruma/se o mar geme,/ e se os mortos não voltam mais”. Perguntado sobre o sentido do verbo “abrumar”, respondeu: “É coisa de mãe. Eu vou lá saber coisa de mãe?”.
Era um notívago. A partir das 19 horas, quando saía de casa, cumpria um roteiro que se iniciava com a leitura de jornais em uma das tradicionais bancas de revistas, localizada no Parque Solon de Lucena. Na sequência percorria os ambientes da boemia pessoense considerados pontos de encontro dos intelectuais, artistas e políticos da terra. Trazia consigo sempre uma pasta preta com os livros que conseguia publicar, patrocinados por amigos, onde os vendia com a oferta de dedicatórias. Nunca abandonava o terno branco, afirmando, inclusive, que apenas ele, o usineiro Renato Ribeiro Coutinho e Virginius da Gama e Melo, se vestiam de forma igual. Falava isso com certo sentimento de orgulho. Num dos retornos para sua residência, que ficava no alto da Ladeira da Borborema, próxima à Catedral, tropeçando nas pernas em razão do seu estado etílico, inspirou-se para produzir uma de suas pérolas literárias: “Ladeira da Borborema/eu subo em tu/mas tu não sobe neu”. ´
Quando Gilberto Gil esteve em João Pessoa para a apresentação do show “Refavela”, em 1977, foi apresentado ao poeta Caixa Dágua, o que motivou o famoso cantor baiano a declarar no palco do Teatro Santa Rosa: “Os homens mais populares do Brasil são Geisel, Caixa Dágua e Gilberto Gil”. A plateia entrou em delírio.
Autor de 15 livros, em depoimento prestado ao Correio das Artes, em 2004, quando o jornal A União lhe dedicou uma homenagem especial, revelou que: “Primeiro, escrevo tudo à mão, depois passo a limpo”. Editou sua primeira obra aos 18 anos. O paraibano Walter Carvalho, no documentário “A Memória e a Cidade”, entrevistou algumas personalidades que considerava importantes expressões locais, dentre elas Caixa Dágua, por considerá-lo o continuador da poesia de Zé Limeira, o poeta do absurdo. Era amigo do então Governador Ernany Sátiro, com quem sempre procurava conversar sobre literatura e política. Exibia vaidoso, em todo lugar, a carteira de colaborador da API – Associação Paraibana de Imprensa.
Na Praça Aristides Lobo, ao lado do prédio do antigo Grupo Tomaz Mindello, foi erigida uma estátua em tamanho natural, esculpida em concreto pelos artistas plásticos Domingos Sávio e Mirabeau Menezes, em que a Prefeitura Municipal de João Pessoa o homenageou, um ano depois do seu falecimento, ocorrido em 27 de março de 2006, vítima de insuficiência respiratória. Não era um erudito, mas se transformou num dos grandes poetas populares da Paraíba, enfrentando as dificuldades da vida com dignidade. Tornou-se, sem qualquer dúvida, símbolo da boemia de uma cidade que começa a fugir da memória coletiva. Não podemos esquecê-lo.
Rui Leitão