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O PERDÃO ( MARCOS SOUTO MAIOR (*)

 

    Nesse mundo de todas as crenças, tem alguns que fazem questão de não pronunciar a palavra Deus! Ateu é nome vindo do grego e traduzido aqueles que preferem dizer “sem Deus”. Já dizem por aí a fora que escrever sobre religião, política e futebol é um calvário que se deixa enraizar sem fim para não chegar a uma conclusão entre adversos, entretanto vou tentar escrever. Tem sido muito mais fácil se dizer ateu, com clássica tendência a ser cético, pela ausência de compromissos solenes e as evidências empíricas, do que respeitar qualquer tipo de divindade. Contudo, quando a miséria bate, não tem nenhum que não pronuncie: “Meu Deus”.

                               Pois bem, o que acho engraçado é que alguns crentes do Pai de Amor andam com uma bíblia sagrada debaixo do sovaco, como se fosse uma identidade pública manifestada a quem possa interessar. Isto, porque a evangelização, necessariamente, não precisa cobrir todos os santos dias e muito menos desfilar nas ruas e praças.   

Carlos, meu colega de infância, e eu, fomos direcionados ao cristianismo, inclusive, por que os colégios particulares sempre adotam uma religião. Os maristas, por exemplo, ainda hoje mantém seus bem equipados colégios com o cristianismo sendo uma matéria importante como as demais, e devo a eles minha iniciação cristã, ainda hoje mantida.

                               Da teoria para a prática, por coincidência, Carlinhos também foi trabalhar no mesmo setor da administração pública, que também labutei por décadas. De temperamento tenso, orgulhoso e agitado era de difícil convivência, pois não tirava os olhos dos poucos cargos comissionados disponíveis, deixando de lado sua crença para brigar mesmo, pela conquista que significa aumento salarial e desejado status social.

                               Certo dia presenciei outro coleguinha de trabalho de nome Sady, abrir divergência pelo mesmo cobiçado cargo e a discussão subiu aos gritos com forte dose de histerismo misturado com argumentos pessoais. Claro que não havia como um dos dois abrir mão da contenda, e a disputa empenou seu final, para a derrota do gordinho Carlos, chegando ao cúmulo de dar um pesado murro na mesa, em sinal de infantil protesto. Com a retirada de todos, fiquei ao lado do amigo e, sem medo, perguntei: Não entendo sua religiosidade. Você quando deseja alguma coisa, não abre nem para o trem! Afinal, ainda exige perdão na sua bíblia? Ele sentiu o peso do que fizera, passou a ficar de cabeça baixa, olhos lacrimejando, e, embaralhando os dedos das mãos, e enchendo os pulmões, franziu a testa para, finalmente, apoiar a mão no ombro amigo. Sentiu-se forte novamente para julgou o verbo perdoar, na primeira pessoa do singular, para abençoar os que lhes fizeram o mal, em algum tempo passado.

                               Não é nada fácil apagar o passado. Ativado pela mente humana é consequente, manter profundas mágoas, dores, sofrimentos e decepções por ter acreditado demais em quem não merecia nem um simples e rápido olhar. Porque a vingança é sempre o elemento complementar do caráter impulsionador inacabado, visto que nada ainda fora dissolvido na memória humana. 

                               A bela lição de Platão ainda hoje é válida para a conversão dos agnósticos: “Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo da escuridão; a real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz”. E vamos acender essa luz de fé e muita paz!

                                                                                  (*) Advogado e desembargador aposentado