Não existe algum momento de felicidade sem que seja em alguma circunstância, que lhe é indispensável, como a luz à visibilidade das cores. Fora disso, recorre-se à força da imaginação. Há doenças que propiciam experiência benéfica: o que se imagina torna-se real, com vida, com cores, mesmo que se esteja na escuridão, porque a irrealidade não precisa de cores… Mas é assim, sentir-se feliz em alguma hora não significa ser permanentemente feliz, por isso ocorrem descontínuos momentos felizes. No entanto, superamos essas transições, quando somos interiormente felizes, quando há felicidade dentro de nós mesmos. Passam os presságios, as interrupções dos momentos felizes, alguns até muito fugazes e os sentimentos de felicidade parecem entrelaçados ao nosso eu e não fora da gente… Enfim, a felicidade propicia esperança…
Ter a disposição de retomar tempos felizes é conditio sine qua non para que eles continuem acontecendo. A primeira coisa será além do paradoxo da espera. Porque quem é feliz ou apenas não tem felicidades, também espera, com eficaz esperança, a felicidade de desejos esperançosos. Não se aguarde com isso não enfrentar os inúmeros obstáculos que acontecerão. Mas vencidos tais obstáculos, transportadas as montanhas, não se acomode para que sua descida seja mais fácil. Poderá haver atropelos, quedas e diferenças de pequenas alturas. A calma e a paciência da felicidade saberão, seguramente, descer qualquer montanha como se estivéssemos subindo, redescobrindo caminhos, batentes na proporção das nossas forças, superando estradas e procuras. Cada passo no seu devido tempo, firme, diligenciando os sentidos para não perdermos a trilha.
Heráclito de Éfeso, no Fragmento 18, admoesta que “Se não se espera, não se encontra o inesperado, pois ele não é encontrável, nem tem caminhos de acesso”. Olhar o tempo que passou e mirar o horizonte do que se prolonga são convites à esperança, e é preciso muito ânimo para a calma saber esperar. O que se espera, com felicidade, agora num Feliz Natal, corresponde a acreditar no que não se tem, no que não se vê ou andar com firmeza no escuro, por tal motivo, a virtude da esperança não se constitui com tempos claros e fáceis.
A rapidez do mundo tecnológico traz a sensação, a cada ano que passa, de que nos iludimos com alguns desejos rapidamente satisfeitos. Dias atrás, na Academia Paraibana de Letras, num jantar de festejo natalino, Roberto Cavalcanti, Milton Marques e eu conversamos sobre os significados da palavra máquina. Lembrei-me até que em italiano ela, com “ch”, se atribui aos nossos carros ou automóveis, como machina em latim; e abordamos que a tecnologia endeusa esses fenômenos artificiais, fabricados pelo homem, porém transferidos a uma dita “inteligência artificial”, como ele criasse um deus ex machina. Máquina que funciona sem sentimento. Essa tecnologia embriaga nosso desejo de tudo se realizar imediatamente. Seríamos capazes de nos libertar dessa civilização da rapidez?
Na rapidez, não sobrevive a esperança, é como se fosse entregar-se a um combate quase terminado. Porém, quando se espera se otimiza a vitória no seu devido tempo. E, ao contrário desses tempos apressados, o desafio não é rapidamente vencer, mas saber esperar. Assim, cria-se um espaço interior para a felicidade, para a confiança na vida, e nesse sentido, um horizonte de esperança, que aos poucos nos dará, nesse ano vindouro, momentos felizes. E quiçá o inesperado aconteça: fim e recomeço de momentos felizes numa vida feliz.
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