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No meu tempo

Marcos Pires

     Cheguei à época em que ninguém poderá dizer, quando eu me for, que morri antes da hora, o que não quer dizer absolutamente que tenho a mínima pressa em reencontrar meus amados pais e queridos amigos que partiram antes do combinado.
No entanto preciso deixar registrado para os mais novos algumas presepadas que meus amigos produziram “no meu tempo”.
Uma cena hilária deu-se quando esses amigos NÃO foram convidados para uma festa de debutante, onde a alta sociedade de João Pessoa se fez presente. Planejaram simplesmente roubar o belíssimo bolo que era o centro das atenções dos convidados. Conseguiram pular o muro dos fundos da casa dos pais da aniversariante e entraram pela cozinha, onde a azafame (consegui, consegui finalmente usar essa palavra) era tanta que passaram absolutamente desapercebidos entre cozinheiros e garçons. E então deram sequência ao mirabolante plano.
Um deles posicionou-se ao lado do bolo enquanto os demais ficaram na porta da frente da mansão e o mais habilidoso dirigiu-se à lateral da casa, em direção à caixa de fusíveis.
Em seguida o sacripanta baixou a chave geral e a casa toda escureceu, o que não era incomum naqueles tempos pré Energisa.
Ato continuo o amigo que estacionara junto ao bolo levantou a enorme bandeja na qual se apoiava aquela maravilhosa criação da mais tradicional confeiteira da cidade e dirigiu-se à porta da frente, onde os outros o esperavam.
Só que…o safado que desligara a chave geral, calculando milimetricamente os passos dados e o tempo gasto pelo ladrão do bolo no seu deslocamento pelo salão principal da casa, religou a chave geral e as luzes acenderam-se. Imaginem leitores queridos a cena que se seguiu. Não vou contar do destino do bolo nem da reação dos convidados e dos donos da casa ao verem no centro do salão um penetra roubando o bolo. Não há espaço aqui para um fato que os “do meu tempo” tão bem recordam. O que importa é uma informação até agora desconhecida.
Muitos anos depois reencontrei o “eletricista” numa daquelas confraternizações das antigas turmas de juventude. Aproveitei a circunstância dele ter tomado algumas doses de rum com coca cola e perguntei por que ele fizera aquilo. Como pudera calcular tão mal a hora de religar a chave geral? Com um sorriso maroto, daqueles que somente ele encantadoramente sabia dar, confessou: “- É que ele estava dando em cima de minha namorada. Mereceu, não mereceu?”.
Como diria Milton Nascimento, eles partiram por outros caminhos. Um dia chegarei lá. Sem pressa.