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Blog do Vavá da Luz

     Minha casa, meu casulo ( Damião Ramos Cavalcanti)

     Minha casa, meu casulo

           Imaginava, quando menino, como era difícil a borboleta suportar seus tempos de casulo. Não compreendia que a borboleta, tão livre, sem compromisso e apego caseiro, beijando todas as flores dos jardins e das verdes matas, submeter-se-ia a viver num casulo. Só deveria ser por necessidade. A Natureza era e é determinante: a borboleta assim aceita para se manter viva. Depois do casulo, estará com saúde para voar, na liberdade de todas as cores, voando, voando a procurar onde quiser pousar. Mais teria do que deveria a borboleta, grande ou “pequenina”, como cantavam as meninas da Lapinha, nas noites de São João, experimentar sua transformação na penosa estreiteza do casulo, até se libertar completamente dele. Embora com capacidade de apenas voar baixo, talvez pensaria ela ganhar os seus céus. Enfim, apertado ou não, o casulo era sua casa, assim como a casa, nessa tempestade de coronavírus, tem sido o nosso casulo, a nossa forçada internação. Muitos dos meus leitores, também através do <www.drc.recantodasletras.com.br>, já foram contemporâneos de internato, já provaram disso,  tenham sido “internos” num seminário, num colégio ou numa escola, entregues pelos pais a um internamento para serem disciplinados e para estudarem com afinco. O clássico e iniciante dessas coisas, em Cajazeiras, foi o Padre Rolim que “ensinou a Paraíba a ler” e que se imortalizou como patrono da cadeira 26 na Academia Paraibana de Letras… Resignando-se a essa “prisão”, a borboleta conquista, com saúde, o tempo de lançar-se aos ares, aos jardins, às matas, à Natureza.
          Os ursos também me impressionavam como um tipo de bicho que se trancafiavam e que ainda hoje se encarceram numa pequena gruta ou numa loca de pedra, sem beber e urinar; sem comer e defecar para economizarem energia e se protegerem do cruel inverno que lhes escasseia alimentação. O Hemisfério Norte nos dá essa lição e aos animais que ali vivem e sobrevivem: o excesso de frio e a escassez do que comer, fora da caverna, levam à hibernação. Nada de verde, nada de vivo, naquela paisagem externa, excessivamente branca, gelada e desabitada. A apertada toca ou pequena gruta é a casa do urso. Agora, nesse momento de “isolamento social”, a nossa casa é a nossa toca, sentimo-nos hibernantes… Perguntaria o então menino: Por que o urso hiberna? Por que a borboleta vive num casulo? Responderiam ela e ele: É por necessidade. Por isso, também obedeço à necessidade: fico num quarto como num casulo, ou na casa como numa tasca. 
 
Damião Ramos Cavalcanti