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         Foi-se São João, também São Pedro (Damião Ramos Cavalcanti)

 

           Não era como se fosse um dia após o outro, tal qual o aparecimento da Lua, que antecede, pontualmente, todos os dias, o nascer do Sol, quando uma festa acontecia, a outra demorava a chegar. Tais fenômenos naturais, extremamente necessários, ininterruptos, livres de qualquer epidemia e sem os quais a vida não subsistiria, continuam, a olho nu, os mesmos. Mas, há uma pressa das coisas, das pessoas que aproximam factualmente uma comemoração da outra, como as aqui citadas estivessem numa mesma fogueira, num mesmo rojão… Há coisas que não merecem ser adjetivadas de “necessárias”, podem existir ou não; necessário é o “ar” que vem nos sendo impedido pelo coronavírus, especialmente àqueles que o procuram fora do isolamento, no frufru do mercado, no ruge-ruge dos coletivos, nas conversas de pé de ouvido dos bares, noutras coisas mais…  Atualmente, além de ficar mais em casa, seria necessário o remédio para combater o agressivo pandemônico vírus, gerando imaginárias cidades infernais, mas a vacina não chega ainda na quantidade que se precisa. Então, as festas continuam virtualmente, diferentes de outros tempos, ficamos em casa e separados, e ainda com muita precaução, quem não a teve hospitalizou-se, sem festa e com azafamado sufoco, conquistando espaço nos hospitais superlotados.
          As coisas da cultura são motivadas por alguma necessidade e, de certa forma, bem relativas aos fatores físicos, biológicos e sociais, tudo obedecendo a esse relativismo cultural. Essas coisas mudam no decorrer do tempo, transformam-se sobretudo quando necessariamente precisam de adequações, deixando as velhas roupas para a História da Cultura, ao relato das antigas tradições. Já como objeto de estudo, sabemos dos costumes e das tradições em conversas com os avós, em crônicas como esta. Este foi o assunto, quarta-feira, nos Diálogos Culturais, da Secult, através da qual o Governo do Estado colhe sugestões das trabalhadoras e dos trabalhadores da Cultura, sobre Cultura popular e tradicional, para elaborarmos os Editais à II Fase da Lei Aldir Blanc, no exercício de 2021. Mas é sobretudo no interior, onde ainda acontecem essas tradições, quando elas são mais valorizadas e preservadas. Peço que se lembrem do interior, nos tempos de infância, como eu, de Pilar, onde nasci e vivi meus primeiros sete anos de vida; depois em Itabaiana, quando vivenciei mais esses festejos juninos, iniciando com a festa de Santo Antônio. Em seguida, lá vinha São João para, depois, terminar com a de São Pedro. Sendo essas duas últimas as principais e de igual alegria. As festas demoravam a acontecer…
          Tais lembranças apontam amores antigos, muitas vezes, Cupido à primeira vista, mas já na iminência de sucumbirem a um violento amor, ao arrojo da paixão, como se estivessem suas almas mais quentes do que o corpo, que, como um vaso para transbordar, esperasse apenas aquela gota d´água. Tenho comparado o tempo a um trem, em contínuo movimento. E nós, nas janelas, vendo a paisagem escapar das nossas vistas, sobretudo por causa da velocidade do trem, ou seja do tempo. O São João se foi, São Pedro também. Mas, voltarão noutras paisagens, depois de outras estações, quando não estarão tão perturbadas por alguma pandemia. Parafraseando, mas também contrariando Camões que adverte com seu “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, mesmo que o trem tempo caminhe tão rápido, os festejos juninos, sobrevivendo à pandemia, são desejos que nunca mudarão.
Damião Ramos Cavalcanti