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A Serra da Barriguda ( Thomas Bruno Oliveira)

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Serra da Barriguda, limite entre PB e PE

Em uma das muitas viagens que já fiz ao interior da Parahyba, me embrenhei em terras inóspitas dos Cariris Velhos, um território mágico e afetivo que (co)move gente por séculos, um Mundo-Sertão que exige do homem um trato todo especial para a vida nesse lugar. “Ver-se-á que o nosso meio não é imprestável, como se afigura, à primeira vista, a esses juízos falhos de observação direta. É, ao contrário, suscetível de um aproveitamento compensador do quinhão de sacrifícios…” já afirmava o nosso escritor e político José Américo de Almeida em seu ‘A Paraíba e seus problemas’ escrito no longínquo ano de 1927, obra, inclusive, atualíssima.

 

Nessas andanças – há uns dez anos – cheguei ao sossegado município de Caraúbas, no vale do Alto Parahyba, Cariri do estado. Fui a convite para conhecer um painel de inscrições rupestres que foi informado por uma historiadora daquele município, um dos muitos sítios arqueológicos que temos em nosso território, testemunhas incontestes da intensa vida de populações pretéritas por essas terras. Segundo as informações, são letreiros de sangue em uma loca de pedra, informação que condiz com as características que vemos na região, pintura, abrigo e na cor vermelha.

 

Arredores da igreja de São Pedro

 

Caraúbas é uma singela cidadezinha, distante aproximadamente 110 km de Campina Grande-PB, cujo percurso é asfaltado apenas até a cidade de Cabaceiras, dali em diante, por 55 km, toda a estrada é de ‘chão batido’. Fator que torna esta pequena cidade dificilmente acessível e, consequentemente, o isolamento proporciona àquela população as condições necessárias para que se mantenham intocados diversos de seus aspectos culturais, majestosamente espontâneos daquele recôndito Cariri. Nem sei se nas últimas obras do governo do estado, essa via foi asfaltada, como foram várias outras. Está na hora de voltar a andar por ali para conferir!

 

Logo que chegamos à Caraúbas fomos recebidos pela jovem estudante de história Leonor Costa, que providenciou um guia totalmente experimentado na caatinga para podermos seguir até o sítio arqueológico. Sem delongas, seguimos por um percurso de 26 km, numa estrada vicinal em péssimas condições de uso, em direção à fronteira com o estado de Pernambuco. No caminho, o guia (Sr. José Giliard de Oliveira ou simplesmente Dida), entusiasmado e muito orgulhoso de sua terra natal, ia comentando sobre a paisagística, dando nome às serras, riachos, córregos, sítios e representantes da flora daquela desafiadora caatinga caririzeira. Por um momento, vi em Seu Dida o perfil de um indígena vivendo naquela majestosa natureza com todas suas peculiaridades. De fato, era um catedrático no assunto, muito comunicativo e dotado daquela hospitaleira felicidade tão característica de nosso Mundo-Sertão.

 
 

Depois de quase uma hora entre os solavancos causados pelos obstáculos da precária estrada, dominou no nosso horizonte sul uma imponente elevação montanhosa, em tom roxo/azulado, que já servia de marco divisor entre a Paraíba e Pernambuco. Era o destino de nossa expedição: A serra da Barriguda.

 

Paramos em uma pitoresca e próspera fazenda de caprinocultura que, oportuna, se refrescava na sombra projetada pela gigante montanha. O GPS acusava 570m de altitude e confirmava a situação fronteiriça daquele lugar esmo de limite entre os Cariris Velhos e o Vale do Ipojuca.

 

Pinturas rupestres em vermelho e amarelo

 

Deixamos o carro e seguimos a pé, cruzando currais que exalavam cheiro de estrume molhado e ração animal, seguimos por uma capoeira repleta de pequenas abelhas vagantes indecisas por entre a rala vegetação florida, até chegarmos a uma grande pedra que escondia sua imponência na vegetação, se arqueando em aba para proporcionar abrigo às inúmeras pinturas rupestres que decoravam toda sua extensão, como que a natureza quisesse proteger por suas asas aquelas intrigantes inscrições pretéritas.

 
 

Em muda contemplação, imaginávamos que possíveis propósitos teriam movido os homens pré-históricos para realizar aquelas pinturas e que significados se ocultavam naquela simbologia primitiva. Nada podíamos dizer de concreto e, assim, nos detivemos na única possibilidade que nos era permitida: registrar para a posteridade.

 

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Publicado na coluna ‘Crônica em destaque’ no Jornal A União de 13 de novembro de 2021.