O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes diz que é inconstitucional uma força-tarefa na qual o juiz se alia a procuradores e policiais federais a fim de investigar. Segundo ele, é correta somente uma parceria que envolva Ministério Público e Polícia Federal.
Mendes considera “um argumento sério” a acusação de inconstitucionalidade de uma força-tarefa quando há “consórcio” do magistrado com procuradores e policiais.
“Aí, sim, o cidadão passa a ser realmente não só ameaçado, mas passa a ter os seus direitos violados. (…) Já há algumas denúncias sobre esse tipo de prática no Brasil. Isso é preocupante, porque o juiz não é instrumento da acusação. Ele deve ser o órgão imparcial que inclusive controle eventuais abusos cometidos pelos investigadores na denúncia e tudo mais”, afirma.
Indagado se o juiz federal Sérgio Moro atuaria de modo inconstitucional, como alega a defesa do ex-presidente Lula, Mendes responde: “Não vejo isso necessariamente. Tinha que ser demonstrado no caso, eventualmente. Mas se trata de um juiz que está dedicado ao tema por conta da competência que lhe foi reconhecida em função da lavagem de dinheiro verificada nesses casos que estavam sendo investigados a partir da competência da vara de Curitiba. Agora, é preciso sempre se ter em mente que, aqui ou acolá, podem acontecer distorções e abusos, e isso tem que ser examinado e tem que ser submetido aos tribunais”.
O ministro considera que os investigadores “não devem ter um papel de indução” nas delações premiadas. Questionado sobre eventuais delações seletivas, com contenção de danos, como é aventado em relação a colaborações já prestadas por executivos da Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, ele diz: “Nós temos que aguardar essas informações. É possível que tenha, aqui ou acolá, essa contenção de danos. A delação não se faz “ex proprio”. O próprio delator, aquele que decide colaborar, na verdade a expressão hoje é de colaboração, ele é orientado por advogados e, certamente, faz determinados cálculos e considerações. Evidentemente que leva em conta também aquilo que os investigadores já sabem”.
A respeito da iniciativa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de criar uma comissão para estabelecer regras que evitem supersalários, Mendes afirma: “Quando eu vejo juiz estadual dizendo que se está discutindo salários por conta de combate à Lava Jato, eu já vejo que é uma mistificação, porque juiz estadual não tem nada a ver com a Lava Jato. Portanto, estão aí 18 mil combatentes contra a corrupção. (…) Esse é um debate que deveria ser até dispensável, porque, a rigor, todos sabem qual é o teto. (…) Veja esse argumento canhestro de dizer que quem quer questionar salário de juiz está a favor da corrupção. Veja que não tem relação de causa e efeito, é mistificação”.
Gilmar Mendes, que também preside o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), afirma que, se o crime de caixa 2 for tipificado, haverá anistia automática. “Se vier a criminalização, a tipificação nova em relação ao caixa 2, não haverá o que fazer em relação ao passado.”
Mas ele faz uma ressalva. Diz que seria perdoada prática de caixa 2 distinta de propina. “Agora, podem ter ocorrido, sim, casos de caixa 2 que eram propina, que eram corrupção, que tinham outros propósitos. É preciso saber se, de fato, se cuidava disso [propina] ou se se cuidava de mera doação. E nós sabemos que, ao longo dos anos, nós tivemos esse tipo de prática. Até por razões circunstanciais: não ser perseguido, não ser identificado. Nenhuma outra irregularidade a não ser desse tipo. Então, isso terá de ser olhado com cuidado.”
Mendes defende que magistrados e procuradores respondam a crimes de responsabilidade. “Há que se aceitar a responsabilização. Não há nenhuma dúvida. A definição de Estado de Direito é a de que não há soberanos, ninguém deve estar ou se imaginar acima da lei. Nesse sentido, não me parece devido que procuradores ou juízes tentem dizer que eles não têm de ter responsabilidade.”
Ele apoia a votação de um projeto para atualizar a lei de abuso de autoridade. “Eu estou absolutamente convencido de que é preciso haver a tipificação do abuso de autoridade. A última lei que temos consolidando esses tipos de abuso de autoridade é de 1965, um projeto de autoria de Milton Campos. Portanto, nós estamos defasados no tempo.”
Mendes afirma que “contribui para esclarecer” a nova versão apresentada ao TSE pelo ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Azevedo sobre uma contribuição de R$ 1 milhão dada à campanha presidencial de Dilma em 2014 e repassada ao comitê do então vice da petista, o peemedebista Michel Temer. Antes, Azevedo disse que se tratava de propina. Agora, afirmou que a doação fora regular.
Segundo Mendes, “é inevitável” que o julgamento da eventual cassação da chapa Dilma-Temer fique para 2017. “A pergunta que fica e que está submetida ao tribunal é se os atos imputáveis na campanha presidencial, à presidente Dilma, são também imputáveis ao vice Michel Temer, que agora é presidente. Essa é a pergunta que nós vamos ter que nos fazer e responder”.
Perguntado se considerava possível a separação da prestação de contas de candidatos a presidente e a vice, ele diz: “Em tese, isso pode ocorrer. O tribunal terá que fazer uma avaliação. Como também pode deixar o processo prosseguir e rejeitá-lo, entender que é improcedente. Vamos ter de fazer essa análise e é claro que com grande responsabilidade institucional, tendo em vista as consequências”.
Ele avalia que a regra de financiamento eleitoral que se aplicou nas disputas municipais não seria adequada para pleitos mais amplos. Em 2018, haverá eleições para a Presidência, governos estaduais, Senado, Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativa e Câmara Legislativa do Distrito Federal. “Eu não sei se esse modelo é replicável para as eleições nacionais. Essa é uma pergunta que eu tenho feito e muitos políticos têm respondido que não.” Ele defende que estabeleça limites mais baixos para eventual volta do financiamento empresarial. Também quer fixar limite para que pessoas físicas possam contribuir para suas próprias campanhas. “É claro que foi uma solução que o Congresso encontrou nesse modelo da chamada autodoação para garantir o financiamento, mas é claro que isso facilita enormemente a vida daqueles que dispõem de recursos. Evidentemente, isso gera uma injustiça e uma desigualdade.”
A seguir, a íntegra em vídeo e texto da entrevista de Mendes, concedida no final da manhã de sexta, em São Paulo:
Kennedy Alencar: Ministro, vamos começar falando das eleições municipais. Na comparação com 2012, os candidatos arrecadaram 67% a menos. Houve um barateamento das campanhas. Foi a primeira vez em que se aplicou a regra que proibiu o financiamento empresarial. Que balanço o sr. faz? É uma regra boa, que deve ficar como está, ou o sr. acha que haverá mudança nessa legislação?
Gilmar Mendes: Eu acho que esse aspecto da decisão do Supremo e do Congresso foi positivo, quanto ao barateamento da campanha. Não só por conta desse modelo novo de financiamento, só de pessoas físicas ou naturais, como também o encurtamento do prazo e a redução do artificialismo da campanha na TV. Eu não sei se esse modelo é replicável para as eleições nacionais. Essa é uma pergunta que eu tenho feito e muitos políticos têm respondido que não. E aí vem todo esse debate sobre reforma do sistema eleitoral, se vamos caminhar para um voto em lista, se vamos caminhar para um modelo distrital misto. Em suma, dependendo do modelo eleitoral, nós temos que fazer um ajuste no financiamento. Vem também o debate sobre financiamento público, que é um fundo enorme e, de fato, tem-se que ter muito cuidado com isso, especialmente em uma fase tão difícil. Ou se podemos voltar até a discutir o financiamento de corporações, com limites.
KA: Com um limite muito mais baixo, não é?
GM: Muito mais baixo. O que aconteceu de negativo nesse período, e aí temos muitas distorções, tem a ver com a falta de limites. Teve empresas que doaram R$ 200 milhões ou mais.
KA: Na regra atual, o candidato que é rico pode doar muito dinheiro. Tem que baixar essa limitação também, esse ajuste tem de ser feito?
GM: Acho que tem de ser feito. É claro que foi uma solução que o Congresso encontrou nesse modelo da chamada autodoação para garantir o financiamento, mas é claro que isso facilita enormemente a vida daqueles que dispõem de recursos. Evidentemente, isso gera uma injustiça e uma desigualdade.
KA: Ministro, no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, que o sr. preside, um assunto importante é essa ação do PSDB que pede a anulação da chapa Dilma-Temer. Já há um exame de uma eventual separação das contas do candidato a presidente e do candidato a vice, e teve, recentemente, um depoimento de Otávio Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, dizendo que uma doação específica de R$ 1 milhão, que ele havia considerado antes que era fruto de propina, teria sido uma doação regular. O PT, na argumentação, atribuiu esse dinheiro à campanha do vice. Que impacto tem esse depoimento de Azevedo? Ele diminui o risco em relação à uma possível condenação do atual presidente Michel Temer por conta da época em que ele era vice?
GM: Não vejo esse episódio como marcante, a questão tem de ser analisada no seu conjunto. Na verdade, se elege presidente e vice e a campanha é única. Portanto, essa separação inicial não se dá. O debate que vai se travar certamente no tribunal, primeiro, é se houve abuso. E, tendo havido abuso, diante da cassação da presidente, da cassação do mandato, nós vamos ter de responder à questão se essa ação deve prosseguir em relação ao seu vice. Porque é claro que ele foi eleito em conjunto. A pergunta que fica e que está submetida ao tribunal é se os atos imputáveis na campanha presidencial, à presidente Dilma, são também imputáveis ao vice Michel Temer, que agora é presidente. Essa é a pergunta que nós vamos ter que nos fazer e responder.
KA: O sr. acha que é possível separar?
GM: Em tese, isso pode ocorrer. O tribunal terá que fazer uma avaliação. Como também pode deixar o processo prosseguir e rejeitá-lo, entender que é improcedente. Vamos ter de fazer essa análise e é claro que com grande responsabilidade institucional, tendo em vista as consequências.
KA: A tendência é o julgamento final ficar para o ano que vem?
GM: Acho que é inevitável, diante das provas que ainda estão se fazendo. Nós já estamos adiantados em novembro e vamos trabalhar e ter sessão até o dia 15 ou 16 de dezembro. Logo, retomamos em fevereiro. Não temos condições, praticamente, de votar neste ano.
KA: No caso de haver uma condenação, a regra é que até dois anos se faz uma eleição direta e depois de dois anos o Congresso teria que realizar uma eleição indireta. Nessa sequência de crises, não seria indesejável para o país se submeter a um processo dessa natureza?
GM: Isso terá de ser examinado com muito cuidado, nós temos que ter uma enorme responsabilidade institucional. E o TSE tem tido, ao longo de todos esses anos, tem se revelado um tribunal sensível a esse tipo de demanda. É a primeira vez que o tribunal aceita uma ação contra um presidente da República. É um caso raro, em função da gravidade das acusações, e por isso também, consumiu um ano discutindo a admissibilidade da ação. É uma decisão, portanto, importante. Agora, independentemente do resultado, acho que o que é importante aqui é que se está fazendo um grande inventário de como se fez uma campanha presidencial. Para efeitos históricos, independentemente do que se venha a decidir, o tribunal certamente dará uma grande contribuição. Inclusive, talvez, indicando o que não se deve fazer no futuro.
KA: Jurisprudência. Voltando um pouquinho ao ponto do depoimento do Otávio Azevedo, o sr. acha que ele diminui o risco de uma decisão contrária ao mandato do presidente Temer?
GM: Certamente, ele contribui para esclarecer determinado tipo de situação. Mas, como eu disse, qualquer imputação desse tipo não tem grande relevância, evidente que retira um indício, porque a campanha se fez em conjunto. É claro que não é só esse fato, isoladamente, que terá que ser analisado com cuidado. E, evidentemente, a captação que se deu para a presidente eventualmente subsidiou a campanha do vice. É natural no processo, com a divisão do trabalho que eles fazem na campanha.
KA: Nessa questão das delações premiadas, há agora uma expectativa de homologação das delações da Odebrecht. Diante disso, os investigadores afirmam que talvez seja necessário reabrir e rever colaborações já feitas pela Andrade Gutierrez e pela Camargo Corrêa, porque teria havido ali, usando um eufemismo, muita contenção de dano. É procedente essa crítica de que as delações estão permitindo investigações seletivas e punições seletivas?
GM: Nós temos que aguardar, talvez, essas informações. É possível que tenha, aqui ou acolá, essa contenção de danos. A delação não se faz “ex proprio”. O próprio delator, aquele que decide colaborar, na verdade a expressão hoje é de colaboração, ele é orientado por advogados e, certamente, faz determinados cálculos e considerações. Evidentemente que leva em conta também aquilo que os investigadores já sabem.
KA: Exige muita responsabilidade dos investigadores, não é?
GM: Exatamente, exige muita responsabilidade dos investigadores, que não devem ter um papel de indução. Isso precisa ser colocado com muita clareza. Há muita reclamação, muitas vezes, de que investigadores estão a tentar induzir chamando nomes e coisas do tipo. Mas é possível também, nós já vimos em alguns casos, que haja imprecisão e que possa comprometer inclusive o benefício que foi negociado. E é possível que venham a ocorrer, nesse caso, novos depoimentos.
KA: O presidente do Senado, Renan Calheiros, marcou para 6 de dezembro a votação daquele projeto que tipifica abuso de autoridade. Uma parcela significativa do Ministério Público é contra. Juízes e algumas entidades também são contra. Eu queria ouvir a opinião do sr., se acha que é necessário haver alguma tipificação de abuso de autoridade.
GM: Eu estou absolutamente convencido de que é preciso haver a tipificação do abuso de autoridade. A última lei que temos consolidando esses tipos de abuso de autoridade é de 1965, um projeto de autoria de Milton Campos. Portanto, nós estamos defasados no tempo. Hoje, aumentamos muito a participação da autoridade na vida do cidadão e é preciso haver elementos de contenção e de responsabilização. De modo que eu estou absolutamente convencido. E não só isso, enquanto estava na presidência do Supremo, contribuí para a feitura desse projeto junto com o ministro Teori, com Everardo Maciel, pessoas com mentes abertas, com grande responsabilidade, para que de fato houvesse uma resposta, não só com relação a juízes e promotores, mas ao guarda da esquina, o auditor fiscal, o deputado na CPI. Em suma, todos nós que, de alguma forma, exercemos autoridade e podemos tender a abusos. Estou absolutamente convencido. E não acho que isso seja feito contra a Lava Jato ou contra investigações. Até me surpreende esse tipo de alegação, porque parece que essas pessoas arrogam-se o direito de cometer abusos, dizendo: “Ah, não é oportuno neste momento porque nós estamos investigando”. Parece que é oportuno exatamente porque se está fazendo investigação.
KA: E quem está fazendo a coisa certa não deve temer.
GM: Claro. Acredito que não haja, portanto, a necessidade de se colocar essa dúvida.
KA: Na segunda-feira, o procurador Deltan Dallagnol, que é o coordenador do Ministério Público na força-tarefa da Lava Jato, esteve com Onyx Lorenzoni, deputado federal do DEM-RS, e pediu que fosse retirada do relatório dele a possibilidade de que juízes, promotores e procuradores pudessem responder a eventuais crimes de responsabilidade. Não é uma atitude corporativa e até reprovável e que parece um pouco com essa resistência que existe com relação ao abuso de autoridade?
GM: Eu não conheço esse projeto, vi apenas a celeuma em torno dele. Até porque ele não estava nas chamadas “dez medidas” e constou do relatório do deputado Lorenzoni. Também não sei se seria viável do ponto de vista constitucional se não viesse em uma emenda, uma vez que o crime de responsabilidade, tal como nós o conhecemos, está definido em relação aos magistrados do Supremo Tribunal Federal. Tem previsão constitucional, mas em relação aos juízes em geral, isso não estaria previsto. Me parece, todavia, que há que se aceitar a responsabilização. Não há nenhuma dúvida. A definição de Estado de Direito é a de que não há soberanos, ninguém deve estar ou se imaginar acima da lei. Nesse sentido, não me parece devido que procuradores ou juízes tentem dizer que eles não têm de ter responsabilidade. Poder envolve responsabilidade por definição. Me parece que esse debate tem de ser feito com a devida abertura.
KA: Quanto ao chamado foro privilegiado, que é a prerrogativa de foro, qual é a opinião do sr? Ele deve ser extinto? Deve continuar como está porque, apesar dos problemas, ele funciona? O sr. mesmo disse, como exemplo, que o caso do julgamento do mensalão foi célere, mas foi um julgamento que andou rápido até para os padrões do Supremo. Ou deve-se criar uma vara federal anexada ao Supremo para tratar disso?
GM: Para temas difíceis e complexos, a gente tem, em geral, uma resposta ou solução simples e, normalmente, errada. A supressão do foro, a meu ver, seria uma precipitação. Hoje, se reclama dos abusos cometidos na primeira instância. Eu fico a imaginar um juiz do Supremo, que foi presidente do CNJ, a corregedora Eliana Calmon, respondendo perante um juiz de primeiro grau, com o atiçamento de ânimos e tudo mais. Me parece que isso pode ser um problema. A manipulação política, muitas vezes, é suscetível.
KA: Pode ter tanto perseguição quanto proteção política.
GM: Exatamente, isso pode ocorrer. Agora, o modelo, como ele está, se tornou impraticável. Porque isso foi pensado para soluções tópicas. Acusação de um ou outro parlamentar, de um ou outro deputado ou senador, de um ou outro membro do Tribunal de Contas, em suma. Mas, quando nós temos quase a metade do Congresso investigada, é uma avalanche. O tribunal não tem condições de dar sequência nisso de uma maneira normal. Então, nós temos que pensar em uma outra fórmula. Mas eu não acredito que sequer seja viável aprovar-se uma Emenda Constitucional no Congresso que vá resolver esse problema passando de imediato para os juízes de primeiro grau. Porque os políticos têm essa experiência nos seus próprios Estados, reclamam muitas vezes da Justiça Eleitoral e tudo mais. Também não é verdade que funciona bem a Justiça de primeiro grau e funciona mal o Supremo. Na verdade, a justiça criminal no Brasil tem um deficit. Nós levamos dez anos, pelo menos, para colocar alguém no júri. Alguém que matou, confessadamente. Demora muito. No caso do mensalão, a que você se referiu, o mensalão andou no Supremo, mas não andou lá embaixo. Esses dias, um jornal especulava sobre prescrição no Supremo. Vamos fazer a análise sobre prescrição nos tribunais de primeiro grau. Vamos ter algo semelhante. Como presidente do CNJ, eu encontrei, em Jaboatão dos Guararapes, inúmeros casos de processos para prescrever. Crimes de júri, homicídio ou tentativa de homicídio doloso. Nós temos um grave problema. Se alguém quiser pensar em segurança pública no Brasil de maneira séria, tem que começar com um projeto sério na justiça criminal como um todo.
KA: Qual é a solução para andar mais rápido?
GM: Dar atenção a isso e ver o que é possível fazer, olhar toda essa cadeia desde a investigação inicial. Nós temos crimes que ocorrem e não são notificados. Quando são notificados, não se abre sequer inquérito. Quando se abre inquérito, não se transforma em denúncia. Quando se tem denúncia, muitas vezes não se julga. Em suma, temos uma cadeia que leva à impunidade. Todo mundo pensa em segurança pública e pensa em polícia, em aparato policial. Na verdade, precisa pensar na modernização da justiça criminal.
KA: Não se trata de um problema do Supremo ou da primeira instância, é do sistema como um todo?
GM: É do sistema como um todo. E aí, creio que seria muito positiva a contribuição do CNJ, do CNMP, do Ministério da Justiça, das Secretarias de Justiça dos Estados, um trabalho integrado que nós, na nossa época no Conselho Nacional de Justiça, chamamos de uma estratégia nacional de segurança pública.
KA: Alguns advogados de defesa de acusados nesses casos mais rumorosos e o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, dizem que a criação de forças-tarefa seria inconstitucional. Há um argumento de que Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal têm também o papel de fiscalizar o trabalho um do outro, num sistema de freios e contrapesos. Na medida em que os três se unem e passam a trabalhar juntos, o juiz passa a fazer também papel de acusador, as coisas se confundem. Esse argumento de inconstitucionalidade da força-tarefa lhe parece forte ou o sr. acha que não?
GM: É um argumento sério, sobretudo quando há esse consórcio. Não em relação ao Ministério Público e Polícia Federal, que muitas vezes agem em conjunto. É uma tarefa de investigar e, eventualmente, denunciar. Nós mesmos, no STF, reconhecemos que o Ministério Público pode até, subsidiariamente, proceder à investigação. Agora, realmente, essa combinação com ação judicial, já há algumas denúncias sobre esse tipo de prática no Brasil. Isso é preocupante, porque o juiz não é instrumento da acusação. Ele deve ser o órgão imparcial que inclusive controle eventuais abusos cometidos pelos investigadores na denúncia e tudo mais. Me parece que, nesse caso, se tem que pensar com muito cuidado. Mas a força-tarefa, o eventual consórcio ou a colaboração entre o Ministério Público e a Polícia Federal às vezes é até imperativa.
KA: O problema é o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal?
GM: Isso. Aí, sim, o cidadão passa a ser realmente não só ameaçado, mas passa a ter os seus direitos violados.
KA: Isso é inconstitucional?
GM: Com certeza.
KA: Indo para um caso concreto, a defesa do ex-presidente Lula diz que o juiz Sérgio Moro exerce esse papel na Lava Jato. Ele está agindo de uma maneira inconstitucional no entender do sr?
GM: Não vejo isso necessariamente. Tinha que ser demonstrado no caso, eventualmente. Mas se trata de um juiz que está dedicado ao tema por conta da competência que lhe foi reconhecida em função da lavagem de dinheiro verificada nesses casos que estavam sendo investigados a partir da competência da vara de Curitiba. Agora, é preciso sempre se ter em mente que, aqui ou acolá, podem acontecer distorções e abusos, e isso tem que ser examinado e tem que ser submetido aos tribunais. Em geral, esses casos têm passado pelo Tribunal Regional Federal, têm passado pelo STJ e têm chegado ao Supremo Tribunal Federal. A minha turma, a Segunda Turma, inclusive tem examinado casos. Em alguns casos, inclusive, já concedeu habeas corpus. Eu acho, até, tenho dito, que o nosso escrutínio tem que ser cada vez mais rigoroso em relação a esse tipo de matéria.
KA: Na última quarta-feira, o sr. e o ministro Ricardo Lewandowski tiveram uma discussão áspera numa sessão do Supremo. Lewandowski, depois, suavizou um pouco dizendo que foi mais uma troca de ideias, mas o fato é que discutiram e ele falou que o sr. quebra o decoro, o acusou de comentar muito as decisões dos colegas, de falar bastante com a imprensa. Inclusive está dando esta entrevista, o sr. é um dos ministros que mais atende à imprensa. Como o sr. rebate essa crítica?
GM: Na verdade, todos nós falamos à imprensa e eu acho até bom que se fale. Eu entendo que devo falar por conta da minha responsabilidade institucional. Como presidente do STF, muitas vezes eu falava até para orientar a magistratura, cumprir o meu papel de liderança da magistratura, e, às vezes, me contrapor a excessos que eu notava que havia com relação ao Judiciário por parte de outros Poderes. Como presidente do TSE, estou obrigado também a fazê-lo. E, é claro, como cidadão, eu posso opinar sobre temas que são relevantes. Eu critico decisões nossas e até faço autocrítica a decisões que nós tomamos, como, por exemplo, aquele caso que você conhece da cláusula de desempenho ou cláusula de barreira. Eu participei daquela decisão.
KA: Foi em 2006, não é?
GM: Exatamente, em 2006/2007, que derrubamos aquela cláusula e contribuímos para uma parte dessa fragmentação que está aí. Hoje, olhando essa decisão, eu digo que nós erramos. Então, me parece que isso é devido. Não comento decisões que estão para ser tomadas. Agora, é claro também, eu sou um doutrinador. Muitas das minhas opiniões estão registradas.
KA: O sr. não foge ao debate.
GM: Não fujo, como demonstrei naquela sessão. Costumo dizer, aquela crítica que eu fiz ao ministro Lewandowski, eu já havia feito publicamente.
KA: Especificamente em relação ao fatiamento da decisão de julgar o impeachment da presidente no Senado. O sr. falou que foi uma atuação heteredoxa. O sr. enxergou ali uma ação deliberada do Lewandowski e do Renan para proteger a então presidente Dilma?
GM: Não tenho dados. O que vocês publicaram não é exatamente, vamos falar assim, dignificante. Porque se fala numa negociação inclusive envolvendo salário de juiz. Isso deve ser, inclusive, negado. Porque, de fato, se houve ou se se pensou nessa negociação, foi algo indevido. Mas, de qualquer forma, não ficou bem para o sistema. Tanto é que nós víamos que aquilo era um artificialismo. De fato, se fez uma interpretação heterodoxa do texto constitucional.
KA: É uma punição muito grave, ela perde o mandato, mas, ao mesmo tempo, ela mantém os direitos políticos. Fica muito desequilibrado, parece que foi exagerada a perda do mandato, não?
GM: E com um argumento, vamos dizer assim, um tanto quanto juvenil. Dizer que ela podia ser presidente da República e em seguida não poderia ser cozinheira. Bom, essa é uma condição que o texto constitucional estabeleceu e que não permitiu fazer esse tipo de partição. Se ela tivesse sido antes cozinheira, talvez não tivesse sido presidente da República e nós não teríamos passado pelo impeachment.
KA: O ministro Teori Zavascki, que é o relator da Lava Jato no âmbito do Supremo, reprovou a divulgação daquele telefonema da presidente Dilma para o ex-presidente Lula que foi divulgado no mesmo dia em que foi gravado. Ele viu ali finalidade constitucional legítima questionável, porque não foi submetida a um contraditório mínimo. Teori também criticou a denúncia que o procurador Deltan Dallagnol fez em relação ao ex-presidente Lula, chamando de espetáculo midiático. O ministro Teori Zavascki tem razão nesses dois casos?
GM: A questão da divulgação do telefonema, a meu ver, foi um ato consciente do juiz fazendo um sopesamento. Ele entendeu que, tendo em vista a gravidade, entendeu que havia ali um conluio, então, ele decidiu fazê-lo.
KA: Mas não é uma interferência no processo político?
GM: Exatamente. Essa questão ainda não foi discutida no âmbito da turma, mas o ministro Teori considerou que isso era impróprio. Além do que, em relação à própria presidente Dilma, ele entendeu que a gravação já tinha extrapolado o tempo em que ela tinha sido autorizada. Portanto, considerou também esse aspecto indevido. A meu ver, pode ser que ele tenha razão e é preciso ter cuidado com esse tipo de coisa. A própria legislação exige o sigilo em relação a isso. Também quanto à espetacularização a gente tem que ter muito cuidado. Não só esses episódios de apresentação ao público em geral, como também esses vazamentos seletivos e tudo mais.
KA: Evitar julgamentos sumários, não é?
GM: Exatamente. E isso ocorre, infelizmente. É muito difícil para vocês, da mídia, censurar esse tipo de atitude por parte, por exemplo, de delegados ou de membros do Ministério Público porque, claro, vocês são beneficiários. É notícia etc. Eu até brinquei, num momento, que a mídia estava como um adicto que depende do fornecimento da droga. E isso dá um empoderamento enorme ao Ministério Público. Eu até já censurei a própria Procuradoria Geral, num caso determinado, porque a questão chegou antes ao Jornal Nacional do que ao meu gabinete. A petição do procurador-geral estava no Jornal Nacional mas não estava ainda no meu gabinete, tanto é que eu agradeci a colaboração do Jornal Nacional nesse caso. É algo indevido.
KA: Ministro, tem uma discussão em Brasília sobre a tipificação do crime de caixa 2 e muitos no Congresso defendem que, uma vez tipificado, haveria uma anistia no Congresso para o passado. Ainda que os investigadores da Lava Jato, por exemplo, quisessem fazer denúncias levando em conta que esse caixa 2 do passado possa ser enquadrado em corrupção ativa de quem pagou, passiva de quem recebeu, lavagem de dinheiro ou tráfico de influência. O sr. vê a possibilidade de anistia para o caixa 2 se for tipificado crime?
GM: Na verdade, a gente tem que observar isso com muito cuidado. No âmbito da Justiça Eleitoral, nós temos duas abordagens em relação a esse tema. Alguns consideravam que seria o crime do caixa 2 puro e simples, o fato de entregar dinheiro, sem nenhuma conotação de corrupção. Isso seria um caso de um crime eleitoral, omitir uma declaração que seria devida. É o artigo 350 do código eleitoral. Acho que hoje, a maioria do tribunal entende que isso seria atípico do ponto de vista penal, a não ser que viesse envolvido com corrupção, com outros propósitos. Por isso, também, os procuradores optaram por essa criminalização. Então, a meu ver, se vier a criminalização, a tipificação nova em relação ao caixa 2, não haverá o que fazer em relação ao passado.
KA: Automaticamente, há uma anistia, um perdão?
GM: Exatamente, porque se assume que antes não havia o tipo. A lei não pode retroagir. Agora, podem ter ocorrido, sim, casos de caixa 2 que eram propina, que eram corrupção, que tinham outros propósitos.
KA: Essa tem sido a interpretação majoritária dos investigadores da Lava Jato.
GM: Sim, mas é preciso saber se, de fato, se cuidava disso ou se cuidava de mera doação. E nós sabemos que, ao longo dos anos, nós tivemos esse tipo de prática. Até por razões circunstanciais: não ser perseguido, não ser identificado. Nenhuma outra irregularidade a não ser desse tipo. Então, isso terá de ser olhado com cuidado.
KA: E vai acabar no Supremo, não é?
GM: Certamente vai ser discutido. Agora, a simples tipificação leva a essa situação.
KA: Ministro, discussão sobre os supersalários. Está sendo votada no Congresso Nacional uma regra orçamentária mais rígida, a chamada PEC do Teto, que vai colocar um limite para o crescimento dos gastos públicos. Vai haver uma disputa maior pelos recursos do orçamento que são finitos, eles não são ilimitados. O presidente do Senado, Renan Calheiros, montou uma comissão para fazer um pente-fino nos supersalários. As associações de juízes estão reagindo, dizendo que isso é uma retaliação porque há um combate à corrupção. Mas o que a gente vê ali são casos como desembargadores que ganham até R$ 200 mil. E o teto constitucional é de R$ 33.700, que é o vencimento de um ministro do STF. Qual é a posição do sr. em relação a esse tema?
GM: Eu tenho a impressão de que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Quando eu vejo juiz estadual dizendo que se está discutindo salários por conta de combate à lava jato, eu já vejo que é uma mistificação, porque juiz estadual não tem nada a ver com a Lava Jato. Portanto, estão aí 18 mil combatentes contra a corrupção.
KA: E uma coisa é combater a corrupção e outra coisa, como o sr. disse, é respeitar o teto constitucional.
GM: Exatamente. Esse é um debate que deveria ser até dispensável, porque, a rigor, todos sabem qual é o teto. Eu sei, inclusive, que a ministra Cármen Lúcia recentemente recebeu um grupo de juízes e colocou o seu contracheque na mesa para deixar, de forma insofismável, que ela recebia aquilo que estava no seu holerite. A meu ver, esse debate está desfocado. Acho que nós devemos atender a aquilo que está no texto constitucional e cumprir o teto. O que aconteceu ao longo desses anos é que nós fomos tomados por uma sanha corporativa e inventara-se penduricalhos os mais diversos, as formas mais criativas. O brasileiro é muito criativo. E foram pendurando.
KA: E a solução é uma súmula vinculante do Supremo dizendo, sobre esses penduricalhos, que ninguém pode receber acima do teto e ponto?
GM: Eu tenho a impressão de que até teria que haver um tipo de controle orçamentário. Eu já cheguei até a conversar com o ministro Dyogo [Oliveira, do Planejamento] porque, a meu ver, esse modelo da autonomia orçamentária e financeira não deveria levar a esse ponto. O tribunal que pagasse vantagens indevidas deveria ficar sem receber os recursos para suplementação de suas despesas. Isso não acontece. Recentemente, TST e STJ pagaram vantagens indevidas para servidores, inventaram um 13%. E recentemente receberam suplemento. O Supremo cassou essa vantagem, mas aquilo que se pagou anteriormente ficou. Portanto, isso precisa ser realmente controlado.
KA: Tem que ter uma decisão do Supremo ou Congresso ou é só uma decisão do Executivo?
GM: Eu brinquei que talvez a gente precise de uma lei que mande a gente ter vergonha na cara. Porque, a rigor, é tão explícito, já está na Constituição, já se sabe, não há controvérsia. E há leis estaduais, até uma lei que está sendo discutida no STF, da época do ministro Brito, um dos últimos processos dele, de que havia tantos penduricalhos no Rio de Janeiro, auxílio-creche, auxílio-educação e não sei mais quê, para os juízes, quando a nossa jurisprudência diz que os benefícios que devem ser dados aos juízes são só aqueles que estão na Loman, a Lei Orgânica da Magistratura. Aí se diz: “Não, a Loman envelheceu”. Ora, que se atualize a Loman. Em suma, eu acho que isso precisa ser discutido. Não que não deveria haver ajustes ou reajustes de salários de juízes, mas dentro dos padrões. Uma grande mazela hoje do Brasil é a força desmesurada das corporações. Veja esse argumento canhestro de dizer que quem quer questionar salário de juiz está a favor da corrupção. Veja que não tem relação de causa e efeito, é mistificação.
KA: E aquele que a plica a lei não pode burlar a lei.
GM: Exatamente. Como é que um juiz vai dizer ao seu cidadão lá no interior que ele ganha extrateto e ficar condenando pessoas e aplicando o princípio da legalidade?
KA: Está errado, boa declaração. Quero a opinião do sr. sobre essa invasão da quarta-feira ao plenário da Câmara por manifestantes de extrema-direita que pediam a presença de um general no Congresso e a volta da ditadura militar. O Congresso, na Praça dos Três Poderes, é a Casa do Povo, um símbolo importante da democracia. Preocupa o sr. esse tipo de movimento, ministro?
GM: Com certeza, eu acho que temos tido exageros de todos os lados. Como também me preocupam esses episódios de invasão de escolas. Uma coisa é fazer um protesto simbólico, outra coisa é transformar isso em uma ocupação permanente. Vimos que já teve mortes.
KA: Mas a morte ali foi uma coisa que não teve a ver com a ocupação, foi uma richa entre colegas no Paraná.
GM: Mas certamente isso passa a ter uso de drogas, pessoas que nada têm a ver com a escola e que passam a frequentar, os chamados “nem-nem”, aqueles que nem estudam e nem trabalha, que passam a ser chamados para esse tipo de atividade. Em suma, eu acho também que o Brasil tem que se acostumar a preservar a autoridade. A autoridade não é nada de ruim, isso decorre de um modelo de Estado de Direito. Escola é para estudar. Eu vi, esses dias, que havia uma medida da Procuradoria do Cidadão, em Brasília, para verificar a liceidade de uma medida tomada pelo ministro da Educação, que mandou verificar os nomes dos estudantes que haviam invadido a escola. A procuradora Deborah Duprat tinha tomado essa medida. Eu achei engraçado e até falei no plenário do Supremo, que o Brasil é um país psicodélico, porque eu acho que deveria ter havido investigação quando as escolas foram invadidas. É um serviço público que está sendo interrompido. É muito curioso isso.
KA: Mas como é que fica o direito de manifestação?
GM: Mas o direito de manifestação tem que ser compatível com outros direitos. Eu não posso fazer o meu direito de manifestação desrespeitando a lei e impedir, por exemplo, que você passe por aquele local. Tanto é que a Constituição se previne quanto a isso e diz que, em local público, a liberdade de reunião ou de manifestação deve observar que não haja outra reunião marcada para o próprio local. Para evitar exatamente essa situação, para que seja pacífica, sem armas. Veja, portanto, que há pressupostos no próprio texto constitucional. Quem aparece com pau, machado, foice, corrente, obviamente não está exercendo a liberdade de reunião tal como o texto recomenda.
KA: Ministro, encerrando a entrevista, vamos falar um pouquinho de política internacional. Houve a eleição do Trump nos Estados Unidos, o Brexit, tem uma onda na Europa de preconceito e resistência aos refugiados. O sr. vê uma guinada conservadora global? O sr. estudou na Alemanha, fez doutorado, morou um tempo fora, como avalia esse momento?
GM: Nós estamos vivendo tempos esquisitos. É notório que estamos vivendo tempos muito peculiares. Já há algum tempo temos esses movimentos na Europa, movimentos ultraconservadores, ultranacionalistas. Isso se manifestou também nesses novos Estados que se agregaram à União Europeia, vimos aí na Hungria e na Polônia problemas desse tipo. Acredito que, em parte, a globalização pode ter trazido desemprego e tudo mais e, de uma forma mais ou menos simplista, se atribui a isso as mazelas das pessoas que estão enfrentando realmente dificuldades. Também a vinda de estrangeiros, vimos isso agora nas manifestações do presidente Trump, para os países gera esse tipo de sentimento. Também o terrorismo açula e gera insegurança. É um coquetel de fatores que gera esse tipo de insegurança e fortalece esse tipo de movimento. Nós precisamos é acreditar que a democracia, que está bem assentada, especialmente na Europa, nos Estados Unidos, vai ter força institucional para superar. Já tivemos momentos outros, estamos agora na segunda geração Le Pen, mas a primeira geração já tinha essa força na França. Na Alemanha também houve a presença de partidos de ultradireita com força temporária. Então, eu acredito que isso vai passar e que nós vamos voltar a um quadro de normalidade.
KA: Qual é a sua opinião sobre Donald Trump?
GM: Eu estive até acompanhando as eleições nos Estados Unidos. Eu fico com a percepção de que é uma pessoa extremamente atilada e que percebeu exatamente esses movimentos, conseguiu antecipar esses movimentos. E, portanto, preparou e adequou o discurso, claro que a partir de suas visões de mundo, para dar conforto a esses grupos que estão, vamos chamar assim, em estado de desassossego e de desconforto d’alma. Essa é a minha visão, de que, no fundo, ele soube captar.
KA: Será pior para o Brasil?
GM: Não sei avaliar. Acredito, de qualquer forma, até ouvi isso do embaixador Sérgio Amaral lá em Washington, que o Brasil, na sua condição hoje peculiar na América do Sul e na América Latina, é parte das soluções e não dos problemas.
KENNEDY ALENCAR
BRASÍLIA
Verdadeiramente o juiz não é instrumento da acusação. Ele deve agir de forma imparcial, para evitar abusos e faça cumprir a Lei. Porquê? Sem transgressão não há lei, e todo a que que transgride a Lei é passível de juízo.
Não é possível comentar.