Com menos tempo e sem o financiamento de empresas, campanhas para prefeito viram debates e carreatas ganharem peso; primeira eleição após a minirreforma eleitoral premiará os que melhor se adaptaram às mudanças
Após incontáveis carreatas, debates, entrevistas e ‘selfies’ com os eleitores, os mais de 16 mil candidatos a prefeito em todo o País põem à prova neste domingo (2) a eficácia de suas campanhas. E numa eleição em que, pela primeira vez, os partidos não puderam contar com as doações de empresas, a estratégia se tornou ainda mais essencial para os prefeituráveis Brasil adentro.
A proibição à principal fonte de financiamento das últimas disputas eleitorais no País foi imposta pela lei nº 13.165/2015, conhecida como minirreforma eleitoral. A proposta inicialmente aprovada pelo Congresso permitia as doações de empresas, mas o tema foi vetado pela ex-presidente Dilma Rousseff. A petista preferiu acompanhar o entendimento do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), que havia julgado “inconstitucional” esse tipo de financiamento de campanhas.
Sem o aporte de verbas de pessoas jurídicas, restaram aos partidos os recursos do fundo partidário (dinheiro público que é destinado às agremiações políticas), de pessoas físicas – liberadas a doar até 10% dos rendimentos declarados no ano anterior à eleição – e dos próprios candidatos.
O impacto da restrição foi brutal durante as campanhas para a Prefeitura de São Paulo, o maior colégio eleitoral do País. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou em julho que o limite de gastos para os candidatos a prefeito da cidade seria de R$ 45,4 milhões no primeiro turno. Esse teto, porém, não seria atingido nem mesmo caso as receitas dos seis principais candidatos à Prefeitura paulistana fossem somadas.
O prefeito e candidato à reeleição, Fernando Haddad (PT), conseguiu arrecadar ao longo do primeiro turno pouco mais de R$ 5 milhões para sua campanha. Em 2012, quando foi eleito para o cargo, o petista contou com R$ 42 milhões para atuar nos dois turnos da eleição.
“Ao proibir o financiamento privado, você teve uma dificuldade a mais. Essa legislação é um desserviço à democracia, porque você não dá condições para que as candidaturas alcancem o eleitor”, avalia o coordenador da campanha de Haddad, o vereador Paulo Fiorillo. “Temos pouca propaganda. Pouca gente fazendo campanha nas ruas. É ruim.”
Para conseguir apresentar as propostas aos eleitores paulistanos, a maioria dos candidatos intensificou as agendas de rua, apostando no corpo a corpo com a população. “Com menos recursos você precisa se expor mais. E aí a agenda de rua tem uma importância para conquistar o eleitor. Isso ganhou peso [com a reforma eleitoral]”, diz Fiorillo.
O tempo como inimigo
Além de vetar as doações de empresas, a minirreforma eleitoral também trouxe para o pleito de 2016 mudanças no cálculo de distribuição de votos em legendas e a redução do tempo de campanha.
O tiro de largada na corrida eleitoral deste ano foi dado apenas no dia 16 de agosto, o que representa atraso de mais de um mês em relação ao cronograma pré-reforma eleitoral, que previa o início das campanhas no dia 6 de julho.
Para o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo (USP), essa redução no tempo de campanha se mostrou ainda mais sensível às candidaturas que a própria restrição às doações de empresas.
“Uma campanha eleitoral tem que ter tempo suficiente para as pessoas verem quais os problemas e propostas para a cidade. Isso não se faz em 35 dias e com o horário eleitoral muito mal distribuído”, afirma Janine Ribeiro.
O professor, no entanto, destaca que o papel dos marqueteiros perdeu peso com o orçamento escasso dos candidatos, ao passo em que os debates na TV e no rádio ganharam importância na disputa eleitoral.
“Esse lado espetaculoso das eleições diminuiu. Mas as formas de se fazer o debate são muito ruins. Elas favorecem uma esperteza típica dos marqueteiros. E tudo isso é contra o eleitor”, expõe o ex-ministro. “O debate tem mais importância, mas teria que se definir o formato de uma forma democrática. Hoje, isso está nas mãos de conglomerados de mídia. Isso é muito grave”, explica.
O coordenador da campanha de Fernando Haddad espera que, após o pleito deste domingo (e do próximo dia 30, para as cidades que tiverem a disputa em segundo turno), os parlamentares do Congresso Nacional voltem a se debruçar sobre a legislação eleitoral para reverem as regras sobre o financiamento de campanhas. “Torço para que o Legislativo possa fazer uma reforma profunda, com financiamento público de campanha – que é o que o PT sempre defendeu –, para fortalecer a democracia”, diz Fiorillo.
Já o professor Renato Janine Ribeiro se diz “pessimista” em relação a alguma alteração nesse sentido. “Temos um governo sem interesse nos processos de democratização, que mantém uma relação de negociação com o Congresso. Isso torna qualquer interesse de renovação uma coisa ‘não muito querida’ pelo Congresso. Estamos em uma sinuca de bico”, lamenta o professor.
Alheios ao debate sobre doações eleitorais e a legislação vigente, mais de 144 milhões de eleitores estão habilitados a votar neste domingo. A votação será iniciada às 8h da manhã e termina às 17h da tarde. Os resultados deverão ser conhecidos até três horas após o início das apurações, segundo estimativas do TSE.
Fonte: Último Segundo – iG /vavadaluz