Criar uma pequena flor é um trabalho de anos. William Blake
Quando eu era pequena, pensava que o meu Pai juntava as folhas de ácer num grande monte para que nós, as crianças, pudéssemos mergulhar nele e brincar. Naqueles dias, eu acreditava que o carrinho de mão que sempre o acompanhava ao jardim das traseiras era especialmente destinado às boleias que ele nos dava no regresso a casa. O jardim de flores ao lado da casa era o seu lugar especial de refúgio — e foi ali que a sua alma tocou a minha, num laço até à eternidade.
O jardim do meu Pai era cheio de surpresas. Caminhos de pedra levavam a lagos com peixinhos vermelhos e pequenos abrigos feitos de arbustos e adornados de bancos em pedra. Havia bebedouros para pássaros nos sítios mais estranhos, e uma fonte rodeada de gerânios vermelhos e lobélias azuis espalhava a musicalidade da água por todo o jardim, através de um montinho na parte lateral do relvado. À medida que o meu Pai cuidava o seu jardim, a sua gentileza e amor irradiavam até às plantas, que respondiam com um crescimento e cor luxuriantes.
Tirar as ervas daninhas ao seu lado nunca se tornava aborrecido, porque o seu amor irradiava até mim também. Já crescida e depois de casada, passei ainda muitos domingos lado a lado com o meu Pai — podando, tirando ervas daninhas, fertilizando, rindo, gozando o calor do seu carinho incondicional. Mas à medida que os anos passavam, eu ia fazendo cada vez mais, enquanto ele ia fazendo menos.
O espírito do meu Pai manteve-se firme, mas a debilidade dos seus oitenta anos levaram-no a vender a propriedade e mudar-se para uma residência para aposentados. Ainda antes que o novo proprietário conseguisse terraplanar o jardim, o meu Pai ajudoume a colher amostras de tudo: rosas, várias plantas perenes, dálias, peónias, e até mesmo algumas das pedras dos caminhos. Levámo-las a todas — juntamente com um bebedouro para aves, a fonte e um banco de pedra — e pusemo-los no meu quintal por trás da casa, onde fiz um jardim miniatura para tentar reproduzir o do meu Pai.
Enquanto o observava a caminhar com a sua bengala pelo nosso jardim, tinha consciência que cada um dos seus passos era precioso, cada punhado de terra que ele remexia uma dádiva, cada rosa que podava era uma bênção. Naquela residência para aposentados cuidei do meu Pai tal como ele tinha cuidado das suas flores. Todos os dias, de manhã, tomava o meu café com ele, e de tarde levava-o às compras. Organizava-lhe os medicamentos e levava-o a concertos de piano.
Na primavera, levava-o de carro até aos subúrbios para poder admirar os jardins floridos das outras pessoas ou até minha casa para que escutasse a sua fonte a cantar com as aves. Dois anos depois do início desta nova vida, segurei-lhe a mão enquanto partia, vítima de cancro pancreático. Senti comigo o seu espírito jovem e forte, como se ele estivesse preocupado com o que a sua partida poderia provocar. Mas a sua morte não conseguiu quebrar o elo entre as nossas almas, e caminhei descalça sobre a relva para receber da terra algum conforto. Agora, anos mais tarde, ainda sinto o meu Pai ao meu lado quando percorro o meu jardim — o filho do jardim dele.
Consigo sentir a sua alegria ao ver os beija-flores banhando-se no bebedouro. O seu riso ainda ecoa na minha mente enquanto arranco ervas daninhas em volta das roseiras. Transporto o seu espírito no meu coração, e em cada flor que desabrocha, eu sinto que ele está comigo.
Linda Swartz Bakkar Jack Canfield, Mark Victor Hansen, Steve Zikman Chicken soup for the nature lover’s soul Florida, HCI, 2004 (Tradução e adaptação)
Este texto é um reflexo de uma alma abençoada, que teve a felicidade de conviver com um sábio, é pura POESIA.
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