Em livro, pesquisadora propõe reflexão sobre a sexualidade dos homens hetero e afirma: ela está ficando mais fluida e complexa, e não pode mais ser entendida apenas sob a luz do binômio hetero-homo
Você, heterossexual, está há um ano sem transar. Um dia, em meio a uma bebedeira homérica com um amigo, também hetero, vocês acabam se beijando e trocando carícias íntimas. No dia seguinte os dois acordam, se olham e decidem esquecer o que aconteceu. E a vida segue. Essa cena pode não ter acontecido com você, mas ela é bem mais comum do que se imagina. Tanto que, nos Estados Unidos, muitos jovens hetero já falam abertamente (nas redes sociais inclusive) sobre o bro-job – quando um hetero faz sexo oral em um amigo também hetero para “quebrar um galho”. O nome é uma alusão ao blow-job (o sexo oral no homem).
Uma mulher que faz sexo com outra não é necessariamente identificada como gay ou bisexual. Então por que nao é assim com os homens? A resposta para essa pergunta está longe de ser simples, mas no livro “Not Gay: Sex Between Straight White Men”, recém lançado nos Estados Unidos, a pesquisadora Jane Ward explora o universo dos rituais masculinos de identificação e pertencimento, como trotes e iniciações, para tentar entender melhor a complexidade e a fluidez da sexualidade masculina para além do binômio “hetero-homo”.
Alguns pesquisadores da sexualidade humana argmentam que os desejos sexuais femininos tendem a ser mais fluidos e receptivos, enquanto os masculinos – independente do fato de serem ou não gays – tendem a ser inflexíveis e imutáveis. Esta noção permeia a cultura popular e fica evidente em frases como “Não existe ex-gay”ou “Eu sou espada”. Enquanto isso, beijos e carícias públicas entre mulheres hetero pipocam no noticiário de celebridades – Katy Perry, Madonna e J-Lo, para citar algumas – sem que se levante dúvida alguma sobre a preferência sexual delas.
Para Ward, que é professora do departamento de estudos sobre gênero e sexualidade da Universidade da California (EUA), esse desejo latente para o jogo homossexual na cultura entre “brothers”(irmãos) geralmente é visto de forma menos explícita.
“Estou chamando a atenção para a maneira com que os homens heterossexuais excepcionalizam o próprio comportamento homossexual como uma maneira de torná-lo invisível”, contou a autora em entrevista à revista Next.
Ela cita como exemplo a franquia Jackass, na qual homens assistem pornografia e se masturbam juntos, e por vezes tocam pênis, nádegas e ânus dos amigos. No Jackass, esses comportamentos são encarados como uma brincadeira entre “brothers”, um trote, algo que aconteceu quando todos estavam bêbados, algo que não é sexual porque não foi feito entre homens gays – embora todos eles concordem que o mesmo comportamento seria um comportamento homosexual se envolvesse dois homens gays.
Dos trotes e rituais de iniciação, onde calouros têm de segurar o pênis dos colegas novatos, numa espécie de cabo-de-guerra, aos anúncios online de homens hetero à procura de outros homens hetero para sexo casual, Ward examina esse mundo e propõe que a verdadeira razão pela qual homens hetero se comportam dessa maneira é para reafirmar o próprio gênero e a própria opção sexual, em vez de desafiá-la. Em outras palavras: de uma forma inconsciente, eles fazem isso para provar que não são gays. E você, concorda com ela?