Chegara o verão.
Bruno andava muito contente pois, como já não havia escola, podia acompanhar o pai de terra em terra a vender de tudo um pouco.
Na furgoneta em que os dois iam, havia desta vez queijos de vaca, de ovelha e de cabra, chouriços, presuntos, latas de conserva, garrafas de vinho, peças de tecido, linhas, botões… e um sem número de coisas que, certamente, fariam falta naquelas aldeias.
Claro que a furgoneta levava um altifalante a anunciar:
— Já chegou a loja ambulante! Traz tudo o que é preciso e aceitam-se encomendas! — gritava uma e outra vez.
Disto é que Bruno gostava: falar ao altifalante para avisar a aldeia da sua chegada.
A terra onde pararam não era grande, mas lá vendiam sempre muito porque ficava afastada dos locais onde havia comércio. E precisavam sempre de tudo. E só voltariam no mês seguinte…
Bruno tomava nota das encomendas, e registava num cadernoo dinheiro das vendas, depois de o contar duas vezes.
— No próximo mês traga-me umas tesouras grandes de cortar tecido. Estou a pensar fazer roupa para o inverno! — pedia uma senhora.
— Não se esqueça de uma caixa de garrafas de vinho para o casamento! — dizia-lhe alguém.
— Quero encomendar outro queijo igual ao do mês passado, que era muito bom! — pedia outra freguesa.
Bruno sentia-se muito orgulhoso por ajudar o pai que, por sua vez, tinha muito orgulho no filho. Bruno somava muito bem, tinha jeito e tomava nota dos pedidos metodicamente, um por um, e com o nome de quem fizera a encomenda.
Quando se punham novamente a caminho, Bruno encarregava-se de anotar as terras aonde já tinham ido, de modo que, no final do verão, já quase sabia de cor todo o percurso.
Um dia, o pai perguntou-lhe:
— Vendedor ambulante como tu, pai! — respondeu ele sem hesitar.
O pai não teve qualquer reação e perguntou-lhe de novo:
— Estás certo de que não queres ser alguma coisa mais na vida? Eu dedico-me a isto porque não pude estudar. Éramos muitos lá em casa e os meus pais não podiam. Tive de principiar a trabalhar muito cedo. Na escola só aprendi a ler, escrever e fazer contas. Já vês porque tens mais jeito para isso do que eu. Mas tu andas na escola. O Professor Marcelino diz que és um bom estudante, aprendes depressa e com facilidade. Não gostarias de tirar um curso?
Bruno não percebia porque é que o pai continuava a perguntar sempre o mesmo, sem atender ao que ele dizia. Repetiu, portanto, num tom mais forte:
— Pai, quero ser vendedor ambulante. Não quero tirar nenhum curso.
— Mas olha! Se a tua mãe estivesse cá teria muito orgulho em ti ao ver-te tirar um curso e obteres um diploma.
Os dois ficaram em silêncio, o que sucedia sempre que se falava na mãe. Ambos se sentiam muito tristes ao lembrar-se dela. Tinha morrido num acidente há dois anos, mas continuavam a falar dela com frequência.
Ao fim de algum tempo Bruno falou:
— Pai, lembro-me de um dia a mãe dizer-me que o mais importante na vida não era ter um diploma, mas sim aprender tudo o que se pudesse. Também me disse que o mais importante era fazer aquilo de que se gostasse. Eu sinto-me feliz agora a ajudar-te a vender. Aprendo muito contigo.
— Bruno — respondeu o pai, — daqui a uns anos, vais cansar-te da furgoneta, da estrada, e até de mim, claro.
A conversa ficou por ali porque tinham chegado a outra pequena aldeia, e Bruno tinha de pegar no altifalante e anunciar a vinda.
Desta vez venderam menos do que na terra anterior, mas houve mais pedidos de encomenda, de modo que, quando se fizeram de novo à estrada, estavam ambos muito contentes.
Bruno tinha ficado com uma dúvida. Perguntou, por isso, ao pai:
Agostinho demorou a responder porque a pergunta apanhou-o de surpresa.
— Olha, filho. Eu não tenho vergonha de ser vendedor porque sou honrado, ajudo a gente trazendo o que precisam, e vivo do meu trabalho. Mas dizer que tenho muito orgulho nisso, acho que não. Não me sinto orgulhoso por ser apenas um vendedor ambulante.
— Pois eu tenho orgulho em ti e também em poder ajudar-te — respondeu o filho.
O pai sorriu e fez-lhe uma carícia, contente por saber isso.
Ser vendedor ambulante talvez não seja assim tão mau, pensou.
A sua mulher tinha razão: o importante era ser feliz e ele sentia-se feliz assim. De terra em terra, sem horários e sem patrão.
— Pensando melhor, creio que a tua mãe tinha razão. Quando fores grande, dedica-te ao que quiseres, estuda aquilo de que gostares e aplica-te a fundo nisso. E se quiseres dedicar-te ao mesmo que eu… ótimo! Ajudar-te-ei no que puder, menos a fazer contas, claro.
Riram-se os dois e a estrada tornou-se, para ambos, um caminho de esperança que os levava sempre a novos lugares.
Begoña Ibarrola
Cuentos para sentir: Educar las emociones
Muito bom, Vavá. Valeu…
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