Mais de 15 mil trabalhadores de montadoras, empresas de alimentos e linha branca terão descanso prolongado no carnaval; alguns superam 30 dias de ociosidade
A fraca atividade econômica e um cenário nada otimista para o futuro estão levando muitos ramos da indústria brasileira a adotar férias coletivas em períodos não convencionais, como o carnaval. O objetivo das empresas é deixar a linha de produção parada, para deter a elevação de estoques indesejados. Muitas empresas estão dando mais do que a semana inteira do feriado, chegando, em alguns casos, a um mês de descanso.
Dona de marcas como Brastemp e Consul, a Whripool Latin America informa que concedeu férias coletivas aos funcionários das linhas de operação das manufaturas, no período de 9 a 23 de fevereiro, e das áreas administrativas, de 11 a 23 de fevereiro, nas unidades de Rio Claro (SP), Joinville (SC) e São Paulo (SP). Segundo a empresa, “a medida foi adotada para equilibrar o volume de produtos em estoque à demanda de mercado”. Os departamentos de vendas, faturamento, atendimento ao consumidor e logística permanecem operando com equipe reduzida durante o período de férias coletivas. A linha branca também vai sentir o impacto da elevação do IOF, imposto cobrado em operações de crédito ao consumidor.
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A Whirpool não informou quantos funcionários terão o descanso forçado, mas a estimativa mínima é de 7,5 mil trabalhadores parados. Segundo Rolf Decker, diretor do Sinditherme (entidade que representa os trabalhadores na região Sul), em Joiville 3,5mil serão afetados. “Está complicado para o trabalhador da linha branca. Negociamos as medidas como forma de evitar demissões.” No interior paulista, o Sindicato dos Metalúrgicos de Limeira e Região, afirma que em Rio Claro serão 4 mil funcionários.
A Eletros (Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos) informa devido ao ritmo mais lento da economia, as empresas podem ser obrigadas a ajustar a produção à atual demanda, mas alega que não tem informação da quantidade de trabalhadores que estarão sujeitos à medida, porém trata-se de uma estratégia individual de cada empresa.
O setor automotivo, de acordo com dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), está com 38 dias de estoques, quando o desejado é algo perto de 20 dias. Esse índice mostra que as empresas conseguiriam realizar vendas durante 38 dias sem ter de produzir.
As montadoras vivem hoje uma ressaca pós recordes de vendas e produção no País, com o fim dos incentivos do governo federal nos últimos anos. As desonerações do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), por exemplo, tinham como objetivo incentivar o consumo e, assim manter o nível do emprego, por meio de acordos com as montadoras de não demissão. Há ainda um acordo setorial com o governo federal de lay off (suspensão do contrato de trabalho) para evitar demissões. Mas as empresas já ameaçam demitir e agora darão as férias coletivas também.
Sobre o momento difícil na relação entre montadoras e trabalhadores das empresas, o presidente Anfavea, Luiz Moan, afirmou que 2015 é um ano difícil, mas que, individualmente, cada montadora tenta fazer suas adequações. “Os mecanismos usados pelas empresas, de férias coletivas, banco de horas e licença remunerada são meios de proteção do emprego. As empresas trabalham assim porque têm funcionários qualificados, que são fruto de investimentos vultosos”, alega Moan.
Segundo Jamil Davila, presidente do Sindicado dos Metalúrgicos da Grande Curitiba a Volkswagen dará férias coletivas para 3 mil empregados em São José dos Pinhais (PR), de 16 de fevereiro até 20 de março. “A licença é vista como um meio de não demitir na unidade que fabrica a linha Fox e faz a montagem do Polo. Estamos em constante negociação com empresa para evitar cortes. É um momento sensível.” A empresa não quis se pronunciar, mas informou que a parada já estava planejada para readequação da linha de montagem.
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A linha de produção da General Motors de São Caetano do Sul, no ABC Paulista, não irá operar durante a semana do carnaval, para ajustar a produção à atual demanda do mercado, de acordo com informações da GM. “A linha de produção em Gravataí e em São José dos Campos não operam na segunda-feira (16), na terça-feira (17) e na quarta-feira (18); na quinta-feira (19) e na sexta-feira (20) operam normalmente.”
A montadora abriu na última semana um Programa de Desligamento Voluntário (PDV) para os empregados horistas dos complexos industriais de São Caetano do Sul e de São José dos Campos no período de 2 a 10 de fevereiro de 2015. A medida tem como objetivo adequar a produção à atual demanda do mercado. A crise está tão séria que já tem 950 funcionários com os contratos suspensos (lay off), forma que a empresa utiliza para não demitir e, assim, não descumprir o compromisso com o governo e sindicato dos trabalhadores de não demitir até 2016.
Já a Ford concede folgas prolongadas, pois a empresa “não chama de férias remuneradas, apenas parada para o Carnaval” as parada de produção em três das quatro unidade fabris no Brasil. Apenas Tatuí não terá paralisação. Em nota a montadora informa que São Bernado do Campo (ABC), “as fábricas de carros e caminhões estarão paradas na semana do Carnaval – 16 a 20 de fevereiro – para adequação da produção à demanda” Já em Taubaté (SP), “as fábricas de motores e transmissões estarão paradas na semana do Carnaval – 16 a 21 de fevereiro – para adequação da produção à demanda”, enquanto Camaçari (BA), a produção de “carros estará parada na semana do Carnaval – 16 a 23 de fevereiro – principalmente por necessidade de manutenção e ajustes na fábrica.” A montadora informou que 3 mil funcionários pararão em São Bernardo do Campo, mas não soube informar o número dos paralisados nas outras unidade.
Crise pode ter chegado na indústria de alimentos
Um dos últimos setores a sentir a perda da atividade econômica, o de alimentação, já dá sinais de enfraquecimento. Segundo dados da produção industrial de 2014, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção do setor caiu 1,4% no ano passado. O pior resultado ficou com as montadoras, queda de 16,8%.
A JBS/Friboi vai conceder férias coletivas em duas unidades de processamento de carne bovina nos municípios de Colíder e Diamantino, em Mato Grosso. A paralisação leva também à suspenção do abate na região, forte na produção de carne.
As férias coletivas começaram nesta quinta-feira (5) e vão até o dia 18 de fevereiro. Segundo o sindicato local que representa os trabalhadores, em Colíder serão 1000 funcionários em recesso e em Diamantino, 700. Procurada, a JBS não quis se pronunciar.