A Avó e o Avô viviam no outro lado do país e, embora nos telefonássemos e escrevêssemos frequentemente, já tinham passado vinte anos desde que os tinha visto pessoalmente. A saúde deles estava a deteriorar-se, e a idade mantinha-os por casa. As minhas responsabilidades pessoais com o marido, dois filhos jovens e um trabalho a tempo parcial, impediam-me de os visitar.
Houve um ano em que fiz questão de ir até lá em março. Tinha falado com a Avó e apercebi-me de que, com os seus oitenta anos, eles não iriam durar para sempre — por muito que eu assim o quisesse. Fiz os preparativos e apanhei o avião até lá para ficar uma semana.
No momento em que passei a entrada da porta, senti-me de novo em casa. As memórias de uma infância há muito passada regressaram imediatamente. As bolachas a tostar no forno quente, a Avó a barrar o bolo dos contos de fadas e a deixar-me rapar as sobras da cobertura. As lindas roupas que ela própria tinha costurado, vestidos com peito de favos e calções com peitilho.
Tal como acontecia nas cartas, a Avó contava muitas vezes histórias de quando eu era pequenina e de como me tinha posto Muriel como segundo nome. Eu nunca lhe disse como me aborrecia quando era criança por causa desse nome — de repente, não sei como, ficou mais bonito e tão invulgar como a Avó.
O Avô falava das duas guerras pelas quais tinha passado, e eu dizia-lhe como me sentia orgulhosa ao saber que ele tinha servido o seu país. Ele fazia-me rir, e acredito que eu o fazia sentir-se de novo jovem, mesmo que só por uns instantes. Por outro lado, também me fazia chorar. Dizia-me que ele e a Avó tinham deixado de celebrar o Natal há cerca de dez anos. Já eram demasiado idosos.
Como é que se pode deixar passar assim o Natal sem ser assinalado? Eu lembrava-me melhor dos Natais de quando era criança e eles viviam connosco. Eles adoravam a quadra festiva e iam sempre à Missa do Galo. O Avô levava-me, juntamente com os meus irmãos e irmãs, para cortarmos a árvore, enquanto a Avó fazia os mais incríveis doces de Natal; depois decorávamos a árvore com eles. A nossa casa enchia-se do amor e espírito de união que eu sempre associara ao Natal. Nem podia acreditar que eles tinham deixado de o celebrar.
O Avô explicou que já tinham muita idade para se preocuparem com uma árvore, e os amigos deles demasiado idosos para irem lá vê-la. Até o ir às compras, agora, era muito difícil, e tudo aquilo de que necessitavam era-lhes entregue em casa. Apetecia-me chorar pela alegria que eles já tinham sentido — e tinham perdido.
Aquela semana continua a ser uma das mais felizes da minha vida. Saber que poderia ser a última vez que via qualquer um dos dois entristecia-me, mas estava determinada a fazer desta uma visita feliz. Levei os dois a jantar fora — algo que eles já não faziam há mais de dois anos, desde que a Avó tinha sido operada à anca. Tenho a certeza de que gostaram muito.
Dizer adeus foi difícil. O Avô, o meu herói bravo e forte, chorou, e a Avó fez os possíveis para não fazer o mesmo. Não conseguiu. Eu chorei toda a viagem de avião até chegar a casa.
À medida que o Natal se aproximava, pensava neles cada vez mais. Queria fazer qualquer coisa para que soubessem que estava a pensar neles. Surgiu-me a ideia de lhes restituir o Natal, e preparei tudo para o fazer.
Primeiro, arranjei uma pequena árvore artificial e decorei-a com luzinhas miniatura e uma delicada fita dourada. Embrulhei, juntamente, presentes coloridos para cada um deles: chinelos, chocolates, um cachecol tricotado à mão para o Avô e um casaquinho de dormir para a Avó. Arranjei uma caixa com bolachinhas e biscoitos; muitas das receitas eram dos livros de culinária da Avó. Depois enchi uma meia para cada um deles com produtos de toilete embrulhados e atados com laços.
No cartão, escrevi que eles me tinham dado tantas memórias maravilhosas durante todos aqueles anos, que eu queria agora oferecer-lhes algumas novas memórias. Pedi aos dois que me prometessem que iriam pôr a árvore na sala de estar e colocar os presentes em volta. A minha última indicação foi: “Não abrir antes do Natal!”
Enviei a encomenda por correio, mal podendo conter o meu entusiasmo. A Avó telefonou assim que ela chegou. Estava a chorar e, desta vez, nem tentava esconder. Falámos durante muito tempo, relembrando os Natais passados, e quando tive a certeza de que eles já tinham a árvore instalada, prometi que telefonaria na manhã do dia de Natal.
Quando os meus rapazes já tinham acabado de abrir todos os seus presentes e estavam agora a remexer nas suas meias, fiz a minha tão esperada chamada. O Avô respondeu ao primeiro toque. Achei-o um pouco estranho, e apenas trocámos umas palavras breves; depois a Avó pegou no telefone.
— Parecíamos duas crianças — disse-me ela. — Nenhum de nós conseguiu dormir esta noite. Até apanhei o Harry na sala de estar, a abanar um dos pacotes e tive de o mandar de volta para a cama. Querida, esta é a primeira vez em muitos anos que nos sentimos tão entusiasmados. Não digas ao teu Avô mas, depois de ele ir para a cama, eu própria também tive de ir abanar alguns dos presentes.
Ri-me, imaginando os dois a esgueirar-se da cama para descobrir que presentes eu teria enviado. Desejei ter mais dinheiro para lhes mandar coisas mais caras, e disse à Avó que talvez no ano seguinte os presentes fossem melhores.
— O teu avô não consegue falar agora porque está demasiado ocupado a chorar. Não para de dizer: “É uma neta e tanto que aqui temos, Muriel.”
Jack Canfield & Mark Victor Hansen
Chicken Soup for the Soul – Christmas Cheer