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1BERTO DE ALMEIDA NO BLOG DO TIÃO >Faz um ano que Anco Márcio trocou de roupa e foi morar noutra cidade…


1BERTO DE ALMEIDA 

A cada 15 anos o brasileiro esquece o que aconteceu nos últimos 15 anos”. – Ivan Lessa
Faz mais de quinze minutos. Dias, meses… Faz um ano! E contrariando o lapidar pensamento de Ivan Lessa, ainda nos lembramos dele! Tanto que me lembro muito bem quando fomos – a Morena e eu – visitá-los no seu primeiro AVC, e o encontramos chorando com o menino que era. Um menino era Anco. 

Apesar das “brigas” e dos muitos “inimigos” que conquistou na sua vida por aqui, essa única em que acredito, era antes de tudo um menino de quase 70 anos. E agora chorava. Nunca o tinha visto chorando tanto. Vou mais fundo: nunca tinha visto Anco chorar antes. 

Assim que nos viu, a Morena e eu, as comportas do seu – dele – peito se abriram. Era a emoção do encontro! Encontrava-se ali o sujeito mais frágil do mundo! Ora, logo ele que se vangloriava de ter uma saúde de ferro – dizia apenas ter problema com a tireoide, por isso estava sempre acima do peso -, não perdia uma vacina e fazia tudo que senhor doutor lhe mandava? Meu Deus! E agora se encontrava inerte numa cama de hospital. 

Sempre altivo, uma de suas marcas, não queria que o vissem ali, os dedos paralíticos, o bom-humor no bolso de trás, totalmente inútil. “Ora, o que é que isso, rapaz? Tu és forte, hás de superar tudo isso!”. Não me ouvia. O choro estava cada fez mais forte. Disfarcei. “Tu estás lúcido, cara, sabes o que estás fazendo. Aqui é somente um descanso. Em breve, muito em breve estarás causando “terror” a essa sociedade doente de frescurite com a tua volta”! Tudo ele ouvia, mas, apesar dos nossos sorrisos ensaiados, o choro era mais forte. 

Era triste vê-lo assim. Um humorista chorando é mais triste ainda. Vamos fazer o seguinte, a proposta saiu como um pedido de socorro – não aguentava mais -, sempre me telefonavas e mandavas imeios (sic) pedindo para que eu voltasse a dividir contigo o teu Romance da Cidade, não era isso mesmo? Era, acenou com a cabeça. Não tinha dúvidas, estava ainda consciente. 

Tu queres mesmo que eu volte a dividir contigo o espaço? O acenar de cabeça foi mais forte ainda. E, finalmente, falou: “É, 1berto, eu quero! Eu quero! (repetiu)” Vocês não sabem o quanto essa repetição doeu no fundo do peito. A dor era de pedra pontiaguda descendo pela uretra. Furada de espinho de Maria-segunda – vocês sabem – na pupila do olho. 

Tudo bem, rapaz, sem preocupação. Voltarei ao teu Romance e a Cidade saberá. Brinquei. Vamos escrever mais uma vez juntos. Ora, nós que escrevemos tanto por aqui e em alhures não temos nenhum motivo para escrever separados. O Eu Plural, uma marca hoje de 1berto de Almeida, continuará, mas ele, o Eu Plural, há de permitir que a gente continue brincando e sorrindo juntos. Tá bom? Tá, tá, tá. Falava dessa vez. A cabeça, porém, quase não se movia. 

Foi aí, lembro-me bem, que perguntei pelos seus poucos – não há como negar – e leais amigos. Não, 1berto! Não quero que eles saibam que eu estou aqui! Foi um esforço para fazer esse pedido. O pensamento e as palavras se atropelavam no caminho do entendimento. Não dava mais pra segurar. Arrumei uma desculpa para sair do quarto: ah, tenho que ir… Nem sei pra onde mais. Saímos do apartamento do hospital onde ele estava internado.

O choro voltou. Voltamos. Ora, bicho, agradeces a Deus, estás lúcido, sabes quem está falando contigo e o que realmente desejas. A coisa não é tão feia assim. Errei. A coisa era mais feia do que eu tentava pintar para ele. 

No outro dia, agora mais calmo, ele receberia alta. Mas, sacanagem da Indesejada que já o espreitava, logo voltaria para o mesmo hospital. Nem sei mais quantas vezes. Até que no dia 21 de Junho de 2013, soube que ele nunca mais voltaria aquele hospital. A nenhum outro hospital. Anco Márcio, o meu amigo, companheiro de palavras e pensamentos finalmente havia trocado de roupa e se mudado para outra cidade. 

Faz um ano. Mas, acreditem, parece que foi ontem. Um ano sem Anco Márcio de Miranda Tavares. Um ano sem o nosso Romance da Cidade. Ah, que Deus o coloque num bom papel – era um excelente ator – no Romance que escreve na Cidade do céu!

Nota do blog do Vavá da Luz : Anco Marcio de Miranda Tavares era Ingaense de coração filho do Sr Severino Tavares e a Proessora Dona Isaura.

Veja uma de sua crônicas: