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EM TORNO DA MESA (MARCOS SOUTO MAIOR (*)

 

Ao contrário dos que se alegram com a passagem festiva do dia dedicado às

mães, acordei cedo e tristonho, sem vontade de nada… Li os jornais diários e as revistas

semanais e, por fim, liguei a televisão para sintonizar os mais variados programas

disponibilizados. Contudo, nada fez o 11 de maio de 2014 se tornar uma animada reunião

familiar e de aderentes! Como de outras vezes, cada filho de dona Adélia se recolheu em suas

próprias casas e os almoços foram comprados em restaurantes e entregues por velozes

motoboys, driblando veículos pesados e acelerados.

Da laje onde moro, com minha mulher e filhas solteiras, descortinei a

imensidão do mundo, com o azul emoldurado do céu dando a impressão de encontro com as

águas salgadas da linda praia de Tambaú. Fitei o olhar, durante um bom tempo, até o que a

vista enxergou, rebuscando na saudade temporal da vida, a visão da mãe querida. Ela não

perdia as leituras detidas dos meus cadernos pautados, com dissertações e redações colegiais!

Sempre tinha uma ou outra que a professora Adélia folheava para revisar… “Ah, meu filho,

você sempre fala sobre meus precipitados cabelos brancos, somente admitindo um toque sutil

de shampoo azul em atenção a você!” Seria o que hoje se parece com ‘luzes invertidas’.

Nas minhas viagens ao Rio de Janeiro, nos anos setenta, pessoalmente e ainda

solteiro, escolhia, nas mais elegantes lojas especializadas em senhoras idosas, os vestidos de

finais de semanas para irmos almoçar em casas de pasto. E a conversa seguia, com a incontida

alegria dos meus pais que, mesmo idosos, não conversavam sobre doenças e medicamentos.

Na condição de filho único, sempre procurei dar conforto especial à dona

Adélia, alucinada pelas festas natalinas, quando sempre fiz questão de comprar um

presentinho para cada um da família. Com salário ínfimo de professora de Desenho, Caligrafia

e Educação Moral e Cívica, transferi os jetons que recebia do Conselho Regional de Desportos

da Paraíba, para completar os gastos de fim de ano. Falar nisso, a ceia era posta e todos

olhávamos para o céu na súplica pelo bem estar de todos…

Sem direito ao “Dia das Mães”, me reservei a ficar sozinho, tentando avistar a

lembrança melancólica de uma vida passada, abrindo o computador para dedilhar o teclado

mágico, na tentativa de trazer para o papel o sentimento puro de quem não esqueceu, nem

esquecerá, as imagens do passado.

Perdoem-me, meus queridos leitores! A data das mães passou ligeira, me

deixando incrédulo de transpor num branco impeditivo de qualquer gesto ou atitude de um

filho que ama eternamente sua genitora se disfarçando no cinza que ainda não sou.

Verdadeiramente, o que eu mais desejava na vida, me foi negado pela natureza. Foi

novamente o anseio impossível de ter a presença da minha mãe Adélia, reaparecendo para

poder compartilhar o almoçar familiar.

Valho-me do imortal Fohann Goeth, acudindo o que não consegui dizer: “As

nossas paixões são verdadeiras fénixes. Quanto a mais antiga arde, renasce uma nova das

cinzas da primeira.”

(*) Advogado e desembargador aposentado