“ A traição nunca triunfa. Qual o motivo? Porque, se triunfasse,
ninguém mais ousaria chamá-la de traição! (J.Harington)
Esta crônica visa ampliar a questão da traição, realizando uma pequena dissertação enfocada, principalmente, no motivo traidor. Toda vez que somos frustrados em nossas ilusões e, toda a vez, que não correspondermos às expectativas dos outros, estamos sendo traídos e traidores.
Nesse sentido, a traição não se limita apenas ao contexto amoroso: se uma mãe não trai a s expectativas de seu filho, ele terá problemas em lidar com frustrações, se um filho não trai as expectativas de seus pais, não poderá encontrar um caminho próprio na vida, se uma pessoa não trai as convenções sociais, não terá individualidade, e assim por diante. Levamos em conta, nos casos supracitados, que estas expectativas, de alguma maneira, a vontade do outro, afetando o curso da vida.
O contrário da traição é a fidelidade. Quem trai, está sempre maculando algum pacto de fidelidade. Responsabilizar-se pela traição é assumir o rompimento desse pacto. Nesse sentido, a traição implica sempre em um sacrifício. Trata-se de um problema de escolha e, portanto, de consciência.
Ao rejeitar a consciência daquilo que está sendo sacrificado em uma traição, a parte do sacrifício embutida em toda a traição é ignorada. Optar e assumir uma opção, é sacrificar algo em função da fidelidade a alguma outra “coisa”.
A “verdadeira” traição consiste em proporcionar-se de todos os lados e, ao mesmo tempo de nenhum. Este modo da traição apresenta-se também na incapacidade de trair. Aquele que recusa-se a frustra expectativas é igualmente incapaz de reconhecer o sacrifício. De modo semelhante ao traidor permanente, quem nunca trai expectativas, acaba geralmente dividido entre expectativas opostas, incapaz de trair uma possibilidade em função de outra. Certamente, trairá a ambas por não ser fiel a nenhuma. Estranha contradição que une fidelidade e traição no mesmo signo…
Em todo caso, há uma dignidade em fazer uma opção. É justamente esta dignidade que, na traição, consiste em “ fazer o sacrifício “. É preciso no entanto deixar amadurecer a contradição, patra que uma opção possa ser realizada e o dilema da traição resolvido. Durante esse período, o melhor a fazer é aceitar a contradição, sem rejeitar, a priori, qualquer uma das possibilidades. A fantasia de traição é pois um chamado para o sacrifício. O problema é que hoje em dia, a palavra sacrifício tornou-se um tanto piegas (*). A busca do prazer a qualquer custo não aceita a frustração e quer “ ter tuido”. Perde-se assim a dimensão da fidelidade, pois esta implica na possibilidade de escolha e, geralmente, as escolhas envolvem uma certa dose de traição e sacrifício. Envolvem também: fé, esperança e certeza. Tenho dito…!!!
(*) piegas > Que ridiculamente sentimental.